Folha de S. Paulo


Alívio com a decisão do BC americano não vai durar, diz economista-chefe do JPMorgan

A decisão do Fed (Federal Reserve, o banco central americano), tomada em reunião na quarta-feira passada, de adiar a redução de estímulos na economia não só deu alívio aos países emergentes, como já beneficia o Brasil.

Bruce C. Kasman, diretor e economista-chefe global do banco JPMorgan, afirma que investidores viram na manutenção da atual política monetária nos EUA uma oportunidade de retornar a mercados de maior risco.

O desafogo, porém, provavelmente não durará muito. Para ele, ainda neste ano, o Fed deve iniciar o processo de diminuição das compras de ativos que por ora mantém.
A seguir, trechos da entrevista que ele deu em seu escritório na sede do banco americano, em Nova York.

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Folha - Depois da decisão do Fed, o senhor viu mais interesse em investimentos no Brasil?
Bruce C. Kasman - Eu acho que, de modo geral, sim. As conversas que tive com investidores foram de que isso vai promover oportunidade de se considerar o retorno aos mercados emergentes, especialmente àqueles mercados que têm estado sob maior pressão. E obviamente o Brasil está neste grupo.

A decisão do Fed trouxe alívio para mercados emergentes, mas quanto tempo isso vai durar?
Foi um alívio que não vai durar muito. Provavelmente, mais tarde neste ano, o Federal Reserve [o banco central americano] vai reduzir a compra de ativos [iniciada em setembro de 2012, de US$ 85 bilhões mensais] e voltar ao patamar que imaginávamos.

Mas acho que há uma grande mudança que terá um efeito positivo para ativos mais arriscados de mercados emergentes.

Como o sr. vê a economia do Brasil?
Pensamos que a economia brasileira ainda está diante de difíceis desafios, entre eles, o controle da inflação e a criação de um ambiente melhor para investimentos.

Mas acho que a dinâmica de uma economia global mais forte está ajudando, e a nossa experiência é que o Brasil é um dos países que têm benefícios com a elevação da demanda nos mercados desenvolvidos.

Vemos retomada global da indústria, que vai ajudar o Brasil, diretamente e indiretamente, e preços de commodities mais sólidos. Então, temos uma economia brasileira em que esperamos ver retomar um crescimento.

Qual a sua estimativa para o PIB de 2014?
Projetamos um PIB [Produto Interno Bruto] de 3% para o ano que vem.

Ainda é uma economia que não está indo tão bem quanto estávamos acostumados a esperar.

A última decisão do Fed foi um tipo de 'mea culpa' [pelo efeito que a sinalização do banco de reduzir as compras causou nas taxas de longo prazo, na valorização do dólar e na tensão nos países emergentes com a saída de capitais]?
Não acho que eles devam se sentir envergonhados, que fizeram um erro. As coisas mudaram, e eles mudaram da posição que consideravam antes.

Mas houve erro de comunicação?
O Fed não nos guiou por um caminho tranquilo em direção a essa mudança e, em junho, ele nos guiou para o alvo de 7% [Bernanke havia dito que reduziria a compra de ativos quando a taxa de desemprego estivesse nesse patamar], mas deixou de usar esse limite de 7% como guia.

Isso foi um erro que fizeram de comunicação. Estamos falando de coisas pequenas, mas a mudança do Fed foi pouco usual e nos pegou de surpresa.

O Fed se prepara para a sucessão de seu presidente. Essa decisão de quarta passada colocou mais pressão no nome da Janet Yellen?
Não acho que a decisão tenha alguma pressão. Obviamente, vimos a Casa Branca tentando fazer avançar a candidatura de Lawrence Summers [ex-secretário do Tesouro que retirou seu nome da disputa recentemente]. E parece agora que eles estão se movendo na direção de Yellen. Eu não diria de forma alguma que já é um negócio fechado, mas me parece que agora ela é a escolha mais provável.

Yellen seria a primeira mulher a chefiar o Fed...
Ela é a pessoa mais qualificada para o trabalho neste momento. E acho que é sempre bom ter diversidade quando há justificativa. E há justificativa neste caso. Eles ainda não tomaram a decisão. Não sabemos quem vai assumir o posto. Ela se destacou não como sendo uma centrista, mas mais para o lado "dovish" [mais flexível em relação à inflação]. Se ela poderá se posicionar como uma líder eficiente deste ponto de partida, será o grande desafio que vai enfrentar.

RAIO-X BRUCE KASMAN

CARGO
Economista-chefe global do banco norte-americano JPMorgan

OUTRAS FUNÇÕES
Trabalhou no banco Morgan Stanley e no Federal Reserve em Nova York

FORMAÇÃO
Ph.D em economia pela Universidade Columbia


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