Folha de S. Paulo


Revolução digital, em nova versão, já bate na porta da geladeira

O projeto de "smart home", ou casa inteligente, que a Apple deve anunciar em sua conferência mundial nesta segunda-feira (2), em San Francisco, é o mais recente indício do advento da "nova revolução digital" prevista por especialistas no assunto para os próximos dez anos.

Uma pesquisa conduzida pelo Pew Research Center com mais de 1.600 analistas e pessoas ligadas ao tema mostrou que 83% deles acreditam que, até 2025, a chamada "internet das coisas", que visa conectar objetos do cotidiano a dispositivos eletrônicos, vai ter se disseminado e seus efeitos serão sentidos no dia a dia das pessoas.

A expectativa é que seja normal, em uma década, ter embalagens de leite com chips que lembrem ao consumidor que o produto está quase no fim -ou sensores na prateleira da mesma geladeira que avisarão ao vendedor do mercado da vizinhança que seu cliente vai precisar de mais leite.

A mesma evolução poderia ser vista em dispositivos de monitoramento de sinais vitais de pacientes ou em sensores a serem instalados em estradas e prédios, para enviar alertas de reparos necessários em sua estrutura.

"Uma proliferação contínua de dispositivos vestíveis, aparelhos e artefatos conectados, redes 'inteligentes' e ambientes cheios de sensores e câmeras é esperada até 2025", disse a professora Janna Anderson, uma das coordenadoras do estudo do Pew.

O número de aparelhos conectados à internet em todo o mundo em 2013 chegou a 13 bilhões, segundo a Cisco Systems. A previsão para 2020 é que ele atinja os 50 bilhões de dispositivos.

Para Per Ola Kristensson, professor da Universidade de St. Andrews, no Reino Unido, os principais sinais da "nova revolução digital" já podem ser vistos em produtos para uso pessoal, como o Google Glass e relógios inteligentes.

Robyn Beck/AFP
Geladeira que se comunica com smartphone é apresentada em feira de tecnologia nos EUA
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PRIVACIDADE

A maior capacidade de monitoramento, no entanto, também tornaria a privacidade dos indivíduos ainda mais vulnerável, alertam alguns dos especialistas.

"Se tudo está conectado e se comunicando, tudo o que fazemos pode ser descoberto. Provavelmente vamos ter de aceitar ter um pouco menos (ou muito menos) de privacidade", diz Joel Halpern, engenheiro da Ericsson.

Outro risco é desenvolver tecnologias tão complexas que poucos poderão dominá-la por completo. "Vamos viver num mundo onde muitas coisas não funcionarão e ninguém vai saber como consertá-las", diz o sociólogo Howard Rheingold, um dos pioneiros no estudo da internet.

Para especialistas consultados pela reportagem, contudo, foi consenso que a disseminação da "internet das coisas" atingirá níveis distintos entre países desenvolvidos e em desenvolvimento na próxima década.

"É provável que a separação digital -e a desigualdade digital que ocorre mesmo depois que uma região em desenvolvimento se torna conectada- vá continuar", afirma David Weinberger, pesquisador do Centro Berkman para Internet e Sociedade da Universidade Harvard.

O Brasil, entretanto, é visto com "otimismo" entre os entusiastas da revolução.

Para Robert D. Atkinson, presidente da Fundação de Tecnologia da Informação e Inovação, uma nação "tão desenvolvida quanto o Brasil" vai ver adesão significativa a esse tipo de tecnologia. "Não há razões para que empresas no Brasil não sejam líderes na aplicação de tecnologias especialmente relacionadas a agricultura e infraestrutura."


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