Folha de S. Paulo


Polônia pagará R$ 500 ao mês a quem tiver 2º filho e alarma economistas

Grzegorz Momot - 4.abr.2015/Efe
Partido vitorioso nas eleições na Polônia prometeu R$ 500 ao mês para quem tiver mais de um filho
Partido vitorioso nas eleições na Polônia prometeu R$ 500 ao mês para quem tiver mais de um filho

Na pequena cidade de Sierakowice, no norte rural da Polônia, mulheres grávidas se reuniram na prefeitura alguns dias antes da eleição geral de outubro passado, com cifrões nos olhos.

O partido vitorioso havia prometido aos eleitores que pagaria 500 zloty ao mês (ou R$ 513 por criança além da primeira) como ajuda aos pais que decidissem ter dois ou mais filhos.

Diante de uma das mais graves crises demográficas em preparo na Europa, e ávido por recompensar seu eleitorado básico formado pela classe trabalhadora mais tradicional, o Partido da Lei e Justiça fez dessa assistência mensal isenta de impostos sua principal promessa eleitoral, uma aposta populista de € 5 bilhões que, segundo os economistas, coloca em questão a estabilidade fiscal da Polônia.

A lei de assistência foi assinada esta semana e os pagamentos começarão em julho, o que representa renda adicional que pode resultar, para as famílias mais numerosas, no equivalente a mais um salário mensal e, espera Varsóvia, aumentar a popularidade do governo e estimular a natalidade de um dos países com mais baixos índices na Europa quanto a esse quesito.

"Não deveríamos nos surpreender por elas terem aparecido [para perguntar sobre os pagamentos]", disse Zbigniew Fularczyk, vice-prefeito do município de Sierakowice. "A mídia só fala nesse programa. As esperanças das pessoas estão sendo alimentadas o tempo todo. Minha impressão é de que não falamos de outra coisa que não nesse programa no país. Espero que tenhamos dinheiro suficiente para pagar todas essas pessoas".

O custo da nova política é uma preocupação generalizada, dado que entre 2,7 milhões e 3,7 milhões de crianças terão direito ao benefício, o que representa grande alta de despesas ante a situação atual, na qual apenas famílias com renda inferior a 675 zloty mensais (R$ 693) recebem benefício da ordem de 118 zloty por filho (R$ 121).

O Lei e Justiça, um partido conservador influenciado pela Igreja Católica, poderosa na Polônia, vem há muito argumentando que os frutos do boom econômico dos últimos 10 anos no país couberam apenas à classe média mais progressista e urbana. Recompensar as pessoas de classe trabalhadora, que tipicamente têm famílias maiores e vivem em áreas rurais, especialmente nas região leste do país, mais pobre, era uma peça chave na plataforma eleitoral do partido.

"Esse é um grande passo na direção de consertar o que há de errado na Polônia - apoio real do Estado polonês às pessoas mais importantes de nosso país: as famílias com filhos", disse o presidente Andrzej Duda. "Não quero uma Polônia em que eu tenha de ouvir o tempo todo que algo não pode ser feito".

Bancos, economistas e ministros antecipam que o benefício, que se aplica a famílias com dois ou mais filhos menores de idade e é retroativo para as crianças já nascidas, custará cerca de € 3 bilhões aos cofres públicos este ano, um valor que subirá para € 5 bilhões em 2017, quando valerá pelos 12 meses do ano.

O custo será parcialmente coberto por novos impostos sobre os bancos e supermercados, quase todos controlados por grupos estrangeiros, e por € 2,1 bilhões em arrecadação extraordinária que o governo obterá com a venda de licenças de telecomunicação. Mas determinar de que maneira Varsóvia cobrirá essa lacuna orçamentária no ano que vem é questão que vem incomodando muita gente.

PREOCUPAÇÃO

Desenvolvido e promovido pelos pensadores políticos do partido, e não por seus especialistas em Economia, o benefício causou preocupação no Ministério das Finanças. A Polônia reduziu seu deficit fiscal de 8% em 2010 a 3% no ano passado, mas o medo quanto ao aumento de gastos levou o rendimento sobre o título de dívida polonês com prazo de 10 anos a subir em 78 pontos básicos nos últimos 12 meses. Varsóvia arrecadou mais de 6,5 bilhões de euros por meio de colocação de títulos este ano, a fim de cobrir os gastos ampliados.

A agência de classificação de crédito Fitch alertou no mês passado que a classificação A dos títulos de dívida pública poloneses se baseava em um deficit inferior a 3%, nível que a União Europeia considera aceitável.
"Se recebermos um sinal de que o deficit será maior, isso servirá como gatilho para rebaixamento da classificação", disse Arnaud Louis, o principal analista da Fitch para a Polônia.

Mateusz Morawiecki, primeiro-ministro assistente da Polônia, descreveu o benefício como "dinheiro grosso", mas disse que o crescimento econômico em alta deve ajudar a cobrir os custos. Ele reconheceu que era incerto que efeito a medida teria sobre o índice de natalidade.

"É uma medida crua... Não sabemos exatamente que tipo de impacto terá", ele disse. "Depois de 12 ou 24 meses poderemos avaliar o impacto e talvez flexibilizar o benefício", ele acrescentou, sem fornecer detalhes.

De acordo com os cálculos de Morawiecki, a Polônia verá uma queda de 5,3 milhões de pessoas, ou 22%, em sua população em idade de trabalho nos próximos 35 anos, o que bloqueará as perspectivas de crescimento, com a disparada nos custos de aposentadoria e saúde da população idosa cada vez maior.

"Isso não é encorajamento a ter um segundo filho, e ninguém deveria entender a medida dessa forma", disse Paulina Bromek-Paprocka, mãe de um filho apenas e portanto não beneficiária do programa. "Não estou decidida quanto a ter ou não um segundo filho, e 500 zloty não influenciarão essa decisão".

Tradução de PAULO MIGLIACCI


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