Folha de S. Paulo


Moda das start-ups é desafiada por fracassos e falta de preparo de jovens

Em três anos, Davi Barboza, 30, criou três start-ups. Duas delas não deram certo e causaram um prejuízo de cerca de R$ 200 mil.

"Eu achava que ia ficar rico em um ano, mas as coisas não são fáceis, não é o glamour que se conta", afirma.

A onda do empreendedorismo, que ganhou força no Brasil nos últimos anos com o boom de start-ups, começa a viver sua ressaca. Para quem atua na área, criou-se uma visão idealizada, que precisa ser desmistificada.

"Nos anos 1990, a galera descolada tinha uma banda. Hoje em dia eles têm uma start-up. É preciso ver que isso não é brincar de ter uma empresa", diz Alan Leite, da aceleradora Startup Farm.

Dos 162 negócios em que investiu desde 2011, 41% encerraram suas atividades e 21% dos participantes voltaram ao mercado de trabalho.

Danilo Verpa/Folhapress
Rosileide Rodrigues no escritório da start-up Iugu, em São Paulo
Rosileide Rodrigues no escritório da start-up Iugu, em São Paulo

Apesar da taxa de falência alta, seis em cada dez universitários brasileiros querem criar uma empresa, de acordo com pesquisa da Endeavor, organização de apoio ao empreendedorismo.

O interesse reflete uma mudança de perfil da atividade no Brasil. Em 2002, apenas 42,4% das empresas eram criadas mirando uma oportunidade de negócio -o restante era por falta de alternativa. Em 2014, o número subiu para 70,6%, segundo o Sebrae.

No período também surgiram os negócios virtuais, cuja criação é mais fácil e barata do que a de uma empresa tradicional, que requer estrutura física. O empreendedorismo tornou-se, assim, mais acessível.

"Criar aplicativos não é difícil, é como um idioma: você aprende a programar e fala o que quiser. Eu achei muito empoderador quando criei uma linha de código com que uma pessoa poderia interagir na África do Sul", diz Rosileide Rodrigues, 33, criadora da start-up de pagamentos Iugu.

A influência é maior sobre o jovem, que cresceu com a internet e vê no ramo um "atalho" para chegar a grandes remunerações e ser seu próprio chefe, diz Paulo Floriano, presidente da incubadora Neue Labs.

"Outro erro comum é achar que a tecnologia substitui o negócio em si. Se você quer ter uma plataforma de intermediação de compra e venda de imóveis, por exemplo, você precisa entender muito de mercado imobiliário."

DEPURAÇÃO

Apesar das críticas à glamourização da atividade, quem trabalha na área acredita que, mesmo com esses problemas, quanto mais interessados em empreender, maiores as chances de surgirem casos de sucesso.

Para Juliano Seabra, diretor geral da Endeavor, é importante que as pessoas estejam dispostas a empreender. O desafio é fazer as start-ups ganharem escala de negócio.

Um dos caminhos apontados por ele é a capacitação nas universidades, que devem oferecer tanto disciplinas teóricas quanto experiências práticas no tema.

Editoria de Arte/Folhapress

No Insper, além das disciplinas do currículo regular, o Centro de Empreendedorismo e Inovação organiza competições e traz executivos para orientarem estudantes em seus projetos.

Para a professora Cynthia Serva, que coordena o programa, o maior desafio é conseguir fazer o jovem pensar em soluções para problemas mais complexos.

"É preocupante que, apesar do número alto de universitários que querem empreender, poucos sinalizam que estão se preparando para tornar este desejo em algo real ou implementável", afirma.


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