Folha de S. Paulo


Zimbábue vai trocar por US$ 5 até 175 quatrilhões de sua moeda atual

Um dos poucos bancos centrais a fazer com que a Alemanha dos anos 20 pareça um período de prudência monetária e estabilidade está enfim jogando fora a moeda de seu país.

O Banco de Reserva do Zimbábue (RBZ) anunciou que iniciará o processo de "desmonetização" da moeda, que perdeu praticamente todo o valor, em 15 de junho. A medida foi planejada pelo Ministério das Finanças e
Desenvolvimento Econômico no ano passado e o processo deve estar concluído em 30 de setembro.

Kate Holt/Bloomberg via Getty Images
Notas de 50 bilhões de dólares zimbabuenses, moeda que será abandonada pelo país
Notas de 50 bilhões de dólares zimbabuenses, moeda que será abandonada pelo país

Dentro dessa janela, as cédulas poderão ser trocadas por dólares dos Estados Unidos. Depois, perderão o valor, o que não é muito diferente de seu valor agora: o RBZ anunciou que contas "com saldo de zero a 175 quatrilhões de dólares zimbabuenses serão convertidas ao valor fixo de US$ 5".

"Hiperinflação" mal começa a explicar os problemas monetários do Zimbábue, que usa 15 zeros na denominação de sua moeda.

O Serviço Central de Estatísticas do Zimbábue deixou de publicar estimativas sobre aumentos de preços em 2008. Naquele momento, a inflação no país liderado por Robert Mugabe estava subindo em 231 milhões por cento ao ano.

Para comprar produtos, os zimbabuenses dependiam em larga medida de acesso ao dólar dos Estados Unidos e ao rand sul-africano que chegavam ao país na forma de remessas de trabalhadores expatriados.

Em 2009, o Zimbábue adotou o dólar dos Estados Unidos como moeda principal.

No ano passado, o yuan chinês, a rúpia indiana, o iene japonês e o dólar australiano também foram adotados como moedas legais pelo governo zimbabuense. O RBZ declarou ontem que sua decisão de retirar a moeda do país de circulação "estava pendente, e com muito atraso, desde 2009".

Os problemas econômicos do Zimbábue remontam à decisão do presidente Mugabe de implementar um controvertido programa de reforma agrária que levou ao confisco forçado - e ocasionalmente violento - de fazendas que eram propriedade de brancos, em 2000. Isso levou ao colapso do crucial setor agrícola, enquanto abusos dos direitos humanos e opressão contra a oposição levaram o Ocidente a impor sanções contra
o país do sul da África.

A economia descambou para o caos, e com a disparada da hiperinflação as prateleiras dos supermercados do país se esvaziaram, e o banco central começou a imprimir notas de 100 trilhões de dólares zimbabuenses que perdiam o valor praticamente no minuto em que a tinta secava. Enquanto a África subsaariana desfrutou de crescimento médio de mais de 5% entre 2002 e 2012, o Zimbábue registrou contração média anual de 2,6% no mesmo período, de acordo com o Fundo Monetário Internacional (FMI).

O Zimbábue, no passado uma das economias mais industrializadas da África, passou por um período de crescimento depois que o partido Zanu-PF, de Mugabe, e o Movimento pela Mudança Democrática, de oposição, criaram um governo de unidade nacional em 2009, na esteira de uma eleição contestada.

Mas seus problemas econômicos continuaram quando uma combinação de incertezas políticas e econômicas sufocou a capacidade do país para atrair o investimento de que necessita a fim de revitalizar sua infraestrutura decaída e suas indústrias depauperadas.

O FMI projeta crescimento anual de 2,8% em 2015, ante um total estimado em 3,2% em 2014, mas alguns economistas alertam que o país está em risco de cair de novo em recessão.


Tradução de PAULO MIGLIACCI


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