Folha de S. Paulo


Análise: Inadimplência é só o primeiro sintoma dos problemas da Caixa

O aumento da inadimplência da Caixa Econômica Federal nos empréstimos para empresas no primeiro trimestre deste ano já é um reflexo das dificuldades que o banco estatal enfrentará até o primeiro semestre de 2015.

Nesta quarta-feira (21), o banco estatal divulgou lucro de R$ 1,5 bilhão nos três primeiros meses do ano, com alta de crédito, mas avanço na inadimplência.

Pilar da expansão do crédito no país, a Caixa vinha recebendo dinheiro novo do governo federal para crescer o volume de empréstimos acima de 50% ao ano. Foi assim de 2009 a 2012.

Neste ano, o governo fechou completamente a torneira. Como a Folha revelou, em março, não haverá injeção de recursos no banco neste ano. Ou seja: a Caixa ajudará o governo a apertar suas contas para cumprir a meta de economizar 1,9% do PIB.

Sem dinheiro próprio, a saída para o banco foi reduzir o ritmo de concessão de crédito. Um dos resultados dessa política já deu sinais: o aumento de 0,3% da inadimplência no trimestre.

Hoje, a carteira de empréstimos comerciais (para empresas) está em 2,6%.

Com menos recursos próprios, a Caixa já contingenciou o crédito para grandes empresas, que são boas pagadoras, e o crédito continuou rolando para as de médio e pequeno porte, com taxas de inadimplência maiores. O impacto já está no balanço.

Nos bastidores, o próprio banco trabalha com a perspectiva de que a inadimplência dessa carteira atinja 3% até o final deste ano.

Para compensar, a Caixa deverá diluir essas "perdas" com a carteira de crédito imobiliário e do consignado, que têm inadimplência menor.

Assim, a taxa geral de inadimplência do banco não será tão impactada pela carteira comercial e poderá ficar abaixo de 2,6%, dentro do patamar atual.

ANTECEDENTES

Essa situação significa, na prática, um freio na política de expansão de crédito que o governo vinha implementando turbinado, basicamente, pela oferta da Caixa.

Sem dinheiro novo, a Caixa não poderá mais crescer ao ritmo de 50%, como vinha ocorrendo até 2012, e crescerá, no máximo, 22%.

Isso porque, pelas regras internacionais de mercado, para cada R$ 100 concedidos em empréstimos por um banco, pelo menos R$ 11 precisam ser de recursos próprios.

Mas a situação pode ficar ainda pior caso o governo mantenha o arroxo na Caixa até o próximo ano.

No pior dos cenários traçados pelo banco, a "máquina" para se não houver dinheiro novo até o primeiro semestre do próximo ano.

Se a injeção de recursos não ocorrer até lá, não só a inadimplência será um problema, mas a própria solidez da concessão de crédito.

Em dezembro, o índice de capital próprio da Caixa era de R$ 15 a cada R$ 100 em empréstimos. Estima-se que poderá fechar em 13%, em 2015.

A Caixa já estuda alternativas para tentar reduzir esses impactos. Mas nada evitará que o governo faça uma nova injeção de, pelo menos, R$ 2 bilhões no banco até, no máximo, o primeiro trimestre do próximo ano.

DESEMPENHO

Ainda não se sabe se a estratégia do "estica e puxa" na Caixa terá sucesso e se o desempenho do banco será comprometido.

O que já se sabe é que os dividendos pagos pelo banco ao governo terão de ser reduzidos à metade e que a Caixa também pode perder espaço na disputa do mercado de crédito para bancos privados.

Até o momento, essas instituições ainda não se mostraram com apetite para tomar o mercado que a Caixa tinha conquistado nos últimos anos, numa tentativa de diversificar sua própria geração de receita –antes muito focada na compra de títulos do governo. Hoje, mais da metade da receita do banco já é concessão de empréstimos.

Editoria de Arte/Folhapress

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