Folha de S. Paulo


Pessoas esperam que marcas partam para a ação, diz empreendedor

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Para sobressair em um mundo em que o consumidor é o grande influenciador de decisões de compra, as marcas precisam gerar experiências que façam sentido e que toquem de alguma forma seu público.

"Marcas que têm um propósito claro começam a ter um diferencial competitivo mensurável. Deixou de ser uma coisa que as marcas estão fazendo pois querem ser boazinhas e se posicionar institucionalmente como responsável e passou a ser uma coisa efetiva, com influência na decisão de compra", diz Marcelo Tripoli, autor de "Meaningful Marketing - Como A sua Vida Pode ter Significado na Vida das Pessoas" (Clube Select).

Empreendedor e especialista em mídias digitais, vice-presidente da SapientNitro para a América Latina, Tripoli falou na edição deste mês do Arena do Marketing, programa da "TV Folha" com transmissão ao vivo e que foi ao ar na quarta (16). O bate-papo teve ainda a presença de Ismael Rocha, diretor acadêmico de graduação da ESPM-SP.



Definição
O advento digital mudou a dinâmica do nosso dia a dia, e as marcas não conseguem mais manter a sua relevância só pela mensagem que entregam e mostrar que estão ali para fazer alguma coisa ou gerar um valor para aquelas pessoas. O manual tradicional do marketing, focado nos quatro Ps [produto, preço, praça e promoção], está completamente desatualizado. Cada um de nós virou um emissor de mensagem, não só um receptor. A gente saiu de uma posição passiva em que éramos impactados pelos meios de massa e passou a ser ativo e a influenciar na decisão de compra de outros consumidores. O sonho de consumo de uma empresa é que os clientes voluntariamente recomendem seu produto para os amigos.

Ser bonzinho
Marcas que têm um propósito claro começam a ter um diferencial competitivo mensurável. Deixou de ser uma coisa que as marcas estão fazendo pois querem ser boazinhas e se posicionar institucionalmente como responsável e passou a ser uma coisa efetiva, com influência na decisão de compra. Hoje em dia, as marcas que não têm propósito são vistas como mercadoria. E mercadoria você compra o mais barato.

Propósito
"Meaningful marketing" é mais uma relação de propósito entre quem está consumindo o produto e quem está oferecendo. Não necessariamente tem que estar conectado com os valores da corporação. Idealmente está. Se tudo estiver conectado, a empresa vai ser mais bem-sucedida no longo prazo. Mas já dá para considerar uma relação significativa se naquela transação a empresa está preocupada com a experiência do consumidor por inteiro.

Experiência
Experiência de produto é marketing. Melhorar o produto ou serviço está no coração do marketing bem-sucedido. É preciso cuidar da relação com o consumidor não só na hora da transação. E, para cada momento da jornada do consumidor com a sua marca, identificar quais as oportunidades de fazer algo pra tornar a experiência mais prazeirosa, mais conveniente, mais significativa.

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O vice-presidente da SapientNitro para a América Latina, Marcelo Tripoli
O vice-presidente da SapientNitro para a América Latina, Marcelo Tripoli

Por onde começar
É muito mais fácil para uma start-up que já nasce com propósito claro. Mas as marcas têm de começar por algum lugar, pode ser com um produto. As empresas são conglomerados muito grandes. Se forem fazer trabalho de cima para baixo, para que o propósito chegue à raiz de uma empresa que durante muito anos teve uma atuação muito diferente, dificilmente você vira esse barco.

Coerência
Não pode haver diferença entre entre o que a marca diz e o que ela faz. Não adianta uma marca de esporte vender imagem de "pratique esporte", sem ajudar a empoderar a pessoa para praticar esporte de fato. Temos visto marcas construindo equipamentos esportivos nas cidades para ajudar as pessoas a fazer esporte. O banco ajuda ou ele só tem uma campanha que fala da importância do crédito consciente? O que ele faz de fato para que as pessoas sejam mais conscientes no uso do crédito? As pessoas esperam que as marcas partam para a ação.

Sem limitações
Acho que aqui a gente volta no contexto do mundo digital. Antigamente, no mundo off-line, as empresas eram mais limitadas em termos de canais para poder partir para ação. Ela tinha que comprar um espaço na TV. Agora ela cria canal no youtube e pode dar um tutorial de educação financeira. O custo dos meios de distribuição de conteúdo tende a zero. Isso destravou a possibilidade da marca sair da falar e ir para a ação.

Repensar a comunicação
O digital traz novas possibilidades para as marcas, mas, para isso, é preciso repensar o modelo.
A comunicação e o marketing podem influenciar na concepção do produto, pois ele tem o pulso no consumidor, faz pesquisa, tem acesso à informação e sensibilidade. E isso é extremamente rico para a concepção do próprio produto.

Recomendação
Uma relação de consumo com significado gera fidelidade e também recomendação espontânea. O Uber cresceu a sua base basicamente no boca a boca. Eles não investem em publicidade. Isso acontece quando você usa o serviço e acha incrível. Claro que o Uber incentiva, oferecendo crédito e estimulando as pessoas a recomendar. Mas, se a experiência de uso não for boa, ela não vai passar a diante. E o principal motivo para o Uber ter experiência que é considerada acima da média é não precisar usar o cartão para pagar. Você chega, abre a porta e sai. O momento de pagar é desgastante, emocionalmente ruim. Ai alguém pensou em melhorar a experiência e eliminou isso. O consumidor é um agente para ajudar a fazer a marca ser construída. Mas a
briga pelo tempo das pessoas é feroz. E você só conquista o tempo dela se você der algo que tenha um significado mais profundo para aquela pessoa.

Relação com consumidor
Tem muito que evoluir. Não dá para uma marca ser significante se ela é líder de reclamação. Ela precisa prestar bom serviço e entregar aquilo a que se propõe. Há um efeito rebote no Brasil que é o contrário. A gente como sociedade tem sentimento geral de levar vantagem. Tem muita marca que não faz o seu papel e merece estar no Reclame Aqui. Mas muitas vezes as empresas não melhoram a experiência pois o consumidor abusa. Nos EUA, você compra qualquer coisa e, seis meses depois, você pode trocar. A premissa é que o cara não vai usar a roupa na festa e depois vai devolver. Aqui, o que vem primeiro? Não sei responder. Mas os dois lados precisam mudar. Existe uma responsabilidade do consumidor como cidadão. E empresas querendo ganhar dinheiro em cima de não oferecer a melhor experiência para o consumidor. É um péssimo sinal que a gente tenha tantas entidades de defesa do consumidor, mediando e infantilizando a vida de todos nós. Como sociedade isso é muito ruim. A melhor receita para isso é concorrência.


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