Folha de S. Paulo


Credores do Banco Santos querem quadros de ex-banqueiro Edemar Cid Ferreira

Os credores do Banco Santos pediram à Justiça brasileira que sequestre no exterior pelo menos 29 obras de arte supostamente desviadas pelo ex-banqueiro Edemar Cid Ferreira pouco após a intervenção do banco, em 2004.

Eles também solicitaram a extensão da falência do banco às empresas Wailea e Bokara, donas da coleção do ex-banqueiro, e da Broadening-Info, companhia panamenha que, dizem, foi usada para simular compra e venda das peças só para retirá-las do país.

O pedido é baseado em uma investigação que ocorreu sob segredo de Justiça nos EUA, nas Ilhas Virgens Britânicas, em Bahamas e no Reino Unido, em que foram apreendidos documentos em galerias, seguradoras, casas de leilão e prestadores de serviço, após autorização judicial.

Os credores querem as peças de volta para que sejam leiloadas e, assim, recebam seus pagamentos. Também pedem que recursos em contas das empresas Wailea, Bokara e Broadening sejam bloqueados em seu favor.

Zanone Fraissat - 27.set.2013/Folhapress
Edemar Cid Ferreira, ex-controlador do Banco Santos
Edemar Cid Ferreira, ex-controlador do Banco Santos

Na ação que corre na Justiça brasileira, eles afirmam que essas empresas foram abastecidas com dinheiro desviado do Banco Santos em operações de crédito simuladas para, depois, retornarem ao Brasil como investimento em empresas controladas por Edemar ou por sua mulher, na compra de obras da coleção de arte de Edemar e na construção da casa, na rua Gália, em São Paulo. O pedido aguarda decisão do juiz.

Há fax, troca de e-mails, apólices de seguros, faturas de pagamentos e cópias de depósitos que, segundo o síndico da massa falida, Vânio Aguiar, comprovam que a Broadening foi usada por Edemar para simular compra e venda das obras de sua coleção em benefício próprio.

Em entrevista à Folha, Edemar Cid Ferreira negou as acusações e se disse vítima de uma "estratégia criminosa". "Tudo foi feito dentro da legalidade, e o Banco Central foi devidamente informado."

Mas, no processo que corre na 2ª Vara de Falências e Recuperações Judiciais de São Paulo desde junho deste ano, os investigadores contratados pelos credores afirmam que, mesmo após a venda no exterior, os titulares das peças continuaram sendo Edemar Cid Ferreira e sua mulher, Márcia, casados com separação total de bens.

O seguro de boa parte das obras continuou em nome de Márcia até o fim de 2006, quando elas foram vendidas pela Broadening para colecionadores na França, na Suíça, no Reino Unido e na Holanda.

As faturas de pagamento também foram enviadas para a mulher de Edemar, ainda segundo os investigadores. No final de 2006, a seguradora Rockwell enviou comunicado de que as apólices estavam vencendo.

Logo depois, as peças foram vendidas e levadas para a Europa, onde ficaram armazenadas entre 2004 e 2005. Seguiram para os EUA quando a Broadening começou a negociá-las. A galeria Barral Fine Arts foi a principal envolvida.

Editoria de Arte/Folhapress

CONTRATEMPO

No transporte de avião do Brasil para a Suíça, em 2004, a obra "Dos Figures", de Rufino Tamayo, foi danificada. Os documentos obtidos revelam que a empresa da mulher de Edemar recebeu US$ 500 mil da seguradora. O pagamento foi realizado em 2005.

À Justiça americana a Broadening disse ser a proprietária das peças, mas, nas notas, constavam valores de cerca de US$ 100, e as peças descritas eram diferentes. A companhia panamenha explicou que tinha um contrato de compra e venda com a Bokara, empresa de Edemar e Márcia, mas que não declarou o valor de mercado por causa do seguro elevado.

Além disso, afirmou que só estava fazendo o transporte e pagaria o imposto devido quando as peças fossem definitivamente vendidas, o que aconteceu dois anos depois. Além de quadros e esculturas, 45 fotografias da coleção de Edemar foram vendidas por € 203 mil.

O quadro "Hannibal", de Jean Basquiat, e a escultura "Mulher Sentada", de Henry Moore, com seguros de US$ 1 milhão cada um à época, hoje estão avaliados em US$ 8 milhões e US$ 3 milhões, respectivamente. Somadas, as apólices das 29 peças, na época, chegaram a US$ 12,5 milhões.

OUTRO LADO

Edemar Cid Ferreira afirmou que não há na ação movida pelo síndico da massa falida Vânio Aguiar prova de que a Broadening seja sua ou de que tenha sido usada para desviar bens dos credores logo após a intervenção de seu banco, em novembro de 2004. "Todas as transações já eram conhecidas da Justiça e do Banco Central", diz. "O que fizeram no exterior para conseguir esses documentos foi um crime."

O ex-banqueiro acusa Vânio Aguiar de "mentir" à Justiça americana para conseguir os mandados de busca e apreensão das obras. "As obras não foram roubadas, como ele afirmou. Há recibos de venda das peças para a Broadening em 2004."

Edemar diz que o mandado de arresto das peças só ocorreu após 2005. Por isso, não houve nada de ilegal na venda das peças. "Foram atrás de obras que tinham sido ven-di-das! (sic)."

O ex-banqueiro, um dos principais mecenas do país até o Banco Santos sofrer intervenção, afirmou à Folha que o síndico não "recuperou" esses quadros. "Um deles foi comprado pela massa por um valor simbólico. Isso é recuperação?"

Edemar acusa Aguiar e a empresa OAR, que fez a investigação internacional, de trazer documentos que nada acrescentam só porque receberão 20% de tudo o que já foi arrecadado, mesmo que não consigam trazer nada novo para os credores.

Ele nega ser dono da Broadening ou usá-la em seu benefício. Confirma ser sua mulher, Márcia, a dona da Principle, empresa que controlava as empresas Wailea e Bokara, donas das obras de sua coleção. "Mas elas foram encerradas há muito tempo." procurados, Vânio Aguiar e a OAR não quiseram se manifestar.


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