Folha de S. Paulo


Conheça sete mulheres que estudam economia em universidade de ponta

Economistas mulheres ainda são uma pequena minoria no meio acadêmico de ponta do Brasil, em que a publicação de pesquisas nos periódicos de maior prestígio do mundo é condição para progredir na carreira.

Cristine Xavier Pinto, 37, é, por exemplo, a única mulher entre 21 acadêmicos que integram o primeiro time da Escola de Economia da FGV-SP.

Cecília Machado, 34, ocupa o mesmo posto solitário entre os 23 professores da EPGE, na FGV do Rio.

Há departamentos de escolas top de economia, como a PUC-Rio, que não têm nenhuma mulher em seu quadro principal de professores.

Segundo jovens economistas brasileiras, o desequilíbrio também existe em outros países. Mas em alguns, como os EUA, há mais ações para reduzir esse hiato.

A American Economic Association (AEA), organização dedicada ao fomento da discussão e da pesquisa econômica, tem um comitê dedicado a acompanhar a participação feminina na carreira. Anualmente, publica a evolução da parcela de mulheres entre estudantes e professores de economia.

Segundo o boletim mais recente, em 2014, as mulheres eram 33% dos novos estudantes de doutorado, mas só 12% dos acadêmicos titulares com doutorado em economia.

Embora nos EUA esses percentuais estejam aumentando –em 1997, somente 6,5% dos professores titulares eram do sexo feminino– a tendência de afunilamento da presença feminina ao longo da carreira permanece.

"As mulheres vão desaparecendo da carreira acadêmica em economia conforme vamos subindo degraus", diz Fernanda Estevan, da USP.

O departamento de economia da USP tem proporção feminina maior que outras escolas com foco em pesquisa acadêmica no país, mas ainda assim a fatia é pequena.

Estevan conta, por exemplo, que entre os entrevistadores de sua banca para ingressar como professora não havia nenhuma mulher.

MOTIVOS

O ritmo intenso da profissão, que dificulta pausas para ter filhos, é visto como um dos motivos da baixa representação feminina no meio.

Até o fim do doutorado, a carreira costuma demandar dedicação exclusiva.

Depois vem uma maratona de três a quatro anos para emplacar artigos nos periódicos mais prestigiosos, como "Econometrica", "American Economic Review" e "Journal of Political Economy".

As poucas jovens brasileiras que têm se destacado na academia fazem parte de uma geração que ampliou o foco de pesquisa da área econômica para temas como educação, saúde e questões de gênero no mercado de trabalho.

Nesta página, conheça um pouco da carreira e das pesquisas de sete dessas economistas, que atuam no Brasil e no exterior.

Danilo Verpa/Folhapress
Fernanda Estevan, professora doutora do departamento de economia da FEA-USP
Fernanda Estevan, professora doutora do departamento de economia da FEA-USP
Editoria de Arte/Folhapress

FERNANDA ESTEVAN

Fernanda Estevan, 37, é uma entre apenas nove mulheres ligadas a instituições de pesquisa brasileiras em um ranking de 149 economistas que se destacam pelo número de publicações e citações feitas por outros acadêmicos.

Entre a geração de pesquisadoras mais jovens, é a melhor colocada na mesma lista -em que ocupa a 85ª posição- compilada pela IDEAS, base de dados bibliográfica online da área.

O destaque foi alavancado por dois artigos publicados em periódicos top de pesquisa econômica: "Journal of Economic Theory" e "Journal of Development Economics".

Ambos têm como tema a educação e o desenvolvimento econômico, principal área de interesse de Estevan, que chegou a lecionar na Universidade de Ottawa, no Canadá, antes de voltar para o Brasil em 2014, após 14 anos fora.

"Trabalhar aqui traz a grande vantagem de estar mais próxima das questões que pesquiso que estão relacionadas ao Brasil", diz.

Seu foco mais recente de pesquisa tem sido as políticas de ações afirmativas voltadas para o ensino superior. Recentemente, identificou que, embora os bônus tenham aumentado a probabilidade de alunos de escolas públicas entrarem na Unicamp, não afetaram significativamente a procura desses estudantes pela universidade.

Fabio Teixeira /Folhapress
A Economista Cecilia Machado na FGV (Fundação Gertúlio Vargas), no Rio de Janeiro
A Economista Cecilia Machado na FGV (Fundação Getulio Vargas), no Rio de Janeiro
Editoria de Arte/Folhapress

CECÍLIA MACHADO

Tudo o que tem impacto sobre o mercado de trabalho interessa a economista Cecília Machado, 34.

