Folha de S. Paulo


Desprezado, cálculo da Petrobras de desvios apontava baixa de R$ 88,6 bi

As contas inicialmente apresentadas pela presidente da Petrobras, Graça Foster, a seus colegas de conselho de administração, feitas na tentativa de eliminar os valores de corrupção de seu balanço contábil, na reunião desta terça-feira (27), apontava uma necessidade de baixa de R$ 88,6 bilhões nos ativos da empresa.

Esse montante, que representa 15% do ativo imobilizado da Petrobras, é o valor acima do que é contabilizado em 31 ativos da empresa, em relação ao que eles realmente valem.

As contas foram feitas usando metodologia que considera a expectativa de receita e retorno futuros dos investimento, frente ao custo do capital investido, além das informações reveladas na Lava Jato -entre elas, de que os contratos eram superfaturados em 3%, em média. Os cálculos foram feitos pela Deloitte e pelo BNP Paribas, conforme revelou a Folha, na semana passada.

Pela natureza da metodologia, tais valores encontrados acabaram incluindo mais do que o que foi indevidamente incorporado como propina entre 2004 e 2012, conforme indicaram as investigações da Operação Lava Jato.

Concluiu-se, então, que, se fossem baixados os R$ 88,6 bilhões, além do custo da corrupção, outras perdas acabaram sendo incorporadas, e seria impossível distinguir uma coisa da outra.

Assim, o número foi temporariamente descartado, na reunião, para efeito de ajuste dos ativos. Em nota enviada à Folha, o conselheiro Mauro Cunha informou que os valores não foram descartados, mas, sim, que, conforme a nota divulgada pela empresa, serão alvo de análise detalhada, visando identificar testes e avaliações complementares a que esses ativos poderão ser submetidos".

Procedimentos a serem adotados para os números, nas demonstrações contábeis revisadas "serão aprofundadas de forma a cumprir as exigências de órgãos reguladores", diz a nota.

O balanço com os resultados do terceiro trimestre de 2014, divulgado na madrugada desta quarta-feira (28), mostrou uma queda de 38% do lucro em comparação com o trimestre anterior, de R$ 4,9 bilhões para R$ 3,1 bilhões.

A Folha apurou que a conta que a Petrobras acabou descartando havia descoberto que, dos US$ 18,5 bilhões gastos em sua construção, a refinaria de Abreu e Lima, recém inaugurada, valia, na verdade, US$ 7 bilhões, e o Comperj, que deve ser inaugurada em 2016, teria seu valor revisto para zero. Ou seja, nada do que foi investido até agora neste projeto, orçado em US$ 13,5 bilhões, teria retorno.

REUNIÃO

A reunião, marcada para as 11h, iniciou-se com quase duas horas de atraso, devido a ajustes e discussões finais em relação à demonstração dos resultados do terceiro trimestre, que ali seria apresentada.

Normalmente, a reunião se dá por teleconferência entre São Paulo, Rio e Brasília, mas, nesta, quase todos foram à capital paulista, com exceção dos conselheiros Márcio Zimmermann, secretário-executivo do Ministério de Minas e Energia, e Sérgio Quintela, vice-presidente da Fundação Getulio Vargas.

Eles permaneceram, respectivamente, em Brasília e no Rio. Quitella preside também o conselho de auditoria da Petrobras, responsável pelo contato da empresa com seus auditores independentes, a PwC (PricewaterhouseCoopers).

Graça mostrou que que, além dos R$ 88,6 bilhões identificados como ajuste "para baixo", outros ativos estavam subavaliados em R$ 27,2 bilhões. Este ajuste a mais, porém, não pode ser feito.

Logo após apresentado o valor, o sócio da PwC Marcos Panassol alegou que a metodologia estava incorporando inadequadamente diversas variáveis, o que estaria jogando para cima de forma errada a necessidade de desconto por corrupção.

METODOLOGIA DESCARTADA

A necessidade de subtração dos valores atribuídos à corrupção que a Petrobras vem tentando fazer atende a uma determinação da PwC, feita à estatal em outubro, logo depois de o ex-diretor da empresa, Paulo Roberto Costa, ter afirmado à Justiça que integrou o esquema, entre 2004 e 2012.

O comunicado que saiu com o balanço, na madrugada desta quarta-feira (28), detalha a questão apontada pela PwC, ao informar que o motivo do descarte da metodologia foi que o "ajuste era composto de diversas parcelas de naturezas diferentes, impossíveis de serem quantificadas", entre elas mudanças em projeções de preços e margens de insumos e produtos comercializados, câmbio, dentre outros.

DISCUSSÃO

Deu-se, em seguida, na reunião, uma longa discussão sobre de que forma e em que momento os ajustes deveriam ser feitos.

Um dos três conselheiros independentes, Mauro Cunha, que representa os minoritários donos de ações ordinárias, defendeu, então, que o balanço fosse divulgado mesmo sem os ajustes.

Ele explicou posteriormente que, o que defendeu "a todo momento foi a importância do 'disclosure' [transparência] da informação".

"A citada discussão no Conselho de Administração foi focada na melhor prática para o disclosure da informação obtida a partir dos laudos de avaliação recebidos, tendo como parâmetro as obrigações legais de divulgação e a política de transparência da companhia", disse Cunha.

Conforme o relatório assinado pelo diretor financeiro da Petrobras, outro importante motivo da divulgação dos dados, ainda que sem as baixas, era a necessidade de evitar vencimento antecipado de dívidas, que ocorreria caso um balanço não auditado não fosse apresentado até a próxima sexta-feira.

Esses vencimentos antecipados ocorreriam em 30 dezembro, mas, duas semanas antes, a Petrobras havia pedido extensão do prazo a tais credores, porque ainda não tinha conseguido fechar o balanço com os ajustes da corrupção.

REVISÃO

A Petrobras identificou que quase um terço de seu ativo imobilizado, ou R$ 188,4 bilhões de um total de R$ 600 bilhões, precisaria ser revisto.

Segundo a estatal, esses são os projetos que tiveram etapas feitas entre 2004 e 2012 pelas 23 empreiteiras apontadas Operação Lava Jato.

A empresa arquivou suas demonstrações sem os ajustes esperados na CVM (Comissão de Valores Mobiliários) na madrugada desta quarta-feira.

Mesmo sem ter feito as baixas, uma grande perda já foi contabilizada. Como decidiu engavetar as refinarias Premium 1 e 2, que seriam erguidas no Maranhão e no Ceará, foi obrigada a reconhecer uma baixa de R$ 2,7 bilhões. Os projetos estavam ainda na fase de terraplanagem. Não há previsão de quando serão retomados.


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