Folha de S. Paulo


Projeto ensina mulheres a programar e conquistar o mundo da informática

Apesar das boas notas em matemática e física, Iana Chan, 27, não cursou ciências da computação na universidade. "Não parecia um curso para mulheres", diz. Mas, ao dar aulas a seu irmão caçula, com dislexia, e ouvir uma colega de trabalho falar que era "burra" e jamais aprenderia a desenhar um site na internet, decidiu enfrentar os clichês e criou um clube de programadoras no ano passado.

O clubinho evoluiu e virou a "prograMaria" (nome inspirado pelas "comedorias" do Sesc e que brinca com o nome Maria), iniciativa que oferece cursos de introdução às ferramentas necessárias para desenhar um site, usar a linguagem JavaScript, além da lógica da programação.

O curso pretende reduzir dois gargalos habituais do mundo tecnológico brasileiro: a falta de mão de obra especializada e de diversidade.

Só 22% dos alunos de ciências da computação -uma das áreas mais promissoras dos empregos do presente e do futuro- são mulheres, segundo o IBGE (apesar de elas serem maioria em boa parte do ensino superior).

Para as 30 vagas da primeira turma da prograMaria -as aulas começaram neste mês- houve 970 inscritas. "Teria que fazer 30 turmas para conseguir dar conta da procura inicial!", surpreende-se Iana.

A iniciativa já foi premiada pelo Google, pela Rede Mulheres Empreendedoras e pelo programa Tech Sampa, da Prefeitura de São Paulo, e conseguiu parcerias com a Intel, a Caelum e a Fiap, onde as aulas são dadas.

A segunda turma começa em agosto. Ela já montou uma rede com 300 voluntárias, entre programadoras, designers e empreendedoras.

A ideia é criar um banco de talentos de mulheres que saibam programar.

NERD ASSUMIDA

Assumidamente nerd, filha de imigrantes chineses criada na área rural de Jundiaí (SP), Chan aprendeu o que era superação com o irmão mais novo, que tinha dislexia e que era cobrado pelo pai exigente: "Se você não aprende, não será nada na vida".

Depois de estudar jornalismo e trabalhar numa fundação ligada à educação, percebeu que todos os desenvolvedores de sites e aplicativos eram homens. "Que engraçado, não tem mulher", pensou.

Com sua amiga designer Luciana Fernandes, 29, aquela que se achava burra para aprender programação, criou a prograMaria, que deve virar uma empresa de formação e recrutamento de mulheres na área.

Até mulheres que têm tecnologia por perto se sentem intimidadas para começar.

Uma das 30 alunas da primeira turma (com aulas aos sábados, das 9h às 16h30), a cineasta paulistana Carol Rodrigues, 32, é filha de analista de sistemas. Adolescente, gostava de ler as apostilas que a mãe estudava.

Mas, quando comprava equipamentos na Santa Ifigênia, pedia que um amigo fosse junto, "ou não me levavam a sério".

O cinema a fez querer voltar à tecnologia. "Na edição de vídeos, você nota o quanto precisa de tecnologia, de programação. Quando uso câmeras digitais, não quero ficar refém por não saber os termos técnicos."
nas séries de TV

Outras iniciativas de feminismo digital têm surgido em São Paulo, como PyLadies e MariaLab -ambas, aliás, querem ensinar programação também para adolescentes.

Nos EUA, a ONG Girls who code (meninas que programam) já treinou mais de 10 mil jovens secundaristas em 40 diferentes Estados, desde o final de 2012. A organização já arrecadou US$ 16 milhões de grandes empresas, como Facebook, Goldman Sachs, AT&T, Microsoft, JPMorgan Chase e Viacom. Várias delas patrocinam bolsas, estágios e até uma rede de ex-alunas para que estas se conheçam e se ajudem na profissão.

À revista "Forbes" a fundadora da Girls who code, Reshma Saujani, disse que estava procurando parcerias com Disney e Hollywood.

"Nós precisamos ter personagens de ficção que sejam garotas programadoras, hackers. Shonda Rhimes [produtora de vários sucessos televisivos, como "Scandal" e "How to Get Away with Murder", com protagonistas negras como ela] precisa fazer uma série sobre uma programadora mulher", sugeriu.


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