Folha de S. Paulo


Grupo Bertin tenta reverter multa de R$ 3 bi da Receita por fusão com JBS

Diego Giudice/Bloomberg
A empresa de alimentos JBS; operação foi realizada em 2009

O grupo Bertin tenta reverter no Carf (Conselho Administrativo de Recursos Fiscais) autuação no valor de R$ 3,1 bilhões aplicada pela Receita Federal por supostas irregularidades no processo de fusão de suas operações com a JBS, do setor de carnes.

O processo está no Carf desde agosto do ano passado, segundo a Folha apurou. O procedimento fiscal, referente à operação entre os frigoríficos realizada em 2009, é de dezembro de 2014.

A multa da Receita, no valor de R$ 3,1 bilhões em impostos e multas, foi revelada pelo jornal "O Estado de S.Paulo" no domingo (28).

O alvo da Receita é uma operação complexa de reorganização societária que resultou na incorporação do frigorífico Bertin pela JBS.

Para a Receita, a troca de ações entre os grupos possibilitou ao fundo de investimento em participações Bertin FIP (criado especificamente para essa operação e que passou a ser controlador do Bertin) um ganho de capital de R$ 3,1 bilhões que não foi tributado.

No procedimento fiscal de mais de cem páginas, ao qual a Folha teve acesso, a Receita diz que o fundo foi "fraudulosamente constituído e utilizado" na transação.

Para a Receita, um dos motivos da constituição do FIP é a tributação inferior e diferenciada aos quais fundos de investimento têm acesso. Até então, o Bertin era controlado pela Tinto (antiga Bracol), que passou a ter 100% das cotas do Bertin FIP.

Com o fundo, os Bertin pagariam menos impostos sobre os ganhos da operação.

No procedimento da Receita, a Citibank DTVM, administradora do Bertin FIP até 2012, foi autuada como devedora solidária da dívida.

A administradora se defende na Justiça afirmando que prestava apenas serviços de tesouraria e de contabilidade ao fundo, não tendo participação em decisões administrativas ou tendo qualquer benefício com a operação.

FRAUDE

Além da manobra tributária, a Receita também levanta uma suspeita de fraude na troca de ações envolvendo a Blessed, empresa de Delaware, nos EUA, que já foi motivo de discordância entre acionistas do Bertin e da JBS.

O Fisco ressalta que, cinco dias antes de o Bertin FIP se tornar efetivamente acionista da JBS na troca de ações prevista na operação, a Tinto –controladora do fundo– cedeu 67% de suas cotas no FIP para a Blessed.

Chama a atenção o valor dessa transação: as cotas, que valeriam "bilhões de reais", segundo a Receita, foram transferidas "pela irrisória quantia de US$ 10 mil". Dias depois, mais 19% das cotas foram cedidas "a preço vil" de R$ 17 mil.

Em 2010, destaca a Receita, o patrimônio líquido do Bertin era de R$ 4,9 bilhões. "Não faz sentido que cotas emitidas por fundo que administra patrimônio neste valor tenham sido cedidas por apenas US$ 10 mil e R$ 17 mil", diz o procedimento.

A Blessed já foi motivo de briga entre o grupo Bertin e a JBS. Em 2013, representantes da família Bertin disseram à Folha que cotas do fundo Bertin FIP haviam sido desviadas de forma "escabrosa" para a Blessed e que essa empresa seria da J&F, holding controladora da JBS.

Em 2014, no entanto, a JBS esclareceu, em resposta a questionamento da CVM (Comissão de Valores Mobiliários), que os sócios da Blessed são seguradoras com sede em paraísos fiscais.

OUTRO LADO

Segundo a J&F, a incorporação do Bertin foi realizada "com total transparência e rigoroso cumprimento da legislação vigente". Por meio de nota, negou qualquer tipo de fraude e lembrou que contou com assessorias competentes em questões tributárias e societárias, como os escritórios Barbosa, Müssnich & Aragão e Pinheiro Neto Advogados, além dos bancos Santander e JP Morgan.

O grupo Bertin e o Citibank não quiseram comentar.


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