Folha de S. Paulo


Pessoas gastam no Facebook quase o mesmo tempo que para comer e beber

Eric Thayer/Reuters
A portrait of the Facebook logo taken in Ventura, California is shown this December 21, 2013 file photo. Facebook Inc's revenue increased 63 percent in the fourth quarter, as advertising on its mobile services continued to accelerate. REUTERS/Eric Thayer/Files (UNITED STATES - Tags: BUSINESS LOGO) ORG XMIT: TOR256
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O Facebook anunciou resultados trimestrais deslumbrantes, na semana passada. A receita líquida quase triplicou, para US$ 1,5 bilhão, e o número de usuários ativos por mês atingiu o recorde de 1,65 bilhão. Mas foi um número muito menor que atraiu minha atenção.

Cinquenta minutos. Esse é o tempo médio que os usuários dedicam às suas plataformas Facebook, Messenger e Instagram a cada dia, e não inclui os números do popular app de mensagens WhatsApp, que a companhia controla.

Talvez não pareça muito. Mas há apenas 24 horas no dia, e a pessoa média dorme 8,8 horas diárias. Isso significa que o usuário médio passa mais de 6% de seu tempo útil diário no Facebook.

O total supera o de quase qualquer outra atividade de lazer entre as acompanhadas pelo Serviço de Estatísticas do Trabalho norte-americano, com a exceção de assistir televisão e filmes (média diária de 2,8 horas). É mais tempo do que as pessoas dedicam a ler (19 minutos), fazer esportes ou exercícios (17 minutos) ou eventos sociais (quatro minutos). E quase tanto tempo quanto as pessoas gastam para comer e beber (1,07 hora).

"Se você pensar no assunto, 50 minutos é muito tempo, é um número imenso", disse Ken Sena, diretor executivo e analista da Evercore, uma companhia que pesquisa o uso de serviços de Internet pelos consumidores. "Usualmente, quando uma plataforma expande sua base de usuários, o tempo médio de uso cai, porque muitos dos usuários novos não são tão ativos".

Mas o tempo médio dedicado pelas pessoas ao Facebook subiu, de cerca de 40 minutos ao dia em 2014, enquanto o número médio de usuários mensais também disparava. Alguns usuários devem estar passando muitas horas ao dia no site, talvez por conta de uma síndrome conhecida extraoficialmente como distúrbio de vício em Internet.

"Eles estão fazendo um excelente trabalho em termos de descobrir maneiras de manter as pessoas no site", disse Sena.

Mark Zuckerberg, o presidente-executivo do Facebook, revelou o dado sobre os 50 minutos de uso quase casualmente, em conversa com analistas sobre os resultados da empresa, no mês passado. Mas a informação poderia facilmente ter sido o primeiro slide em sua apresentação, porque o tempo se tornou o cálice sagrado das novas mídias.

O tempo é a o melhor indicador de engajamento, e engajamento se correlaciona a efetividade publicitária. O tempo também eleva o estoque de impressões publicitárias que o Facebook pode vender, o que traz maior faturamento (um avanço de 52% no trimestre passado, para US$ 5,4 bilhões).

E o tempo permite que o Facebook aprenda mais sobre os hábitos e interesses de seus usuários, e com isso direcione melhor a sua publicidade. O resultado é um potencial efeito de rede que os concorrentes terão dificuldade para acompanhar.

Com base no tempo médio dedicado à plataforma o Facebook tem poucos rivais. De acordo com os mais recentes dados da comScore, o único que se aproxima é o YouTube, da Alphabet, ao qual os usuários dedicam em média 17 minutos ao dia. Isso é menos do que os 35 minutos diários dedicados ao Facebook (os números da comScore diferem dos oferecidos pelo Facebook porque se baseiam apenas em usuários localizados nos Estados Unidos.)

Os usuários dedicam em média nove minutos ao dia a todos os sites do Yahoo, dois minutos ao LinkedIn e apenas um minuto ao Twitter, de acordo com a comScore. Não admira que o Twitter enfrente dificuldades para atrair anunciantes.

Os usuários que passam mais tempo no Facebook tendem também a se enquadrar à faixa etária dos 18 aos 34 anos, muito cobiçada pelos anunciantes.

"Em termos gerais, o uso mais alto do Facebook tende a ter peso maior entre os usuários mais jovens, e mais especificamente na geração milênio", disse Andrew Lipsman, vice-presidente de marketing e percepções da comScore. "Você ouve uma narrativa de que os jovens estão deixando o Facebook. Os dados demonstram que isso simplesmente não é verdade. Os usuários jovens têm maior apetite pela mídia social, e passam muito tempo em múltiplas redes. Mas passam mais tempo no Facebook, por larga margem".

