Folha de S. Paulo


Recuperação das montadoras não evitou falência de Detroit

"Não deixaremos Detroit falir", dizia a primeira campanha presidencial de Barack Obama em 2008. Na verdade, não se tratava da cidade, mas sim das três grandes montadoras nascidas ali --General Motors, Ford e Chrysler.

Com um vazio do tamanho de Paris, Detroit negocia cortes
Sede da Motown, Detroit tem peso de ícone na cultura dos EUA
Análise: Derrocada de Detroit fala aos brios dos americanos

A falência da prefeitura contrasta com a recuperação das empresas ali sediadas.

Entre o fim do governo deGeorge W. Bush (2001-09) e o início do de Obama, as montadoras receberam US$ 25 bilhões (R$ 57,5 bilhões) do governo federal, que em troca obteve ações das empresas.

Foi um bom negócio.

Além de salvar uma indústria que movimenta cerca de US$ 500 bilhões, ou 3% do PIB americano, boa parte do dinheiro já foi devolvida.

O governo vendeu no ano passado as ações que detinha da Chrysler para a italiana Fiat e vai vender de volta à GM no ano que vem 300 milhões de ações de uma empresa revalorizada.

No ano passado, as montadoras registraram as maiores vendas desde 2007, que neste ano devem crescer 4%.

A recuperação da indústria automobilística contrasta com a lenta agonia de seu berço. A prefeitura de Detroit tem uma dívida estimada em US$ 20 bilhões.

Deputados republicanos já disseram que não aprovariam um resgate federal para a cidade, governada há 50 anos por prefeitos democratas, vários deles respondendo por escândalos de corrupção.

REINVENÇÃO

Há razões históricas para que a recuperação das empresas cause pouco impacto na cidade. Com a automação das linhas de montagem, o número de pessoal das três grandes encolheu. No Estado de Michigan, de 214 mil para 109 mil funcionários apenas entre 2001 e 2012.

Apenas 4% dos empregos na cidade de Detroit são na indústria automobilística.

A partir dos anos 50, várias fábricas foram transferidas para suas cidades-satélites, com terrenos e impostos mais baratos que Detroit.

As tensões raciais que sacudiram os EUA nos anos 60 contribuíram com essa cisão. Boa parte da população branca, com maior renda e mais diplomas, mudou-se para os subúrbios também.

Hoje, 80% da população da cidade é negra. Apenas 18% da população tem diploma universitário; 61% dos habitantes trabalham fora da cidade. Para a população sem carro e dependente de transporte público deficiente, isso pode significar duas horas diárias até o trabalho.

O maior sindicato de operários da indústria automobilística, a United Auto Workers, encolheu de 1,5 milhão de membros em 1950 para 390 mil no ano passado.

"Outras cidades industriais americanas passaram pelo mesmo problema quando fábricas e manufaturas foram atrás de mão de obra e espaços mais baratos", diz a urbanista Dekonti Mends-Cole, da prefeitura de Detroit, que pesquisa novas vocações para a cidade.

"Cleveland se reinventou como polo de saúde e tecnologia, assim como Pittsburgh. Detroit precisa mais do trio universidades-centros de pesquisas-investidores para se reerguer."


Endereço da página:

Links no texto: