Folha de S. Paulo


Lei faz IBGE suspender divulgação da Pnad Contínua, nova pesquisa trimestral

A divulgação da nova pesquisa do IBGE que mede indicadores sociais e do mercado de trabalho, a Pnad Contínua –que mediu desemprego de 7,1% em 2013, será interrompida em razão de um requerimento de informações apresentado por senadores sobre dados de renda domiciliar per capita.

É que uma lei editada no ano passado alterou um dos critérios de repartição do Fundo de Participação dos Estados, que antes considerava o PIB per capita. A legislação alterou o indicador para a renda domiciliar per capita.

A Lei Complementar 143, de 17 de julho de 2013, alterou os critérios da participação de Estados no fundo –recursos a serem recebidos em 2016, correspondentes ao exercício de 2015. Por isso, há a necessidade de um indicador de renda domiciliar já para 2015.

O IBGE planejava divulgar a renda domiciliar no final do ano que vem, mas uma solicitação de senadores deve fazer com que o instituto tenha os dados em mãos já em janeiro de 2015. Com isso, terá de recalcular a amostra da pesquisa, o que pode levar a ter de fazer novas novas entrevistas com a população de alguns Estados, além daquelas que já foram feitas.

No começo deste mês, os senadores Gleisi Hoffmann (PT-PR) e Armando Monteiro (PTB-PE), indagaram o IBGE sobre a margem de erro dos dados de renda domiciliar per capita, que nem sequer foram divulgados.

O receio é que a diferença entre as margens pudesse gerar contestações judiciais por parte dos Estados –que poderiam pleitear, por exemplo, que fosse considerada a renda inferior do intervalo a fim receber mais recursos do FPE.

São Paulo, por exemplo, tinha, na antiga Pnad, uma margem de erro de 6% na renda domiciliar per capita, variando, em 2012, de R$ 1.282 a R$ 1.448, com a média de R$ 1.365. Já no Acre, a média era de R$ 788, com intervalo oscilando de R$ 655 a R$ 920 –ou seja, uma margem de erro de 16,7%.

Wasmália Bivar, presidente do IBGE, disse que há o pedido dos senadores, com base na interpretação da lei, para que as margens de erros "sejam equalizadas", atenuando as diferenças. Isso não estava contemplado, diz, no planejamento original da pesquisa –que continuará em campo, apesar dos ajustes que serão realizados.

2015

Na interpretação do IBGE, os dados de renda domiciliar per capita (todas as renda, como de trabalho, aposentadorias, transferências do governo e outras) só precisariam ser divulgados ao final de 2015, mas pelo entendimento apresentado pelos senadores a data-limite é janeiro do ano que vem.

Para concentrar esforços para fazer testes, estudos e mudar o tamanho da amostra nos Estados, diz Bivar, decidiu-se interromper as divulgações previstas e retomá-las em janeiro de 2015, já com os dados da renda domiciliar que vão balizar o Fundo de Participação dos Estados.

A próxima divulgação estava prevista para junho. Nesta quinta, foram divulgados dados dos dois últimos trimestres de 2013.

Na ocasião, está programado também que o IBGE passe a publicar os principais dados mensais do mercado de trabalho, como a taxa de desemprego –que na nova pesquisa tem periodicidade trimestral.

Atualmente, a nova Pnad não informa nenhum dado de rendimento. Estavam sendo coletados, antes desse replanejamento da pesquisa, informações apenas sobre renda do trabalho (que não inclui todas as fontes).

Bivar disse ainda que, durante o processo de discussão da nova lei do fundo constitucional que destina recursos aos Estados, o IBGE foi contrário à adoção da renda domiciliar.

O melhor, diz, seria manter o PIB per capita, indicador que agrega outros dados sobre a economia dos Estados (como os do governo), tem periodicidade anual e não sofre o efeito de uma margem de erro por não se tratar de uma pesquisa por amostra.

OUTRAS PESQUISAS

Bivar afirmou ainda que está prevista para o segundo semestre deste ano a realização da antiga Pnad, que é investigada num período do ano –e não de modo contínuo ao longo de todo o ano, como a nova pesquisa.

Havia dúvida se esse levantamento teria sua última edição, mas a presidente do IBGE afirmou que é "necessário" e uma demanda de especialistas para fechar a análise "de um ciclo político" –ou seja, o governo Dilma, que se encerra em 2014.

Para 2015, a programação é realizar a POF (Pesquisa de Orçamentos Familiares). Já a Contagem da População foi adiada para 2016 por conta de restrições orçamentárias.

PRESSÃO POLÍTICA

À Folha, a presidente do IBGE, Wasmália Bivar, negou pressão política para interromper a divulgação dos dados da Pnad Contínua neste ano e lembrou que o instituto anunciou na quarta-feira "um número ruim" de inflação –o IPCA foi o mais elevado para março em onze anos.

O que ocorreu, diz, foi uma "interpretação equivocada da lei" por parte do IBGE. O entendimento era de que a renda domiciliar per capita deveria ser calculada só ao final de 2015 e não no começo do próximo ano.

Com isso, diz, os técnicos terão só oito meses para desenvolver a nova metodologia e equalizar a margem de erro dos Estados, que não fazia parte do planejamento da pesquisa.

A restrição de servidores, afirma, impede que as duas tarefas –análise e crítica dos dados para divulgação e testes e estudos para a mudança metodológica – ocorra simultaneamente.

"Foi uma decisão de natureza institucional. Optamos por atender a uma prioridade, que envolve um preceito constitucional [o Fundo de Participação dos Estados]", disse.

O IBGE tem ainda o receio de ações na Justiça, como ocorre no caso do Fundo de Participação dos Municípios, que contestam na Justiça as estimativas de população para repartição dos recursos.

Um dos autores do pedido de informações, o senador Armando Monteiro disse, por meio de sua assessoria, que não iria comentar o tema, pois apenas assinou o requerimento para ajudar a senadora Gleisi Hoffmann, que idealizou o pedido. Procurada, a senadora não foi localizada.


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