Folha de S. Paulo


'Empresas B' usam negócios para criar impacto socioambiental positivo

Paulo Granato, 35, imaginava que sua carreira seria seguir os passos dos pais, tocando o laboratório de análises clínicas da família, voltado para um "público AA".

Os planos dele mudaram quando cursava medicina. "Eu rodava por diversos hospitais públicos e não me conformava com a frustração dos médicos que não podiam oferecer um atendimento pleno porque não conseguiam fazer exames", diz.

Granato viu no problema uma janela de oportunidade: caso os exames fossem mais baratos, muitos desses pacientes poderiam pagar.

Em 2008, ele fundou a Policlínica Granato, que cobra valores até 70% mais baixos do que é praticado em laboratórios particulares.

O negócio é um dos certificados como "empresa B", selo concedido a quem utiliza a iniciativa privada para gerar benefícios sociais e ambientais -uma espécie de "setor dois e meio".

"No longo prazo a filantropia não adianta, porque uma hora a fonte seca. Se uma empresa visa ao lucro e é sustentável, ela vai perdurar", afirma Granato, que lucrou R$ 4,8 milhões em 2014 e espera R$ 7 milhões em 2015.

Fabio Braga/Folhapress
O entregador Fabrício Santana e o dono da Courrier, André Bicelli
O entregador Fabrício Santana e o dono da Courrier, André Bicelli

O selo nasceu há oito anos nos Estados Unidos e já foi exportado para outros 38 países. No Brasil há pouco mais de um ano, o Sistema B, organização responsável pela certificação, já conta com 41 empresas nacionais, em sua maioria pequenas e médias (a exceção é a Natura).

"Nossa diferença em relação a outras certificações como o ISO ou a de orgânicos é que nossa ideia é avaliar boas empresas, e não bons produtos", diz Greta Salvi, do Sistema B brasileiro.

Os aprovados são obrigados a incluir no estatuto o compromisso com a geração de benefícios sociais e ambientais para toda a comunidade -garantindo que, em um momento de crise, as boas intenções não ficarão relegadas ao discurso.

COMPETITIVIDADE

Para quem aposta na ideia, ser B não é só uma questão de consciência social, mas também de vantagens competitivas. Os empreendedores do ramo destacam a atratividade que o modelo exerce tanto sobre clientes quanto sobre jovens talentos.

André Biselli tinha 21 anos quando saiu do escritório de advocacia em que trabalhava para fundar, em parceria com o amigo de infância Victor Castello Branco, a Courrieros, empresa que faz entregas usando bicicletas e tem entre seus clientes grandes companhias como Net Shoes e Drogaria São Paulo.

"O jovem está cansado da empresa tradicional", afirma Bernardo Bonjean, 37, que trabalhou nove anos em um banco de investimentos. Ele é cofundador da Avante, empresa de serviços financeiros com foco em favelas.

Bonjean viu nessas comunidades uma oportunidade de atender um mercado em crescimento, mas com pouca confiança nos bancos. Em apenas três anos, a empresa já originou mais de R$ 30 milhões em negócios.

Danilo Verpa/Folhapress
Bernardo Bonjean, fundador da Avante, empresa que oferece crédito e orientação financeira para microempreendedores de favelas
Bernardo Bonjean, fundador da Avante, empresa que oferece crédito e orientação financeira para microempreendedores de favelas

"Você não tem que escolher entre mudar o mundo e ganhar dinheiro. É um novo olhar", afirma Cláudio Sassaki, 40, que abandonou uma carreira de sucesso no mercado financeiro para criar a Geekie, empresa que desenvolveu um software de aprendizagem personalizada.

Em 2014, o produto foi utilizado por mais de três milhões de estudantes, sendo 85% da rede pública.

Essas vantagens não significam que as empresas B sejam mais lucrativas.

"O que está comprovado é que o ponto de equilíbrio é mais tardio, porque gera um custo você ter objetivos sociais. Não dá para dizer que são melhores em termos de eficiência, mas sim em propósito", diz Graziella Comini, professora de administração da USP.

COMO SER B
Boas práticas avaliadas para conseguir a certificação:

Governança

É importante ser transparente por meio de indicadores que comprovem o desempenho socioambiental da empresa.

Funcionários

Ir além do que é exigido pela lei em termos de benefícios e ter uma diferença menos abismal do que ocorre em grandes empresas entre o maior e o menor salário.

Comunidade

Pagar preços considerados justos aos fornecedores e incentivar funcionários a praticarem atividades voluntárias na comunidade em que a empresa opera.

Meio ambiente

Eficiência no uso da energia e reduzir o possível impacto negativo que o processo produtivo possa gerar sobre a natureza.

Negócio de impacto

A empresa deve ter algum tipo de impacto social benéfico, seja atuando em áreas carentes, como educação da população de baixa renda, ou ambiental, como reflorestamento.


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