Folha de S. Paulo


Turistas estrangeiros consideram Brasil caro, diz diretor do TripAdvisor

Apesar do grande interesse em conhecer o Brasil, turistas estrangeiros evitam viajar ao país por considerá-lo um destino caro, afirma Brian Payea, diretor de Relações com a Indústria do TripAdvisor.

Segundo uma pesquisa da consultoria Ipsos, feita a pedido do TripAdvisor em março deste ano, 20% da população global sonha em conhecer o Brasil (o país ficou em 15º na lista de destinos desejados). Para Payea, a desvalorização do real frente ao dólar é uma oportunidade para atrair mais turistas estrangeiros durante a crise.

"As pessoas não sabem que podem vir para cá por um ótimo preço agora e que os voos estão disponíveis. É preciso fazer essa informação chegar até elas, com campanhas de marketing e de relações públicas. O Brasil tem uma marca ótima. As pessoas sempre associam o país a um lugar divertido", disse Payea à Folha, após evento para executivos do setor em São Paulo.

Diego Padgurschi/Folhapress
SAO PAULO, SP, BRASIL - 16-11-2015: Bryan Payea, executivo da TripAdvisor durante entrevista em hotel de SP. (Diego Padgurschi /Folhapress - (MERCADO) ***EXCLUSIVO***
Brian Payea, do TripAdvisor, durante entrevista em hotel em São Paulo

Payea também afirmou que os brasileiros têm muito interesse em conhecer o próprio país e que seus turistas estão entre os mais conectados do mundo, em uso de celulares.

O TripAdvisor, que se apresenta como "maior site de viagens do mundo", permite ver dicas e avaliações de outros viajantes, além de fazer reservas de passeios, hotéis, restaurantes e passagens aéreas.

A empresa obtém a maior parte da sua receita - de US$ 1,2 bilhão em 2014 - por meio de anúncios e comissões, pagas por parceiros, em reservas realizadas no site.

No Brasil, a plataforma tem 5,3 milhões de visitantes únicos por mês e, entre junho de 2014 e o mesmo mês de 2015, aumentou em 67% seu número de acessos.

Leia a seguir os principais trechos da entrevista.

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Folha - O turista brasileiro é diferente dos viajantes de outros países?

Brian Payea - Os turistas em todos os países têm similaridades. Eles compartilham o desejo de ver e experimentar coisas novas. Mas há diferenças de comportamento. No Brasil, há muitos viajantes domésticos. 80% da atividade dos brasileiros no TripAdvisor é voltada para destinos dentro do próprio país. São números muito próximos dos que observamos nos EUA. Já em alguns países na Europa, as pessoas buscam mais ir para o exterior. Talvez seja em função do tamanho do território do país, porque há muito para se ver dentro.

Outra coisa muito pronunciada nos brasileiros é que eles adotam a tecnologia antes da maioria. As mídias sociais são muito importantes aqui e isso se reflete no viajante conectado. O uso do smartphone no Brasil é bem mais comum do que em outros países. [segundo pesquisa da TripAdvisor, os turistas brasileiros são os terceiros mais conectados do mundo, atrás apenas da China e Tailândia. 59% dos viajantes brasileiros usam o smartphone para reservar e planejar viagens].

O senhor mencionou que os brasileiros querem conhecer o próprio país. Isso tem influência da desvalorização do real e o aumento do dólar?

Não, esses dados foram coletados do ano passado, quando a moeda estava em um patamar muito diferente do atual, e mesmo assim esse interesse era muito alto.

Quais conselhos o senhor daria para o setor de turismo no Brasil? Como atrair mais clientes nessa época de crise?

Para 20% da população global, o Brasil é um destino dos sonhos. Mas, entre o desejo e realmente fazer a viagem, há uma diferença. E o principal motivo para não ir é financeiro, as pessoas pensam que é muito caro ou muito longe.

Quando eu estive aqui um ano atrás, a média da diária de hotel em dólares era bem mais alta do que agora. As pessoas não sabem que podem vir para cá por um ótimo preço e que os voos estão disponíveis. É preciso fazer essa informação chegar até elas, com campanhas de marketing e de relações públicas. O Brasil tem uma marca ótima. As pessoas sempre associam o país a um lugar divertido. Os preços vão flutuar e voltar a subir, mas é uma oportunidade agora [com a desvalorização do real].

O senhor acha que as pessoas têm uma imagem de que o Brasil é um país caro para visitar?

Eu acho que sim. No ano passado, em novembro, quando eu estava procurando por hotéis aqui, quase nenhum estava dentro das nossas políticas de viagem [teto estabelecido pela TripAdvisor para gastos de seus executivos em viagens a trabalho]. Era uma equipe grande e pensamos: o que vamos fazer? O nosso escritório local teve que negociar com hotéis para chegar a um desconto. Mesmo assim, as diárias ficaram acima do nosso limite.

Dentro dessa discussão dos preços, o Brasil tem poucos hostels, que são opções mais baratas de hospedagem. E os poucos disponíveis costumam ser ocupados por estrangeiros. Os brasileiros têm uma resistência a esse modelo?