Depois de concluir sua graduação em economia na UFRJ, escola de linha heterodoxa em que o estudo da disciplina é mais focado na analise histórica do que na matemática, cursou o mestrado na PUC-Rio, de orientação oposta.

Nessa etapa, consolidou o interesse por mercado de trabalho ao interagir com expoentes dessa área, como José Marcio Camargo e Ricardo Paes de Barros. Descobriu ainda o gosto pela análise de dados.

Depois do doutorado nos EUA, Machado retornou para o Brasil e tem sido considerada um dos nomes mais promissores de sua geração.

Atualmente, tem pesquisado temas relacionados à educação superior, mas sempre mantendo o elo com mercado de trabalho.

Uma de suas investigações atuais é sobre as razões de o prêmio salarial - quanto um trabalhador ganha a mais por seu nível de escolaridade - no Brasil ainda ser tão mais alto do que nos EUA.

Com dois filhos pequenos, a economista acha que a organização é o segredo para se equilibrar entre as muitas horas de dedicação exigidas pela profissão e a família.

"Tento ser o mais produtiva possível".

LAURA CARVALHO

Zanone Fraissat/Folhapress
Laura Carvalho, economista e professora da Universidade de São Paulo
Laura Carvalho, economista e professora da Universidade de São Paulo
Editoria de Arte/Folhapress

A economista Laura Carvalho, 31, é minoria em diversos aspectos.

É parte de um pequeno grupo de jovens mulheres brasileiras que tem se destacado na profissão. Não é de linha ortodoxa, corrente dominante no mundo acadêmico. Mas, mesmo dentro da heterodoxia, se diferencia de seus pares por recorrer a ferramentas de estatística em sua analise.

"Grande parte da heterodoxia se recusa a usar a matemática, modelos", diz Carvalho, que, recentemente, se tornou colunista da Folha.

Na volta ao Brasil em 2012, apos o doutorado, foi trabalhar na FGV, mas, neste ano, migrou para a USP, cortando seu salário pela metade.

A decisão foi motivada pelo fato de o ranking de produção acadêmica que baliza as avaliações de desempenho dos professores da FGV não valorizar os periódicos de linha heterodoxa em que ela tem se destacado.

Na USP, diz Carvalho, há um equilíbrio maior entre as duas correntes.

A principal linha de pesquisa da economista atualmente é a relação entre distribuição de renda e crescimento econômico.

Desde 2012, ela também se dedica à produção de artigos como parte de uma bolsa que ganhou do Institutute for New Economic Thinking, centro criado após a eclosão da última crise econômica global e financiado por George Soros que incentiva pesquisadores dedicados a desenvolver novas metodologias de pesquisa.

Fabio Braga/Folhapress
A professora de Econometria, na Escola de Economia da Fundacao Getulio Vargas, Cristine Xavier Pinto
A professora de Econometria, na Escola de Economia da Fundação Getulio Vargas, Cristine Xavier Pinto
Editoria de Arte/Folhapress

CRISTINE XAVIER PINTO

Ao longo da graduação e do mestrado em economia, a estatística sempre inquietou a economista Cristine Campos de Xavier Pinto, 37.

No doutorado, resolveu mergulhar de cabeça no desafio: optou por estudar econometria teórica, na Universidade da Califórnia. Para os leigos, explica que se especializou em métodos para determinar e estimar efeitos em economia.

Sua área pode ser totalmente abstrata, mas ela optou por aplicar o que aprendeu na análise de problemas reais principalmente no campo da educação.

Artigos que conseguiram destaque a colocaram em um pequeno grupo de nove mulheres que aparecem em um ranking de economistas que considera quesitos como número de publicações em periódicos top e citações feitas por pares, compilado pelo site IDEAS.

Na versão mais recente da lista, ela ocupa a 113ª posição, entre 149 economistas.

Além de pesquisar temas mais tradicionais, como o chamado efeito pares - medida do impacto de características de determinado grupo sobre o resultado individual de um membro do mesmo -, ela também tem se dedicado a temas ainda pouco explorados como as chamadas habilidades não cognitivas.

Junto com dois colegas, a economista fundou um núcleo na FGV para pesquisar as características, além da inteligência, que influenciam o desempenho escolar.

Joel Silva/Folhapress
A economista Renata Narita, da USP. em seu apartamento
A economista Renata Narita, da USP. em seu apartamento
Editoria de Arte/Folhapress

RENATA NARITA

O primeiro capitulo da tese de doutorado da economista Renata Narita, 37, foi um gol de placa, aceito como artigo para publicação na "American Economic Review", periódico considerado um dos três mais importantes da área.

