Folha de S. Paulo


Baixo retorno inibe reinvestimento na indústria, diz setor

Empresários que investiram em sua indústria obtiveram, em média, retorno de 47% entre 2008 e 2012. Já aqueles que aplicaram no mercado financeiro, em um fundo de renda fixa, por exemplo, embolsaram 62%.

Isso significa que a cada R$ 1 bilhão investido no setor industrial foram gerados R$ 469 milhões de rendimentos, já descontado o pagamento de imposto de renda.

A mesma quantia investida numa aplicação financeira considerada conservadora resultou em R$ 624 milhões. Ou seja: R$ 155 milhões a mais de lucro para recursos não reinvestidos na indústria.

Os dados estão em estudo do departamento de competitividade da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo) sobre como os investimentos industriais sofrem impacto da perda de rentabilidade e da redução da margem de lucro do setor.

Os dois indicadores (margem de lucro e rentabilidade) chegaram em 2012 ao pior nível desde 2008, ano eleito para iniciar o estudo por ser o do estouro da crise global.

Editoria de arte/Folhapress

O levantamento foi feito em todas as indústrias do país que apuraram imposto de renda com base no lucro real, segunda dados da Receita Federal de 2012, os mais recentes disponíveis.

"Há um desestímulo para investir", diz José Ricardo Roriz Coelho, diretor do departamento. "As aplicações financeiras geram retorno alto com risco quase zero. Os investimentos na indústria, além de renderem menos, têm riscos", afirma.

Entre eles, Coelho cita a dificuldade de competir por causa da carga tributária maior, juros altos para empréstimos, riscos cambiais, custos trabalhistas e gargalos que encarecem a produção.

"Não há sinal de mudança nem a longo prazo. O país não tem plano para resolver questões que poderiam ter impacto na decisão de investir."

Em agosto, pelo oitavo mês seguido, a confiança dos empresários da indústria recuou. Está no menor patamar desde abril de 2009, segundo sondagem da FGV.

"Diante de incertezas, o empresário fica na retaguarda", diz Roberto Aragão, da FGV Projetos. Além da crise de confiança, afirma, o investimento sofre neste ano com juros mais altos e inflação maior, o que eleva o custo das empresas e deixa menos dinheiro no caixa para investir.

Para o professor Aloisio Campelo Jr., coordenador das sondagens do Ibre/FGV, a diminuição da rentabilidade do setor é um fator relevante: "Afeta na limitação de recursos para investir (há empresas conservadoras, que preferem não usar recursos de terceiros) e na percepção de retorno futuro muito baixo para o que investir hoje."

O estudo ressalta ainda a queda no total de desembolsos do BNDES à indústria (de 46% em 2010 para 28% em 2013) e a perda de investimentos estrangeiros no setor.

Para o economista Antonio Corrêa de Lacerda, professor da PUC-SP, recuperar a capacidade de investir é pré-requisito para o país crescer de modo mais robusto e contínuo.

"Com investimentos em queda, a indústria perde participação no PIB, o que traz impactos negativos para emprego, renda e país. Os investimentos caíram 5,3% no segundo trimestre frente ao primeiro. A taxa de investimento estacionou em 18%."

Os empresários deixam de ser industriais e viram "rentistas" na tentativa de resolver seu caixa, diz Lacerda.

"Ele vende a empresa, cria outra de participações, em que a produção de um bem é trocada por ações, títulos e imóveis, e resolve seu problema. Para o país, é péssimo. O produto que era aqui fabricado passa a ser importado". Em 2003, 10% dos produtos industriais vendidos no país eram importados. Em 2013, 25% eram importados.


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