Folha de S. Paulo


TV digital pode custar R$ 5,6 bilhões às teles

Jorge Araújo - 21.jul.2011/Folhapress
Funcionário inspeciona transmissor de TV digital na cidade de Santa Rita do Sapucaí (MG)
Funcionário inspeciona transmissor de TV digital na cidade de Santa Rita do Sapucaí (MG)

A novela em que se transformou a migração da TV analógica para digital não promete final feliz para as teles, que já pagaram R$ 5,8 bilhões e podem ter de gastar quase o dobro para usar as frequências hoje ocupadas por emissoras de TV aberta.

O problema foi criado no ano passado, quando o governo, para fazer caixa, leiloou as frequências da TV aberta para que as operadoras de telefonia oferecessem a rede 4G (de alta velocidade). O leilão gerou R$ 5,8 bilhões para o caixa do governo Dilma.

Até então, o prazo para que as emissoras desligassem o sinal analógico era 2018. Com a antecipação, ficou estabelecido que as emissoras migrariam para outra frequência antes de 2018.

Em troca, as teles aceitaram, na época do leilão do 4G, pagar R$ 3,6 bilhões para financiar famílias sem recursos a fim de que trocassem televisores ou instalassem receptores de TV digital.

Estabeleceu-se, na sequência, um cronograma de cidades e uma regra para o desligamento, que só ocorreria se pelo menos 93% dos lares do município tivessem algum tipo de receptor digital.

O desligamento começaria em 29 de novembro em Rio Verde (GO). Mas lá só 62% dos lares tinham recepção digital na data prevista. Houve adiamento. Na quarta (9), o ministro André Figueiredo (Comunicações) admitiu que o sinal analógico poderá ser desligado na cidade goiana sem que a regra seja cumprida.

A Folha apurou que houve uma mudança na metodologia do cálculo do índice, que será de de 90%. O ministro pretende anunciar essa alteração na terça (15). Nesse dia, também deverá apresentar a alteração do cronograma de desligamento no país que está em negociação entre emissoras, teles e governo.

A ideia na mesa é separar as cidades em três grupos. No primeiro, o desligamento começaria pelas regiões metropolitanas das capitais e mais 15 cidades grandes até 2018.

Essa medida cobriria 38 milhões de domicílios. Destes, 14 milhões teriam receptores pagos pelas teles para quem está inscrito no cadastro único do governo como beneficiário de programas sociais. Só isso permitiria turbinar o índice de cobertura digital em 20% nessa região.

No segundo grupo, entrariam municípios maiores até 2023 -boa parte já estava prevista para até 2018. Por fim, as cidades com menos de 30 mil habitantes não teriam o sinal analógico desligado. Ou seja: antes, a maior parte dos lares teria exclusivamente TV digital até 2018. Agora, isso só vai acontecer em 2023.

Além disso, o governo pediu que as emissoras de TV colocassem tarjas pretas na tela restringindo o acesso às imagens -para estimular o telespectador a trocar de TV.

Outra proposta para inflar os índices foi contabilizar os lares que só têm TV a cabo. Para os técnicos, eles já recebem a programação da TV aberta -o que daria mais 5%.

CONTA AMARGA

Como ainda assim será praticamente impossível cumprir os novos 90%, o presidente do grupo de trabalho da TV digital, o conselheiro da Anatel Rodrigo Zerbone, também propôs às empresas de TV paga por satélite que troquem as caixas receptoras atuais por caixas que também recebam o sinal da TV aberta digital, mas somente nos lares híbridos (com TV aberta e TV paga). Em Rio Verde, isso daria um aumento de 7%.

A ideia é um teste para uma proposta que tramita na Anatel e que pretende obrigar essas empresas a trocar cerca de 12 milhões de caixas só para que elas também recebam o sinal digital local das emissoras de TV.

O processo está parado na Anatel porque o próprio Zerbone pediu vistas. Para as teles, a conta não sai por menos de R$ 2 bilhões. Para o governo, seria um modo de elevar em ao menos 10% o índice de recepção de TV digital no país.

Caso a Anatel leve essa ideia adiante dessa forma (com obrigações), as teles já decidiram que as cenas dos próximos capítulos serão gravadas na Justiça.


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