O estudo, feito com base em dados do Brasil, mostrou que um aumento de inspeção no mercado de trabalho não provocou desemprego, mas conduziu a maiores salários e ganhos de bem estar.

O mercado de trabalho é o principal foco de pesquisa acadêmica da economista, que tem passagens pelo governo brasileiro - ficou um ano no Ministério da Fazenda no primeiro mandato de Lula - e pelo Banco Mundial, onde atuou por dois anos após o doutorado.

Na instituição multilateral, Narita fazia avaliação do impacto de programas para melhorar a governança no setor publico.

"Gostei porque aprendi muito, mas eu queria fazer pesquisa por isso optei pela academia", diz ela, que é parte do corpo docente da USP desde 2013.

Recentemente, a economista tem estudado com outra pesquisadora os efeitos da reforma do sistema de saúde do México sobre o mercado de trabalho.

Divulgação
Fernanda Brollo, economista brasileira que leciona, atualmente, na Universidade de Warwick, na Inglaterra.
Fernanda Brollo, economista brasileira que leciona na Universidade de Warwick, na Inglaterra.
Editoria de Arte/Folhapress

FERNANDA BROLLO

Fernanda Brollo, 41, usa os instrumentos da economia para desvendar questões da política.

A economista brasileira que leciona, atualmente, na Universidade de Warwick, na Inglaterra, já investigou, por exemplo, se as transferências do governo federal para os municípios no Brasil têm efeito sobre a corrupção. Concluiu que sim.

Essa pesquisa rendeu um artigo para a prestigiosa "American Economic Review".

Recentemente, Brollo tem se dedicado a estudar impactos do Bolsa Família, principal programa de transferência de renda do governo federal.

Por enquanto, a economista não pensa em voltar para o Brasil.

"Acho que a academia no Brasil tem se desenvolvido bem, mas a carga horária de aulas demandada é alta, reduz muito o tempo para pesquisa", afirma.

Segundo ela, a pesquisa sobre países em desenvolvimento é valorizada nas grandes universidades de fora porque a reduzida disponibilidade de dados nessas nações faz com que haja pouco estudos sobre elas.

"O Brasil é um bom estudo de caso por ter, em média, mais dados disponíveis", diz.

Sobre o desequilíbrio entre homens e mulheres na academia, Brollo afirma que ele também existe em países desenvolvidos, embora seja mais acentuado no Brasil.

Para tentar manter o ritmo pesado de viagens para congressos e apresentações, ela conta que já viajou para oito países com a filha de apenas 13 meses, normalmente com o marido, que também é acadêmico.

Arquivo Pessoal
A economista Pricila Maziero, 36, doutorada pela Universidade de Minnesota e pesquisadora da Wharton School (EUA)
A economista Pricila Maziero, 36, doutorada pela Universidade de Minnesota e pesquisadora da Wharton School (EUA)
Editoria de Arte/Folhapress

PRICILA MAZIERO

Logo após terminar o doutorado em 2009, a economista Pricila Maziero, 36, foi convidada para lecionar na Universidade da Pensilvânia, uma das dez mais importantes dos Estados Unidos. É uma das quatro mulheres que dão aula na Wharton School, escola de business da instituição.

Desde a época da graduação e do mestrado no Brasil, tem grande interesse por questões ligadas à macroeconomia.

A proximidade com o tema ficou ainda maior depois de trabalhar no departamento econômico do Itaú e se consolidou durante o doutorado.

Maziero atua em uma área que é considerada uma renovação do estudo tradicional de finanças públicas. Normalmente, busca resposta para questões teóricas.

Atualmente, investiga como deveria ser, teoricamente, o sistema tributário em países governados por líderes não altruístas, que perseguem seus próprios interesses.

A economista já teve artigos publicados no "Journal of Political Economy" e no "Journal of Economic Theory", dois dos mais respeitados da área.

Maziero conta que trabalhava 80 horas por semana antes do nascimento dos dois filhos pequenos.

Na Universidade da Pensilvânia, Maziero participou ativamente de iniciativas para pedir incentivos a pesquisadoras que têm filhos, como ajuda de custo para levar crianças e um acompanhante em viagens.

Apesar disso, reduziu, no curto prazo, as saídas para participar de conferências, consideradas importantes para quem quer se fazer conhecido no meio.

"Tive de reduzir o ritmo, não quero abdicar de participar da educação dos meus filhos", diz.


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