Folha de S. Paulo


Escândalo de manipulação da taxa Libor tem primeiro condenado

Keith Bedford/Reuters
Unidade do Citibank, parte do Citigroup, em Nova York
Unidade do Citibank, parte do Citigroup, em Nova York

Tom Hayes, a primeira pessoa a ser julgada por manipular taxas de referência para os juros, foi condenado por oito acusações de conluio com outros corretores e operadores a fim de manipular a taxa Libor, uma decisão que pode estimular promotores públicos a apresentar acusações contra outros de seus supostos cúmplices na conspiração.

O júri de 12 pessoas proferiu na segunda-feira seu veredicto sobre Hayes, 35, antigo operador de derivativos do iene no UBS e Citigroup, depois de um julgamento de nove semanas em Londres.

O caso —que girava em torno de determinar se as intenções de Hayes ao manipular a taxa eram desonestas— representa uma grande vitória para o Serviço de Fraudes Sérias do Reino Unido, que tem diversas investigações relacionadas à Libor em preparo.

Já há dois outros julgamentos de acusados pelo mesmo crime marcados para o ano que vem, e a agência também está investigando a manipulação de taxas de câmbio.

Os promotores afirmaram que Hayers agiu como líder de quadrilha na manipulação da taxa Libor para o iene, ao convidar os avaliadores e operadores do UBS e de diversos outros bancos que eram membros da comissão que determina a taxa diária, e corretores externos, a movimentar a taxa para cima ou para baixo, a depender do que mais beneficiasse suas posições de mercado.

Também surgiu a imputação de que ele teria encorajado os corretores a ajudá-lo a influenciar outros bancos na sua manipulação de taxas ao pedir "favores" a colegas, ou ao alterar seus e-mails preparatórios diários, que continham sugestões sobre a cotação que deveria ser estipulada para a Libor em cada dado dia.

Hayes recompensou os corretores ao lhes pagar comissões adicionais por meio de transações simultâneas de compra e venda dos mesmos títulos financeiros ("wash trades"), um sistema que segundo os promotores equivale a pagar suborno.

Durante as duas semanas de apresentação de provas, parte das nove semanas de julgamento em Londres, Hayes se retratou como um operador desajeitado, obcecado por números, alvo de zombaria dos colegas por ser "diferente" —e que só se importava com fazer um bom trabalho para o UBS.

"Eu queria fazer o trabalho da maneira mais perfeita possível", ele testemunhou. "Não importa se minha função fosse lavar as frigideiras ou desossar frangos, esses trabalhos me eram atribuídos porque eu os fazia o melhor possível."

Hayes se referiu aos seus apelos a corretores e operadores por ajuda na manipulação da taxa como um "exercício de probabilidades", que reforçaria suas chances de ter a taxa manipulada.

A condenação se segue a 30 meses de investigação criminal pelo Serviço de Fraudes Sérias, que o deteve em dezembro de 2012, momentos antes que o Departamento da Justiça dos Estados Unidos apresentasse um indiciamento confidencial contra ele como parte de sua investigação criminal paralela.

Nos meses posteriores à sua prisão, Hayes depôs durante 82 horas ao Serviço de Fraudes Sérias, e admitiu tentar influenciar as decisões dos bancos, tanto as de seus empregadores quanto as de outras instituições, a fim de reforçar sua carteira de operações.

Mas Hayes testemunhou que ele só cooperou com o Serviço de Fraudes Sérias porque estava morto de medo de ser extraditado aos Estados Unidos e queria ser julgado em seu país de origem, onde as normas de sentenciamento são notavelmente menos severas.

Quando o processo o irritou, ele reverteu sua decisão de admitir culpa, afirmou o réu. Hayes jamais acreditou que estivesse sendo desonesto, a despeito de ter admitido desonestidade ao Serviço de Fraudes Sérias, ele disse ao júri.

O juiz Cooke, que presidiu o caso, claramente não simpatizou com Hayes durante o julgamento. Diante do tribunal lotado, antes de o julgamento começar, ele definiu Hayes como "por natureza um apostador".

O sentimento era recíproco. Hayes tentou convencer o juiz a descartar o processo antes do início do julgamento, por supostamente ter demonstrado parcialidade excessiva. Ele argumentou que Cooke —juiz da Alta Corte com 14 anos de experiência no circuito— havia demonstrado que não seria capaz de julgar imparcialmente o caso de Hayes por ter a "mente fechada" com relação aos argumentos da defesa.

"Houve desonestidade", declarou o juiz Cooke durante uma audiência aberta. "É um caso claríssimo". Outro comentário ao qual Hayes objetou foi uma declaração do juiz ao advogado que o representava inicialmente, no sentido de que não era tarde demais "para o seu cliente se admitir culpado".

"O juiz absolutamente me odeia", escreveu Hayes em uma nota à sua equipe de defesa naquele momento, de acordo com a decisão do juiz Cooke ao negar o pedido do operador de cancelar o julgamento.

"Um observador justo e plenamente informado se indignaria, em minha opinião, com as despesas incorridas e a serem incorridas pelo público quanto a esse assunto, se estivesse ciente de que o réu havia aparentemente admitido plenamente sua participação nos delitos", o juiz escreveu em sua decisão.

Hayes foi acusado de conspirar com 25 outros operadores e corretores, sete dos quais funcionários do UBS. Entre eles estão Mike Pieri, Simon Oddie, Mirhat Alykulov, Roger Darin, Joachim Ruh, Rolf Keiser e Yugo Matsumoto. Só Darin foi indiciado na investigação, pelas autoridades dos Estados Unidos. Darin ainda não foi formalmente acusado nos Estados Unidos.

Tradução de PAULO MIGLIACCI


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