Folha de S. Paulo


Empresas americanas transformam leite materno em indústria

O leite materno está se tornando mercadoria industrial nos EUA, e o rápido crescimento desse segmento de negócio não só se tornou uma das mais novas fronteiras do setor de biotecnologia como tem gerado preocupações.

A Prolacta Bioscience, uma das empresas que crescem no setor, recebeu US$ 46 milhões (cerca de R$ 150 milhões) em investimentos de empresas de capital para empreendimentos que operam no setor de ciências biológicas.

Ryan Stone/The New York Times
Gretty Amaya, que vendeu leite à Prolacta, com as filhas Alexis (bebê) e Adriana, em Miami
Gretty Amaya, que vendeu leite à Prolacta, com as filhas Alexis (bebê) e Adriana, em Miami

Centenas de mulheres vêm faturando mais de US$ 400 (R$ 1.300) ao mês com o fornecimento de leite materno excedente depois de amamentar seus bebês.

O leite extraído é encaminhado a uma unidade da Prolacta semelhante a uma fábrica de medicamentos. Lá, ele é concentrado em forma de produto de alto teor proteico e usado para alimentar bebês muito prematuros em unidades de tratamento intensivo de maternidades, ao custo de milhares de dólares por bebê.

O concentrado de leite pode ser só o começo. Pesquisadores dizem que o leite materno, um produto que evoluiu por milênios a fim de fornecer nutrição ideal e proteger bebês contra infecções, está repleto de possíveis virtudes terapêuticas, não só para bebês mas possivelmente também para adultos –por exemplo, para tratar doenças intestinais e infecciosas.

"O que estamos vendo é só a ponta do iceberg no caso do leite materno", disse Bruce German, diretor do Instituto de Alimentos para a Saúde na Universidade da Califórnia em Davis e presidente do conselho da Evolve Biosystems.

leite disponível

A Evolve e outras pequenas empresas como a Glycosin, a Jennewein Biotechnologie e a Glycom tentam desenvolver produtos baseados em açúcares complexos, abundantes no leite materno e que parecem alimentar bactérias no sistema digestivo humano importantes para a saúde.

Mas a comercialização do leite materno causa preocupação a muitas pessoas, pois pode reduzir o volume de leite disponível para bancos de leite sem fins lucrativos (dos quais dependem mães que não conseguem amamentar).

Quando a Medolac Laboratories, rival da Prolacta, anunciou em 2014 que queria adquirir leite materno em Detroit (polo industrial no norte dos EUA em dificuldades financeiras), foi acusada de querer lucrar à custa de mulheres negras, numerosas na população local.

A Medolac, que disse colaborar com a Fundação Clinton e incentivar o aleitamento materno tornando-o lucrativo, abandonou o plano.

Os produtos da Prolacta são dirigidos a bebês com peso inferior a 1,25 kg no parto –que cabem na palma da mão e necessitam de mais nutrição do que o leite materno pode prover por si só.

A Prolacta produz um fortificante com níveis elevados de proteína, gorduras e minerais, usado para suplementar o leite materno. O produto custa US$ 180 por dose de 30 ml, e um bebê consumiria US$ 10 mil do produto em um tratamento de várias semanas.

Em geral, o custo é coberto pelo hospital ou pela operadora de planos de saúde.

Mas nem todos os médicos estão convencidos sobre as virtudes do método, e outros dizem que, embora apreciem o produto, ele é caro demais.


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