A disparada na popularidade do Facebook e de outras mídias sociais naturalmente traz algumas questões: o que os usuários do Facebook fazem no site durante os 50 minutos que ficam por lá? Isso interfere com seu trabalho (e produtividade), ou no caso dos jovens, com o estudo e leituras?

Esse é um dado difícil de extrair. Para começar, as pessoas não querem admitir em pesquisas que estão usando a mídia social quando na verdade deveriam estar fazendo outra coisa.

Embora o Serviço de Estatísticas do Trabalho pesquise sobre quase todas as atividades que possam concebivelmente ocupar o tempo dos norte-americanos (o que inclui esgrima e exploração de cavernas), não registra especificamente o tempo que elas dedicam à mídia social, tanto porque a atividade pode ter propósitos múltiplos - trabalho e lazer igualmente - e porque as pessoas muitas vezes o fazem enquanto estão ostensivamente engajadas em outras atividades, de acordo com um porta-voz da agência governamental.

A categoria mais próxima seria de "uso de computador para lazer", que cresceu de oito minutos em 2006, quando o serviço começou a recolher os dados, para 14 minutos em 2014, a data da pesquisa mais recente. Ou talvez seja "comunicação e socialização", que caiu de 40 para 38 minutos.

Mas o tempo dedicado à maioria das atividades de lazer não mudou muito nos oito anos pesquisados pela agência. O tempo dedicado à leitura caiu de 22 para 19 minutos. Assistir TV e filmes subiu de 2,57 para 2,8 horas. O tempo médio dedicado ao trabalho caiu de 3,4 para 3,25 horas. (O total pode parecer baixo, mas boa parte da população, entre os quais os jovens e idosos, não trabalha.)

Os números da agência, porque cobrem toda a população, podem ser amplos demais para capturar mudanças dentro de categorias demográficas importantes. A comScore reportou uma queda de 2% no número de horas dedicadas a assistir TV (ao vivo ou gravada) no ano passado, e disse que os telespectadores mais jovens, especialmente estavam abandonando a tradicional TV ao vivo.

As pessoas dos 18 aos 34 anos dedicam apenas 47% de seu tempo televisivo à TV em formato convencional, e 40% dele a assistir programas de TV em aparelhos móveis. Entre as pessoas com 55 anos ou mais, 70% do tempo de TV é dedicado a televisores, de acordo com a comScore. Assim, entre os jovens, o avanço no tempo dedicado à mídia social pode estar acontecendo em detrimento da TV.

Lipsman disse que estava cético quanto à correlação entre o uso da mídia social e uma estagnação da produtividade ou declínio nos padrões educacionais. Ele disse que os dados da comScore sugerem que as pessoas estão passando em média apenas seis ou sete minutos ao dia usando mídia social em seus computadores de trabalho.

"Não creio que o Facebook esteja tomando o lugar de outras atividades", ele disse. "As pessoas o usam durante as pausas em seu dia, no elevador, no caminho do trabalho, ou enquanto esperam. Esse é o principal fator para boa parte desse engajamento".

O Facebook, naturalmente, está tentando criar maneiras de nos convencer a dedicar ainda mais tempo à sua plataforma. Uma iniciativa crucial é melhorar o News Feed, adaptando-o mais precisamente às necessidades e interesses de seus usuários, com base no tempo que as pessoas dedicam a ler determinados posts. Para pessoas que demonstram preferência por vídeos, mais vídeos aparecerão no topo do news feed. Quanto mais tempo as pessoas dedicarem ao Facebook, mais dados gerarão sobre elas e melhor a companhia poderá ser em sua tarefa.

Como me disse a porta-voz Jessie Baker, do Facebook, "o tempo que as pessoas dedicam ao nossos site é um bom indicador de se estamos propiciando valor a elas. Quanto melhores formos em lhes oferecer o que mais desejam ver, mais provável é que elas voltem ao app e dediquem tempo a ele".

Obviamente, existem limites para o tempo que os usuários podem dedicar ao Facebook, porque o dia tem só 24 horas. Mas, excetuada essa limitação, "não creio que exista limite máximo", disse o analista Sena. "Todo mundo quer ser a plataforma usada o dia inteiro, da mesma forma que algumas pessoas mantinham a TV ligada o dia inteiro, no passado. O Facebook provavelmente está na melhor posição para isso, porque as pessoas já são usuárias bastante ativas".

Tradução de PAULO MIGLIACCI


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