Folha de S. Paulo


Leitor vive 'era de ouro', diz colunista do jornal 'The New York Times'

O colunista de mídia e cultura do jornal "New York Times", David Carr, aponta uma "era de ouro" na comunicação, tamanha a diversidade à disposição do leitor.

Mas afirma que é a manutenção de padrões de qualidade no jornalismo o caminho para um movo modelo de negócio para os jornais.

O colunista, que defende a cobrança por conteúdo on-line, afirma ainda ser necessário buscar formas de publicidade na internet, para valorizar o material do anunciante sem contudo "vender a alma" do jornalismo.

Carr, que lança "A Noite da Arma" (ed. Record), uma reportagem sobre sua vida e seu vício em crack, foi sabatinado nesta terça-feira (5) pelo repórter especial da Folha Nelson de Sá e pelo editor da "Ilustríssima", Cassiano Elek Machado, em evento no jornal.

Marlene Bergamo/Folhapress
O jornalista David Carr, do
O jornalista norte-americano David Carr, do "New York Times", durante palestra no auditório da Folha

*

Conteúdo virtual
Nem todo clique tem o mesmo valor. Se eu começo a fazer vídeos de topless, a audiência vai subir por cinco segundos. E depois? Há três jornais de qualidade no Brasil. O seu verdadeiro trabalho é explicar o seu país. E isso tem de ser um modelo de negócio.

Receita
Não há apenas um caminho certo para viabilizar um jornal hoje em dia. Quando criamos o paywall no "New York Times", disseram que não ia funcionar. Já há algum tempo, o valor arrecadado com assinaturas ultrapassou a publicidade. Um milhão de pessoas hoje assinam a versão digital.

Vamos descobrir que tamanho o negócio dos jornais pode ter nesse novo contexto. Mas o importante é perceber que o que fazemos não é de graça.

Era de ouro
Há muito mais coisas boas para ler do que jamais houve. Esta é uma era de ouro. Há muitos sites fazendo um bom trabalho, com bons textos, boas histórias. Veja o caso do Wikileaks. O que [o ex-analista da CIA Edward] Snowden fez foi muito importante para o país, mostrar que o governo [dos EUA] nos espiona.

Uso da tecnologia
Eu tenho um iPhone que faz vídeos, uso muito o Twitter e o Facebook para questionar as pessoas sobre as suas opiniões. Você não pode se comportar como se a internet nunca tivesse sido inventada.

Nosso trabalho ainda é sair desse prédio, encontrar as pessoas, ouvi-las e contar as histórias. Mas isso não quer dizer que a maneira como você procura as histórias não possa mudar. Nós temos de ir tentando.

Valores
O "Times" põe um chip em você, com seus princípios, seu jeito, é uma instituição. Na semana passada, escrevi um nome errado no jornal. Eu não dormi. Manter esses valores é importante. Você tem de ser cuidadoso em um grande jornal. O impacto é enorme.

Publicidade
Com a internet, surgiram mais possibilidades de lugares para anunciar. E o preço dos anúncios caiu. A "publicidade nativa" [conteúdo patrocinado] é um jeito de fazer os preços voltarem a subir e a publicidade se destacar.

Houve uma campanha para a série "Orange is the New Black", e foi feita uma sequência de vídeos sobre cadeias femininas [cenário da série]. Eu gostei. Houve outras campanhas, mais agressivas, das quais não gostei tanto. Mas não vamos deixar ninguém comprar as nossas almas.

Livro
As pessoas escrevem muitos livros ao estilo "eu era um cara terrível e agora sou legal". Eu achei que uma forma de fazer [o livro] seria ser um repórter: entrevistar dezenas de pessoas, procurar os documentos, e comparar minha memória com o que aconteceu.

O que eu descobri foi que minha memória estava errada. As pessoas só lembram o que querem sobre elas mesmas.

O livro é um pouco sobre esse truque da memória.

Este livro foi muito constrangedor, por ser muito pessoal. Mas o fato é que tudo que você escreve no Twitter passa, as notícias passam, mas os livros ficam.


Endereço da página: