Folha de S. Paulo


Auditoria aponta erros da Petros que levaram a perdas bilionárias

Auditoria realizada pela consultoria Ernst & Young (EY) detectou uma série de falhas na análise de investimentos feitos pela Petros, fundo de pensão dos funcionários da Petrobras, que provocaram prejuízos aos aposentados da estatal.

Sob forte ingerência política nos últimos anos, a Petros deve registrar em seu balanço de 2015 deficit de cerca de R$ 20 bilhões, segundo estimativas extraoficiais.

QUEM PAGA A CONTA

Será o terceiro ano seguido de deficit. Por isso, empregados, pensionistas e a própria Petrobras serão chamados a contribuir para cobrir o rombo.

A auditoria da EY analisou 70 operações que somam R$ 1,6 bilhão, entre compra de títulos de dívida de empresas privadas e de cotas em fundos de investimentos, realizadas entre 2004 e 2014.

Todas eram irrecuperáveis ao final de 2014, quando o trabalho foi contratado.

Desse total, R$ 548,7 milhões foram destinados a investimento em operações estruturadas pelo BVA.

FALHAS DIVERSAS

No relatório, ao qual a Folha teve acesso, a EY aponta falhas como compra de títulos com valor acima do mercado, fragilidade na análise dos riscos, conflitos de interesse e a apresentação de garantias insuficientes para as operações.

Em diversos casos, as empresas emissoras dos títulos entraram em recuperação judicial pouco tempo após a operação e não houve esforço para executar as garantias, escreveram os auditores.

Entre eles, uma gestora de recursos do grupo educacional Galileo, que recebeu R$ 24,3 milhões, e a empresa de equipamentos e montagens Inepar, de quem a Petros comprou R$ 100,1 milhões em títulos de dívida.

A Petros informou que abriu comissões internas para averiguar possíveis irregularidades nos 70 investimentos auditados e recomendar melhorias nos processos de decisão (leia texto ao lado).

CERVERÓ E LOBÃO

O relatório cita 12 bancos ou gestoras de recursos responsáveis pelas estruturação das operações auditadas.

Nenhum deles, porém, concentra tantos investimentos quanto o BVA.

De acordo com Cerveró, o senador Edison Lobão (PMDB-MA) fez pressão para que a Petros comprasse cotas de fundos do banco "por volta de 2010".

O relatório mostra que fundação comprou quatro cotas de fundos geridos pelo BVA entre 2010 e 2011, no valor total de R$ 154,5 milhões.

Em 2009, a fundação já havia comprado R$ 51 milhões em títulos de dívida da V55 Empreendimentos, controlada por um sócio do BVA e, ela própria, acionista do banco.

CONFLITO DE INTERESSES

Para a EY, a operação foi ilegal, ao desrespeitar a lei 4594/64 (Lei de Supervisão Bancária), que veda a concessão de empréstimos a empresas do mesmo grupo, para evitar conflitos de interesse.

O relatório foi encaminhado à Superintendência Nacional de Previdência Complementar (Previc), em denúncia de gestão temerária.

OUTRO LADO

A Petros informou que abriu comissões internas para averiguar possíveis irregularidades e recomendar melhorias nos processos de decisão. A fundação contratou um escritório de advocacia para estudar eventuais medidas jurídicas cabíveis.

Segundo a fundação, a EY foi contratada para avaliar os processos de aprovação de investimentos que se tornaram inadimplentes. O relatório foi entregue em 2015.

A Petros diz ainda que já vinha tomando medidas para recuperar perdas na Justiça – até abril, recuperou R$ 42 milhões.

Foi aberta uma comissão para avaliar os investimentos em operações do BVA. A fundação diz que não teve prejuízo com a liquidação do banco.

O advogado Antônio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, diz que o senador Lobão "nega peremptoriamente" ter feito pressão sobre a Petros para investimentos no BVA, conforme afirmou Nestor Cerveró.

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ENTENDA

O QUE
A auditoria foi contratada pela Petros em novembro de 2014, para analisar 70 operações realizadas desde 2004, no valor total de R$ 1,6 bilhão.

MOTIVO
Segundo a fundação, o objetivo foi avaliar os procedimentos para a aprovação dos investimentos, que se mostraram irrecuperáveis.

RESULTADO
A auditoria identificou falhas na análise de crédito, compra de títulos acima do valor de face, conflito de interesses e demora na execução judicial de créditos vencidos.

EXEMPLOS DE OPERAÇÃO COM PROBLEMAS

EMISSOR
TIPO DE OPERAÇÃO
BANCO
DATA:
VALOR:
PROBLEMAS DETECTADOS:

EMISSOR: V55 EMPREENDIMENTOS
TIPO DE OPERAÇÃO: Compra de cédula de crédito bancário (CCB)
BANCO: BVA
DATA: 30/06/2009
VALOR: R$ 51.000.000,00
PROBLEMAS DETECTADOS: Conflito de interesses, desacordo com a lei 4594/64 (Lei de Supervisão Bancária)

EMISSOR: INEPAR S.A
TIPO DE OPERAÇÃOCompra de cédula de crédito bancário (CCB)
BANCO: Banco Paulista SA
DATA: 08/11/2010
VALOR: R$ 20.000.000,00
PROBLEMAS DETECTADOS: Garantias insuficientes, conflito de interesses

EMISSOR: LIGAS GERAIS ELETROMETALURGIA S.A.
TIPO DE OPERAÇÃOCompra de cédula de crédito bancário (CCB)
BANCO: Lemon Bank S.A.
DATA: 23/01/2008
VALOR: R$ 3.688.309,45
PROBLEMAS DETECTADOS: Demora para execução judicial de parcelas vencidas


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