Folha de S. Paulo


Dólar sobe pelo 3º dia e vai a R$ 3,34, maior valor em mais de 12 anos

Mark Wilson/AFP
Dólar sobe ao maior valor desde 2003 em meio à crise política brasileira e incerteza econômica
Dólar sobe ao maior valor desde 2003 em meio à crise política brasileira e incerteza econômica

Incertezas em relação ao rumo da economia brasileira e a cautela com a crise política no país guiaram o dólar à terceira alta consecutiva em relação ao real nesta sexta-feira (24). A moeda americana chegou a bater R$ 3,357 durante o dia e atingiu o maior valor em mais de 12 anos.

O dólar à vista, referência no mercado financeiro, teve valorização de 1,60%, fechando em R$ 3,341 na venda. É a maior cotação nominal desde 28 de março de 2003, quando estava em R$ 3,373 –em valor real (descontadas as inflações do Brasil e dos EUA no período) seria em torno de R$ 5,285. Na semana, houve alta de 4,82%.

Já o dólar comercial, utilizado no comércio exterior, avançou 1,57% nesta sexta-feira, para R$ 3,348 na venda –valor nominal mais alto desde 31 de março de 2003, quando estava em R$ 3,355. Na semana, houve alta de 4,82%.

A aversão ao risco também continuou pesando sobre a Bolsa brasileira: o principal índice de ações nacional, o Ibovespa, encerrou a sessão em baixa de 1,13%, para 49.245 pontos –renovando a menor pontuação desde 16 de março, quando estava em 48.848 pontos. Foi a sexta queda consecutiva do índice, maior sequência de perdas desde setembro de 2014. O volume financeiro foi de R$ 6,764 bilhões.

Com este desempenho, a desvalorização acumulada pelo Ibovespa na semana chegou a 5,91%. Foi a segunda perda semanal consecutiva e a mais acentuada desde o período entre 8 e 12 de dezembro de 2014, quanto cedeu 7,68%.

Segundo operadores, o mercado continuou digerindo a decisão de corte da meta fiscal do governo brasileiro, anunciada na noite de quarta-feira (22) pelos ministros Joaquim Levy (Fazenda) e Nelson Barbosa (Planejamento).

Agora, o governo espera fazer superavit primário de R$ 8,7 bilhões (0,15% do PIB) em 2015. Antes, o alvo era de R$ 66,3 bilhões (1,1% do PIB). Também foi colocado um dispositivo que permitiria ao país incorrer em deficit de até R$ 17,7 bilhões no ano, se as receitas extraordinárias decepcionarem.

Com a perspectiva de que a dívida pública aumente, o Brasil corre risco de perder o chamado grau de investimento –selo de bom pagador, obtido em 2008, quando o país entrou na rota dos grandes investidores. A leitura é que o país terá de conviver com juros elevados por um período mais longo, apesar do impacto da recessão no controle de preços.

"É um medo que a gente não via há muito tempo, e compromete o desenvolvimento econômico que atingimos para chegar a esta classificação", disse Fabiano Rufato, gerente de câmbio da Western Union no Brasil. "Se a perda do grau de investimento se concretizar, mudará completamente a visão dos estrangeiros em relação ao Brasil e muito dinheiro deixará de ser investido por aqui."

"Os investidores sempre antecipam os fatos para minimizar o risco de perder dinheiro com 'surpresas' desagradáveis lá na frente. Muitos movimentos políticos e econômicos são percebidos com antecedência e colocados nos preços dos ativos. É o que está acontecendo, com o mercado precificando a possível perda do grau de investimento do país", disse Fernando Bergallo, diretor de câmbio da TOV Corretora.

O diretor de câmbio ressaltou que a crise econômica que o Brasil vive fragiliza o governo e deteriora ainda mais o quadro político no país. "O Executivo não consegue conversar com o Legislativo, o que atrasa as aprovações de medidas do ajuste fiscal e ameaça ainda mais a nota de risco brasileira. Neste cenário, o mercado se sente perdido. É como descer a serra em um dia nebuloso, não dá para enxergar nada."

Bergallo não descarta novas intervenções do Banco Central no câmbio para tentar conter a volatilidade da moeda americana. "A autoridade não deve atuar no mercado à vista, mas pode intensificar suas intervenções com leilões de swap [que têm efeito de venda de dólares no mercado futuro]. Não há como conter a alta do dólar, mas, com isso, o BC pode amenizá-la", completou.

Nesta sessão, o BC deu continuidade à rolagem dos swaps cambiais que vencem em agosto –operação para estender o prazo dos contratos. A oferta de 6.000 papéis foi totalmente vendida por US$ 293,3 milhões. Nos primeiros leilões deste mês, haviam sido ofertados até 7.100 swaps.

Mantendo a oferta de até 6.000 contratos por dia até o penúltimo dia útil do mês, o BC rolará o equivalente a US$ 6,396 bilhões ao todo, ou cerca de 60% do lote total. Se continuasse com as ofertas anteriores, a rolagem seria de 70%, como a do mês anterior.

No mercado de juros futuros, apesar de terem disparado na última quinta-feira (23), as taxas continuaram subindo na BM&F nesta sexta. O contrato de DI com vencimento em janeiro de 2021 fechou em 13% ao ano, no maior nível em quatro meses. Já o papel mais negociado, com vencimento em janeiro de 2016, encerrou o dia com taxa de 14,29% ao ano, 1,35% acima do fechamento anterior.

AÇÕES

Das 66 ações do Ibovespa, apenas 14 tiveram valorização nesta sexta-feira. Os papéis de exportadoras do setor de papel e celulose estiveram entre os ganhos, assim como no último pregão, beneficiados pela alta do dólar. Fibria ganhou 1,26%, para R$ 44,08, enquanto Suzano avançou 1,23%, para R$ 15,69.

O setor de educação liderou a ponta positiva do Ibovespa, devolvendo parte das perdas recentes. A Estácio subiu 3,64%, para R$ 17,10, e a Kroton registrou valorização de 1,71%, para R$ 10,09.

As ações preferenciais da Petrobras, mais negociadas e sem direito a voto, perderam 1,28%, para R$ 10,04, ajudando a derrubar o Ibovespa. Investidores estiveram de olho na reunião do conselho de administração da estatal nesta sexta-feira. A expectativa é que tenha sido debatida a reestruturação da Transportadora Associada de Gás (TAG), que controla a malha brasileira de gasodutos da estatal.

A TAG está na lista de ativos que serão negociados pela estatal. Segundo a Folha antecipou, uma das propostas é vender 80% da subsidiária, com transferência do controle.

Colaborou TONI SCIARRETTA, de São Paulo


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