Folha de S. Paulo


Novo diretor da OMC diz que tentará reabrir diálogo para salvar Doha

O novo diretor-geral da OMC (Organização Mundial do Comércio), Roberto Azevêdo, afirmou nesta terça-feira (6) que a próxima reunião ministerial da entidade vai preparar terreno para a retomada das negociações da Rodada Doha, de liberalização do comércio.

Mas baixou expectativas. As conversas, lançadas em 2001, estão congeladas há dois anos devido a divergências a respeito da abertura de mercados e a questão dos subsídios, sobretudo entre os países desenvolvidos e as economias em desenvolvimento. Em 2008, a rodada travou, e desde 2011 não houve tentativas substantivas de retomá-la.

"Não vai resolver todos os problemas [a próxima reunião], mas vai dar uma injeção de confiança e de ânimo no sistema multilateral", afirmou durante evento realizado pela Amcham-Rio (Câmara Americana de Comércio) e pela Firjan (Federação das Indústrias do Rio de Janeiro).

A 9ª Conferência Ministerial da organização vai ocorrer em Bali (Indonésia) no mês de dezembro, quando o brasileiro já estará a frente da OMC. Azevêdo assume o cargo em setembro.

"O avanço nas negociações é possível, mas vai demorar um tempo. É preciso ter diálogo, tem que sentar e negociar. Bali é importantíssimo para viabilizar o início dessa conversa."

Azevêdo promete resultados econômicos significativos na conferência da Indonésia. "Ocorrerá a sinalização de confiança de um sistema que consegue pela primeira vez entregar um resultado negociado multilateralmente nos últimos 20 anos", afirmou.

Para ele, será possível resolver algumas questões, enquanto outros assuntos mais delicados não serão concluídos no encontro de dezembro.

"Alguns temas podem chegar a um desfecho, outros podem chegar no meio do caminho e depois continuaremos avançando".

Entre os assuntos que serão debatidos estão a ampliação de facilidades do comércio entre países, com foco na questão aduaneira, segurança alimentar e subsídios a exportação. Este último foi destacado como mais difícil de avançar pelo novo diretor-geral da OMC.

EMERGENTES

Na opinião do embaixador, o problema para o avanço da rodada não ocorre pelo número de envolvidos nas conversas. Está no pilar das negociações, "onde há um impasse muito claro". Ele diz que os países emergentes passaram a ser percebidos como pares, "que tinham que negociar e contribuir em pé de igualdade com os países desenvolvidos". Para ele, isso mudou a dinâmica das negociações.

Ele afirmou também que hoje em dia nenhum país adota uma medida pública, qualquer que seja o efeito que tenha, sem que ela seja monitorada pelos membros da OMC.

"Está todo mundo olhando com lupa, sobretudo países como o Brasil, que têm um mercado atraente, uma economia pujante. Então adotou uma medida aqui, está todo mundo olhando. Nada passa debaixo do pano."

PROTECIONISMO PREOCUPANTE

O embaixador afirmou que desde 2008 houve um crescimento "moderado" do protecionismo, o que chamou de preocupante. Apesar disso, diz que a existência da OMC e as disciplinas já negociadas, especialmente na Rodada Uruguai, diminuíram o impeto protecionista. A Rodada Uruguai, que ocorreu em 1995, foi o mais abrangente pacote de liberalização comercial até hoje aprovado.

Ele citou um relatório recente da OMC sobre protecionismo. Entre as conclusões do trabalho, foi informado que entre as medidas com caráter restritivo ao comércio, introduzidas desde 2008, apenas um quinto foi retirada até hoje.

"Desde 2008, quando tivemos um estoque de medidas restritivas, 80% continua em vigor."

Apesar disso, ele ressalta que a cobertura das medidas é modesta. "Apenas 3,6% do comércio mundial sofre o impacto dessas medidas."

O novo diretor-geral da OMC afirmou ainda que o protecionismo está "mais sofisticado". "Antigamente, em momento de crise, víamos o aumento de tarifas, subsídios a importação ou medidas que evidentemente distorciam o comércio. Isso mudou um pouco".

Os mecanismos mais usados hoje são ações antidumping (mecanismo de defesa comercial que sobretaxa as importações consideradas desleais) ou de direito compensatório, segundo ele.

CÂMBIO

Azevêdo voltou a dizer que a questão do câmbio não será resolvida por meio de discussões na OMC. Ele já tinha falado sobre o tema em junho.

"É um problema sério, é claro que isso é mencionado lá [na OMC], mas a minha experiência diz que não vamos encontrar uma solução sistêmica num organismo internacional. Não vai ser na OMC", afirmou.

Para ele, isso deve ser resolvido "no âmbito de chefes de Estado".


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