Folha de S. Paulo


Pepsi, IKEA e FedEx também usaram Luxemburgo para pagar menos impostos

O Grão-Ducado de Luxemburgo fechou acordos secretos com Pepsi, IKEA, FedEx e 340 outras corporações internacionais para que essas empresas reduzissem seus impostos ao manter uma pequena presença naquele país europeu.

É isso o que mostram documentos obtidos pelo ICIJ (Consórcio Internacional de Jornalistas Investigativos). Neles, é possível verificar que essas companhias enviaram centenas de bilhões de dólares para Luxemburgo e economizaram outros bilhões de dólares em impostos.

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As 27.819 páginas dos documentos confidenciais foram analisadas por uma equipe de mais de 80 jornalistas com atuação em 26 países. Em alguns casos, os documentos mostram que as empresas desfrutaram de uma taxa reduzida, de menos de 1% de imposto sobre os seus lucros em Luxemburgo.

A União Europeia está há meses em disputa com Luxemburgo, pois o paraíso fiscal se recusa a entregar informações sobre os acordos tributários que celebrou com a Amazon e a Fiat. Não está claro se esses contratos estão de acordo com as leis europeias -algo que só será conhecido se as autoridades decidirem abrir algum procedimento formal de investigação.

Nesta quarta-feira (5), o ICIJ e seus parceiros na mídia estão liberando um grande acervo sobre acordos tributários feitos por Luxemburgo de 2002 a 2010. Não se sabe se esses documentos são os mesmos que a União Europeia espera receber. Mas os papeis vão ao cerne da investigação das autoridades europeias a respeito de acordos tributários luxemburgueses com diversas empresas.

Esses documentos vazados e analisados pelo ICIJ se referem a acordos negociados pela PricewaterhouseCoopers em nome de centenas de clientes corporativos. Para qualificar as empresas para o benefício tributário, segundo os documentos, a PwC busca saídas, como fazer empréstimos dentro de uma mesma empresa. Outra ação ocorre por meio da mudança dos lucros de um país para o outro com o objetivo de reduzir a base tributária.

Os documentos mostram, por exemplo, que a empresa de entregas norte-americana FedEx instalou duas afiliadas em Luxemburgo para embaralhar suas receitas de operações mantidas no México, França e Brasil com outras subsidiárias em Hong Kong. Os lucros do México foram parar em Luxemburgo em sua maior parte classificados como dividendos livres de impostos.

"A estrutura em Luxemburgo é uma forma de dilapidar a receita [tributável] de qualquer país em que possa ser gerada", diz Stephen E. Shay, professor de tributação internacional da Escola de Direito de Harvard e um ex-funcionário do Departamento do Tesouro dos EUA especializado em impostos. O Grão-Ducado, diz ele, "combina uma enorme flexibilidade para montar esquemas de redução de impostos com acordos tributários que são únicos. É como se fosse um mundo mágico encantado".

A FedEx não quis comentar sobre seus arranjos tributários em Luxemburgo. A lista de outras empresas que buscaram acordos no país incluem Accenture, Laboratórios Abbott, American International Group (AIG), Amazon, Blackstone, Deutsche Bank, H.J. Heinz, JP Morgan Chase, Burberry, Procter & Gamble, Carlyle Group e o Abu Dhabi Investment Authority.

As autoridades em Luxemburgo afirmam que o sistema de acordos tributários privados é correto. "O sistema tributário de Luxemburgo é competitivo. Não há nada de ilegal ou antiético. Se as empresas conseguem reduzir seus impostos para alíquotas muito baixas, esse não é um problema de um sistema tributário, mas da interação de vários sistemas tributários", disse ao ICIJ Nicolas Mackel, chefe do "Luxembourg for Finance", uma agência que trabalha com o governo local.

Editoria de Arte/Folhapress

A revelação dos documentos vazados ocorre em um momento sensível para Luxemburgo. Em meio à investigação da União Europeia sobre seus acordos tributários, o ex-primeiro ministro luxemburguês Jean-Claude Juncker acaba de assumir o cargo de presidente da Comissão Europeia.

Juncker comandou Luxemburgo durante o período em que muitos dos acordos de redução tributária mostrados nesta reportagem foram desenhados. Ele prometeu combater evasão de impostos em sua nova função. Mas também declarou que em seu país o regime tributário está em "total acordo" com a lei europeia.

A investigação do ICIJ sobre Luxemburgo foi produzida ao longo de seis meses em parceria com vários veículos de comunicação, incluindo "The Guardian" (do Reino Unido), "Süddeutsche Zeitung" (Alemanha), "Le Monde"(França), "Asahi Shimbun" (Japão) e Folha.

A maior parte dos acordos tributários analisados foi aprovada pelo governo de Luxemburgo de 2008 a 2010. Alguns já foram objeto de uma reportagem em 2012 produzida pelo jornalista Edouard Perrin, para a France 2, televisão pública francesa, e para a BBC, do Reino Unido. Mas a maioria dos documentos da PwC nunca havia sido analisada jornalisticamente.

Menos de 30% dos acordos tributários mencionados nos documentos vazados incluem uma cifra específica para o montante de dinheiro que as empresas dizem planejar enviar por meio de suas operações em Luxemburgo. O total desses acordos para os quais há valor disponível aproxima-se de US$ 215 bilhões no período de 2002 a 2010.

Colaboraram com o ICIJ (Consórcio Internacional de Jornalistas Investigativos) nesta reportagem LESLIE WAYNE, KELLY CARR, MARINA WALKER GUEVARA, MAR CABRA, MICHAEL HUDSON, MARGOT WILLIAMS, EMILIA DÍAZ-STRUCK, DELPHINE REUTER, FRÉDÉRIC ZALAC, HARVEY CASHORE, LARS BOVÉ, KRISTOF CLERIX, JULIA STEIN, TITUS PLATTNER, MARIO STÄUBLE, MINNA KNUS-GALÁN, MATTHEW CARUANA-GALIZIA e NEIL CHENOWETH


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