Algumas impressões sobre os hostels são ultrapassadas, mas outras são verdadeiras. É uma hospedagem de baixo custo, e isso significa algumas restrições: você está disposto a partilhar um quarto e um banheiro? Há um perfil de turista para cada hospedagem. Nos EUA também há uma resistência a isso. Mas está mudando muito. Globalmente, tem se debatido uma oferta melhor de hostel. E a qualidade tem aumentado muito. Se a sua experiência é boa e o preço é correto, os consumidores vão usar.

Há uma diferença cultural em relação à Europa, que tem muitos hostels?

Essa é uma forma tradicional de viajar na Europa, que tem sido popular por muito tempo lá. São muitos estudantes aventureiros que buscam hospedagem baratas e não se importam tanto com conforto.

O senhor mencionou que as pessoas no Brasil estão muito conectadas. Os brasileiros são mais ativos nos comentários no TripAdvisor?

Os usuários brasileiros são os mais ativos da América Latina. Mas do lado dos negócios, eles não estão tão engajados como em outros países. As pessoas esperam que as propriedades respondam às avaliações, especialmente as negativas. As que não têm esse engajamento estão perdendo uma oportunidade de melhorar e ter mais tráfego. Esse marketing, para pessoas que já estão considerando aquele destino, pode realmente fazer a diferença. Precisa responder não somente com um 'obrigado e volte sempre', mas com algo que agregue valor.

Mas se isso é tão importante para os brasileiros, por que as propriedades daqui não se engajam?

Parte disso é nossa culpa, não comunicamos isso o suficiente e de forma efetiva. Muita gente não sabe que esses recursos estão disponíveis.

As pessoas que viajam sozinhas tendem a buscar mais informações do que os que viajam em grupo?

Isso é muito consistente em todos os tipos de turista. As famílias, com certeza, buscam todas as informações possíveis. Porque o potencial para as coisas não saírem como planejado e você ter uma situação desafiadora é maior. Quando eu viajo sozinho, se algo não sai exatamente como planejado, eu tenho mais flexibilidade. Mas se há três gerações viajando juntas, com crianças e avós, e algo não dá certo, é muito mais fácil estragar o passeio.

Quais são as principais reclamações dos turistas brasileiros ou dos turistas em geral?

Uma reclamação universal é wi-fi. Propriedades que cobram muito pela internet ou que não têm boa velocidade de conexão ficam com avaliações ruins. As pessoas estão começando a esperar esse serviço de forma gratuita e com qualidade.

Sobre os comentários, como o TripAdvisor lida com avaliações falsas?

É a nossa prioridade, porque nós reconhecemos que a confiança dos viajantes e dos negócios são a base do nosso site. Mas há muitos recursos contra avaliações falsas. Nós temos uma equipe de centenas de especialistas que se dedicam a garantir a qualidade do conteúdo, além de fazer investigações. São pessoas que foram da área de justiça criminal ou de fraude em bancos e sabem quais os recursos estão disponíveis para combater essas avaliações falsas. Também há recursos automáticos, que analisam padrões e identificam suspeitas.

Por fim, a comunidade nos ajuda. Um viajante nos conta, por exemplo, que esteve em um hotel e as avaliações não faziam sentido. Hoje mesmo nós enviamos cartas para negócios de todo o mundo pedindo ajuda para identificar empresas que, por uma taxa, fazem avaliações falsas. Uma propriedade que se relaciona com essas empresas está violando os nossos termos de uso. Nós pedimos que as propriedades nos avisem, caso sejam contatadas por empresas assim.

E há uma forma de excluir as propriedades que pagam por avaliações falsas?

Nós não excluímos as propriedades, porque nós queremos que elas estejam lá, caso o viajante seja aconselhado a ficar no local. O turista quer saber o que nós sabemos: que aquela propriedade violou as nossas diretrizes. Nós trabalharemos com a propriedade para tentar entender o que ocorreu e, no pior dos casos, damos uma punição severa em termos de visibilidade e um selo vermelho, avisando que há motivos para suspeitar das suas avaliações.

E os membros, são excluídos?

Nós temos procedimentos para lidar com membros que têm um comportamento ruim. Mas o mais importante não é se uma avaliação é correta ou não, mas se ela é adequada para a sua decisão. Por exemplo, uma pessoa pode achar ruim um hotel com crianças correndo por todos os lados, e outra pode achar isso perfeito. Então não é uma questão de nota alta ou baixa, mas de dar a melhor informação para o viajante. Por isso, nós estamos desenvolvendo muito a personalização do site, para ajudar as pessoas a achar a informação que eles querem. Pode ser, por exemplo, que eu queira ver comentários só de viajantes em família e isso vai ser possível.

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RAIO-X

TRIPADVISOR

Setor Turismo
Receita US$ 1,2 bilhão (2014)
Sede Boston, EUA
Número de funcionários 3.000
Usuários cadastrados 84 milhões
Visitantes únicos por mês 350 milhões (5,3 milhões no Brasil)
Comentários e avaliações 250 milhões


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