"São Paulo é um grande manicômio. Eu não consigo entender como os milhões de pessoas que vivem aqui passam horas no carro a caminho do escritório, com tantas ferramentas tecnológicas disponíveis para trabalhar de casa."
O cenário, descrito pelo sociólogo italiano Domenico de Masi, em sabatina promovida nesta terça-feira (20) pela Folha, serviu como antiexemplo para o conceito que o tornou conhecido há mais de uma década, com o lançamento do livro "O Ócio Criativo".
Professor da universidade romana de La Sapienza, De Masi, 75, explicou o conceito: "Muitas vezes ele é mal compreendido. Ócio criativo não significa 'não fazer nada'. É aliar trabalho, estudo e lazer. Como neste momento em que estamos reunidos aqui neste auditório".
O evento, no Teatro Folha, em São Paulo, contou com a presença dos jornalistas Vera Guimarães, Cassiano Elek Machado, Érica Fraga e Morris Kachani.
A tese de De Masi é de que os trabalhadores que exercem atividades criativas (cerca de um terço do total) poderiam se tornar mais produtivos se tivessem mais tempo para se dedicar ao lazer e à família. "Dificilmente as grandes ideias surgem no ambiente de trabalho", afirma.
Marcelo Justo/Folhapress | ||
O sociólogo italiano Domenico de Masi, autor de "O Ócio Criativo", durante sabatina promovida pela Folha em São Paulo |
ÓCIO ACESSÍVEL
Questionado pela plateia se o ócio criativo seria acessível a todos os trabalhadores, incluindo os que estão em linha de montagem, ele reconheceu que não: "Esta é uma ideia elitista".
Segundo ele, a disseminação da prática do ócio criativo é prejudicada pela prevalência da cultura de dedicação excessiva ao trabalho desenvolvida nos EUA e que afetou países como o Brasil.
"Considero doentia a cultura do 'management' americano", disse. "Acredito que as pessoas passam o dia todo no escritório porque não gostam de suas famílias", ironizou o sociólogo.
Ele diz que, mesmo com o avanço tecnológico, as empresas de forma geral ainda resistem à adoção de práticas como a que chama de "teletrabalho". "Precisamos nos tornar donos da tecnologia, e não escravos dela."
De Masi reafirmou sua crença no Brasil como um dos principais celeiros do pensamento criativo no mundo. Mencionou avanços na área educacional (como a universalização do ensino fundamental), elogiou a qualidade das universidades e alguns programas específicos, como o projeto de educação em vigência em Foz do Iguaçu (PR) e a escola de balé Bolshoi em Joinville (SC).
De Masi também falou sobre a amizade com o arquiteto Oscar Niemeyer e recorreu às sua linhas curvilíneas características para exemplificar o modo de pensar brasileiro. "O francês Le Corbusier [arquiteto que morreu em 1965, aos 77 anos] pensava em linhas retas."