Nenhum país fez como o Brasil em termos de combate à corrupção. Por isso, o potencial de crescimento da economia brasileira é um dos maiores do mundo.
A opinião é de Mark Mobius, presidente executivo da Templeton Emerging Market Group, uma das principais gestoras de investimentos globais, que administra mais de US$ 26 bilhões:
"O Brasil poderá estar crescer 5% ou 6%."
Mas o próprio Mobius afirma que, para aumentar sua alocação de recursos no Brasil, precisará ver primeiro resultados concretos das medidas anunciadas pelo governo interino de Michel Temer.
"Se forem capazes de aprovar a reforma da Previdência, e apenas isso, passarão uma mensagem muito positiva."
Leia a entrevista que Mobius concedeu à Folha, da Indonésia, nesta quinta-feira (26).
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Folha - O sr. comprou ativos brasileiros no fim de 2015 quando ninguém queria fazer isso. Valeu a pena?
Mark Mobius - Os ativos brasileiros tinham perdido muito valor. Não fazia sentido. Esses pânicos do mercado são, normalmente, exagerados. Era uma ótima oportunidade. Valeu muita a pena. Há tantas empresas bem gerenciadas no Brasil, que você pode escolher muito facilmente quando os preços caem muito.
Pode citar algumas?
A óbvia seria a Embraer. Mas os bancos também. Tanto o Bradesco quanto o Itaú são ótimas empresas, muito bem gerenciadas. Há outras.
Como está sua alocação de recursos no Brasil, abaixo da média, igual ou acima?
Eu diria que estamos provavelmente neutros ou ligeiramente abaixo da média em Brasil, mas não muito.
O que precisa acontecer para o sr. aumentar seus investimentos aqui?
Temos de ver como a nova administração enfrentará os problemas. A dívida do governo é muito alta. A relação entre a dívida e o PIB é muito alta. Pode ser que vejamos uma alta de impostos, o que terá impacto nas empresas e nos consumidores.
A mudança de governo era uma condição necessária para o Brasil se recuperar?
Sim. Uma mudança era necessária. O governo antigo poderia fazer mudanças. Mas, do ponto de vista psicológico, a troca deu aos investidores a confiança de que o país será capaz de fazer as mudanças desejáveis.
Qual foi sua impressão inicial do novo governo?
Até agora, muito bem. Tanto as medidas quanto o time econômico são muito bons. Obviamente, eles terão muitas dificuldades. Terão de reverter uma crise fiscal. Isso não será fácil. Mas acho que começaram com o pé correto, conversando sobre resolver a situação fiscal, reformar o sistema previdenciário etc.
Se eles conseguirem aprovar as medidas principais, quanto tempo levará para a economia voltar a crescer?
Acho que demorará um ano. Mas o mercado tenderia a antecipar essas mudanças. Então, provavelmente, veremos o mercado reagir antes disso, em seis meses ou antes. Mas tudo isso dependerá da habilidade do governo de realmente implementar essas mudanças. Provavelmente, veremos manifestações nas ruas.
A reforma da Previdência é um tema muito, muito importante e, ao mesmo tempo, politicamente muito sensível.
Se forem capazes de aprovar isso e apenas isso, passarão uma mensagem muito positiva para o mercado.
Outra maneira de conseguir isso seria fazer privatizações e concessões, que trariam mais dinheiro para o orçamento do governo.
A sociedade está preparada para as mudanças duras?
Acho que sim. Se você olhar para a situação dos impostos, há muita gente -muita gente rica- que não tem pagado impostos como deveria. Claro que é preciso olhar para as pessoas muito pobres. Não há razão para que as transferências para elas não possam continuar.
Mas há pessoas que têm recebido pagamentos que não deveriam receber.
Quais são os riscos que o Brasil ainda pode enfrentar?
Na verdade não há muitos riscos agora. As coisas ruins já aconteceram. Os preços das commodities estão começando a se recuperar, o que é bom para o Brasil. A moeda está muito barata agora, isso também é bom.
Como o Brasil se compara com outros países em termos da situação atual da economia e de seu potencial de recuperação?
O Brasil está em uma situação ruim do ponto de vista fiscal e da dívida. Mas o potencial de melhora é provavelmente maior no Brasil do que em muitos lugares que consigo pensar. É provavelmente o maior.
E a razão disso é que o Brasil mostrou a habilidade de enfrentar a corrupção. O que os procuradores e a Justiça fizeram nesse sentido é muito notável. Aqui na Ásia, por exemplo, não há nada como isso. O Brasil realmente fez um trabalho fantástico ao expor esses problemas. Nenhum outro país fez isso.
Quando você tem transparência, vê mudanças. Foram criadas as bases para mudanças significativas.
Quanto a economia brasileira pode voltar a crescer com isso, se as medidas necessárias forem aprovadas?
O Brasil poderá crescer 5% ou 6%. Não há razão para não atingir isso porque o país tem uma população ainda jovem, recursos fantásticos e um governo novo que quer enfrentar os problemas.
O banco central americano deverá subir juros em breve, antes do esperado. Isso terá efeito negativo para os emergentes e para o Brasil?
Não acho, porque as taxas de juros já são tão altas no Brasil e em outros mercados emergentes que um aumento de 0,25 ou 0,5 ponto percentual de juros nos EUA não terá um grande impacto.
RAIO-X MARK MOBIUS
IDADE
79
FORMAÇÃO
Doutorado em economia e ciências políticas pelo Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT)
CARREIRA
Presidente da Templeton Emerging Markets Group, onde ingressou em 1987. Tem 40 anos de experiência com mercados emergentes
LIVROS
Autor das obras "Trading with China" e "The Investor's Guide to Emerging Markets", entre outras