Folha de S. Paulo


Países emergentes sofrerão menos por causa do Fed e mais por erros próprios

Narong Sangnak/Efe
Notas de dólar
Notas de dólar

A perspectiva de que o Federal Reserve (Fed, o banco central dos Estados Unidos) comece a elevar seus juros ainda neste ano eleva o medo de uma retomada da volatilidade nos mercados de câmbio, títulos e ações das economias emergentes.

Mas, ainda que se espere turbulência, o risco de crises é mais limitado. Enquanto o choque de 2013 apanhou os mercados de surpresa, a intenção do Fed vem sendo expressa há muitos meses.

Além disso, a alta deve vir mais tarde e mais devagar do que em ciclos anteriores, respondendo gradualmente aos sinais de crescimento econômico norte-americano –que, por sua vez, beneficiará os mercados emergentes que exportam bens e serviços.

Em comparação com 2013, os bancos centrais dos emergentes já elevaram suas taxas de juros. Políticas fiscais e de crédito passaram por apertos, reduzindo grandes deficits fiscais e em conta corrente.

Acima de tudo, a maioria dos emergentes opera com regimes flexíveis de câmbio, o que os deixa menos vulneráveis ao destrutivo colapso de âncoras cambiais, e tem amplas reservas para protegê-los contra corridas aos bancos, aos títulos de seus governos ou aos mercados de câmbio.

A proporção menor de dívidas em dólares é menor, e os sistemas financeiros desses países estão em geral com mais capital e liquidez.

Com algumas poucas exceções, a maioria não enfrenta problemas de solvência; ainda que a dívida pública e privada venha crescendo rapidamente nos últimos anos, ela o fez partindo de patamares relativamente baixos.

De fato, os sérios problemas financeiros de muitos desses emergentes –especialmente produtores de petróleo e commodities expostos à desaceleração na China– não estão relacionados ao que o Fed venha a fazer.

OUTRAS CAUSAS

O Brasil terá recessão e alta inflação este ano, mas os problemas brasileiros em geral são autoinfligidos –resultado de políticas monetária, fiscal e de crédito frouxas no primeiro mandato da presidente Dilma, todas as quais terão agora de ser apertadas.

A Rússia tampouco sofre o impacto da queda dos preços do petróleo e de sanções internacionais impostas depois de sua invasão à Ucrânia.

A Venezuela estava operando com fortes deficit fiscais e inflação alta quando os preços do petróleo estavam acima dos US$ 100 por barril; aos preços atuais, poderá ter de dar o calote em sua dívida pública, a menos que a China decida resgatá-la.

De forma semelhante, alguns dos desgastes econômicos e financeiros enfrentados por África do Sul, Argentina e Turquia são resultado de más políticas econômicas e de incertezas políticas internas, e não das ações do Fed.

IMPACTO DA CHINA

Em resumo, o Fed causará sérios problemas aos países com grandes necessidades de captação interna e externa e fragilidades macroeconômicas e de política econômica.

A desaceleração econômica da China, acoplada ao final do superciclo das commodities, criará forças contrárias adicionais para as economias emergentes, a maioria das quais não implementou as reformas estruturais necessárias a estimular seu potencial de crescimento.

No entanto, repito, esses problemas são autoinfligidos, e muitas economias emergentes têm fundamentos estruturais e macroeconômicos mais fortes, que lhes darão maior poder de resistência quando o Fed começar a elevar os juros.

Quando isso acontecer, algumas delas sofrerão mais do que outras; mas, com algumas exceções sistemicamente pouco importantes, perturbações e crises mais amplas não precisam ocorrer.


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