Folha de S. Paulo


Projetos que estimulam doações à educação empacam no Congresso

Eduardo Anizelli/Folhapress
Fachada do prédio da Universidade Anhembi Morumbi na Avenida Paulista, em São Paulo
Fachada do prédio da Universidade Anhembi Morumbi na Avenida Paulista, em São Paulo

Estão empacados no Congresso dois projetos de lei que poderiam impulsionar as doações para universidades privadas e especialmente as públicas no Brasil, hoje em situação financeira frágil.

O projeto de lei 643/2012 da Câmara e o 16/2015 do Senado criam os fundos patrimoniais vinculados, semelhantes aos tradicionais "endowment funds" das universidades nos EUA, para receber e gerir recursos de doações de pessoas físicas e jurídicas.

Além disso, estabelecem um incentivo fiscal para essas doações —preveem uma "lei Rouanet" para instituições de ensino e outras entidades sem fins lucrativos.

O contribuinte pessoa física poderia destinar até 6% de seu imposto devido a essas instituições, como acontece hoje com projetos pré-aprovados pelo governo na área cultural (Lei Rouanet), audiovisual, esportes, fundos governamentais de crianças, adolescentes e idosos, e pessoas com deficiência. Já as empresas poderiam doar até 2% do lucro operacional, reduzindo sua base tributável.

O projeto da Câmara, cujo relator é o deputado Paulo Teixeira (PT-SP), foi criado em 2012 e tramita lentamente. Já o projeto do Senado, de autoria da senadora Ana Amélia (PP-RS), foi apresentado em fevereiro e caminha um pouco mais rápido.

Ambos têm poucas chances de serem aprovados na atual conjuntura de crise fiscal, porque implicam perda de receita para o governo.

Segundo estimativa da Secretaria da Receita Federal, o projeto da Câmara teria impacto fiscal de no máximo R$ 8,9 bilhões em 2016 e R$ 9,7 bilhões em 2017 na arrecadação do Imposto de Renda de pessoa física. No IR de pessoa jurídica, o impacto seria de R$ 6,7 bilhões em 2016 e de R$ 7,4 bilhões em 2017.

"Mesmo na crise, precisamos considerar o benefício dessa legislação, pois instituições públicas como a USP serão as principais beneficiadas", diz a senadora.

A assessoria do deputado Paulo Teixeira diz que, apesar do mérito, o projeto pode ser considerado inapropriado pelo governo no momento atual, mas espera aprová-lo em comissão em 2016.

Os fundos patrimoniais investem os valores doados, seu patrimônio, e só usam os rendimentos. Em caso de necessidade, usam apenas um limite estipulado do patrimônio por ano, e prestam contas.

Incentivo a doações

ESTADOS UNIDOS

O "endowment" da Universidade Harvard, nos EUA, é de US$ 35,8 bilhões e financia 35% das operações da universidade, que teve um superavit no orçamento de US$ 62 milhões (de US$ 4,5 bilhões de receita) no ano fiscal terminado em junho de 2015.

Já a Universidade de São Paulo aprovou orçamento para 2016 com previsão de deficit de R$ 540 milhões (11% do total de R$ 5,25 bilhões) e vem fazendo cortes sistemáticos.

Segundo Vahan Agopyan, vice-reitor da USP, qualquer doação que é feita hoje acaba no orçamento geral da universidade, não pode ser destinada para áreas específicas.

A universidade criou este mês o programa Parceiros da USP, para estimular a doação de móveis, imóveis e reformas na infraestrutura dos prédios, mas ainda não está funcionando de forma plena.

Atualmente, uma pessoa que queira doar para uma determinada faculdade ou projeto específico na USP, por exemplo, tem dificuldades, pois os recursos são destinadas ao orçamento geral. Além disso, não há incentivo fiscal.

Nos EUA, as doações para entidades sem fins lucrativos são deduzidas da base tributável do contribuinte o que reduz o imposto devido. Lá, quase todas as universidades têm fundos patrimoniais.

Alguns bilionários brasileiros são grandes doadores nos EUA. O empresário Jorge Paulo Lemann, ex-aluno de Harvard, estabeleceu um fundo de bolsas para brasileiros estudarem na universidade e fez doações para a plataforma de educação on-line da Harvard Business School.

André Esteves, ex-controlador do banco BTG que esteve preso sob acusação de obstruir a Justiça na operação Lava Jato, doou para Harvard e tem um auditório em sua homenagem, o Esteves Hall.

Para contornar a dificuldade das doações para a USP, a faculdade de engenharia criou o fundo patrimonial Amigos da Poli. É uma entidade jurídica independente que capta recursos para fazer melhorias na faculdade a partir de projetos dos alunos.

Segundo Máximo Hernandez Gonzalez, diretor-presidente da Amigos da Poli, o fundo captou R$ 600 mil este ano, após quase R$ 1 milhão em 2014. "Fomos atingidos pela crise", afirma.

Para Paula Fabiani, diretora-presidente do Idis, o Instituto para o Desenvolvimento do Investimento Social, os "endowments" dão segurança jurídica a quem doa. "Se a gente tivesse aprovado essa legislação antes, universidades teriam captado bastante nos tempos de vacas gordas e agora, com a crise, teriam um excedente para usar."


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