Folha de S. Paulo


Fenômeno El Niño afeta produção de alimentos no Brasil

A produção de alimentos básicos no Brasil, como o trigo, o arroz e o feijão, está sendo afetada pelo El Niño, fenômeno climático que veio com força total neste ano e deve ser o mais forte desde 1997.

No Brasil, a principal característica do El Niño é potencializar as chuvas no Sul e a seca no Nordeste, segundo o agrometeorologista Marco Antonio dos Santos, da Somar Meteorologia. De quebra, as precipitações no Centro-Oeste e no Sudeste ficam mais irregulares do que o habitual.

De fato, as chuvas no Sul foram muito intensas e frequentes durante a colheita do trigo, que gosta do clima seco, levando a uma quebra na safra. A produção brasileira, que tinha potencial para atingir 7,3 milhões de toneladas, deve ficar em 5,7 milhões, uma perda de 22%, segundo a consultoria Safras & Mercado.

"Também haverá uma piora na qualidade do trigo, mas ainda não temos certeza da dimensão", diz Élcio Bento, analista da consultoria. A estimativa preliminar é de que, do total colhido, pelo menos 1 milhão de toneladas será de baixa qualidade e inadequada para o consumo humano.

Para abastecer o mercado interno, o Brasil precisará aumentar as importações do cereal em 12% na safra 2015/16, para 6,6 milhões de toneladas, segundo Bento.

Com o dólar valorizado, a tendência é de alta para os preços do trigo no país e de seus derivados, o que deve afetar o bolso do consumidor.

O balanço do El Niño

ARROZ E FEIJÃO

Outros alimentos presentes na dieta básica do brasileiro também têm a produção afetada pelo El Niño.

As chuvas no Rio Grande do Sul, maior produtor de arroz, atrasam o plantio, o que deve reduzir a produção. Para o Irga (Instituto Rio-Grandense do Arroz), haverá uma redução de pelo menos 10% na produtividade das lavouras gaúchas. Na semana passada, o plantio chegou a 62% na área, ante 85% no mesmo período de 2014.

"Em anos bons, nessa época já tínhamos 90% da área cultivada", afirma Vlamir Brandalizze, consultor especializado no setor.

Em razão dos problemas na safra gaúcha, a produção nacional deve ser inferior a 11 milhões de toneladas, enquanto o consumo ultrapassará 12 milhões. "O abastecimento será bem apertado em 2016. O Brasil terá de importar e os preços vão subir", diz.

Cenário semelhante é traçado para o feijão. A primeira safra, que tem o Paraná como o maior produtor, está em desenvolvimento e também sofre com o excesso de umidade. No Nordeste, onde também há lavouras em desenvolvimento, a situação é preocupante porque não chove.

Segundo Brandalizze, de 10% a 15% do potencial de produção no país já está comprometido. "Isso é um sinal de que o mercado do feijão em 2016 terá demanda maior do que a oferta e de que as cotações vão subir", afirma.

No caso do feijão, o impacto dos problemas atuais ainda pode ser compensado pelas duas safras seguintes –o Brasil tem três safras por ano.

Por causa do clima seco no Centro-Oeste, o plantio da soja está atrasado, o que pode limitar o plantio da safrinha de milho. Se o produtor perder a época adequada para o plantio do milho na segunda safra, poderá optar pelo feijão, que precisa de menos tempo para se desenvolver.

Além do clima, o agricultor terá outros estímulos para escolher pelo feijão. Na crise, cresce o consumo de alimentos básicos, que, mesmo em alta, são mais baratos do que as carnes, por exemplo.


Endereço da página:

Links no texto: