Folha de S. Paulo


Inédito de El Greco e tragédia grega de 24 horas de duração sacodem Espanha

Gerard Julien - 31.jul.2014/AFP
Quadro de El Greco exposto no museu do Prado, em Madri, em 2014

Desde 2013 já circulavam rumores sobre a existência de um quadro inédito de Doménikos Theotokópoulos —vulgo El Greco (1541-1614)— escondido entre as ruelas de Toledo, cidade onde o pintor se firmou como expoente do Renascimento na Espanha.

A tela foi enfim exposta na cidade pela primeira vez no dia 10, no Museo del Greco, apesar dos mistérios a seu respeito, incluindo dúvida sobre a autoria.

Intitulada "Visitação", a obra retrata o encontro da Virgem Maria com santa Isabel, antes do nascimento de seus filhos Jesus e João Batista. Elas aparecem envoltas em mantos, com as dobras e os sombreamentos típicos do pintor.

Um quadro similar de El Greco integra o acervo da fundação Dumbarton Oaks de Washington, mas a historiadora da arte María del Mar Doval, que descobriu a obra, acredita se tratar de uma cópia, ainda que feita pelo próprio pintor.

Doval afirmou à imprensa espanhola que sabia da existência do quadro havia 20 anos, mas manteve segredo em respeito à timidez da família proprietária —até hoje anônima. Os donos foram convencidos pelo museu a expor a tela, mas ainda não foi possível submetê-la a certificação de sua autoria.

24 HORAS DE SODOMA

No último dia 12, excepcionalmente, ninguém se importou que o público dormisse durante a peça. "Monte Olimpo", afinal, durou 24 horas, e os Teatros del Canal de Madrid haviam, inclusive, preparado salas especiais para a "siesta".

A concorrida montagem do belga Jan Fabre esteve na capital espanhola em uma apresentação única cujos 800 ingressos foram disputados pelos fãs e se esgotaram assim que foram postos à venda, há seis meses —um deles foi para as mãos de Pedro Almodóvar.

Fabre prometia uma catarse que, segundo os críticos presentes, de fato proporcionou. Costurando tragédias gregas como as de Édipo e de Agamemnon, o diretor manteve a atenção do público por um dia inteiro, descontados os cochilos. O espetáculo já havia passado por outras 17 cidades dois anos atrás.

A cena —esperada com ansiedade e horror— de "fisting" (introdução do punho no ânus de outra pessoa) veio 12 horas depois do início da encenação. Mas era só um instante entre tantos outros no palco marcado por sexo e sangue, segundo o jornal "El País".

Como repete o deus grego Dionísio durante toda a peça: "Todo homem precisa de um pouco de loucura".

NOVELA MACABRA

A Espanha prendeu a respiração por 497 dias para finalmente suspirar em 31 de dezembro, quando foi encontrado o corpo da jovem Diana Quer, 18, cujo sumiço havia capturado a imaginação do público local, obcecado pelo crime.

Diana passava férias com a família, residente em Madri, num vilarejo na região da Galícia, e desapareceu na madrugada de 22 de agosto. A polícia rastreou seu telefone e entrevistou 200 testemunhas –mas não a encontrou.

O caso foi solucionado quando outra jovem da região acusou um homem de tentar sequestrá-la. No interrogatório, José Enrique Abuín Gey, conhecido como "Chicle", confessou ter matado Diana e levou a polícia até o cadáver da garota.

Durante os quase 500 dias de desaparecimento, o caso monopolizou os programas matutinos de televisão, com muito sensacionalismo. Jornalistas cavoucaram detalhes como o divórcio traumático de seus pais, as doses de remédio prescritas a ambos e suas crises alimentares, levando a uma reavaliação da prática da mídia –que tratou a família Quer como os tabloides britânicos tratam a família real.

BRANCOS DE NEVE

O mau tempo tem castigado toda a Europa desde o início do ano. Na Espanha, onde a neve é incomum, temporais desencadearam um intenso debate social e político.

No último dia 6, feriado do Dia de Reis, 3.000 veículos ficaram presos na rodovia que liga Madri a Segóvia, cidade quase cem quilômetros ao norte. Foi necessária uma operação de resgate para socorrer as famílias, que ficaram 18 horas impedidas de trafegar por causa da neve.

Por quase uma semana, a imprensa discutiu a situação, buscando culpados. O governo foi criticado por não ter fechado a rodovia a tempo —e a oposição pediu a queda das autoridades responsáveis. A concessionária foi atacada por ter cobrado o pedágio mesmo quando já se sabia que os carros estavam se acumulando entre a neve.

Os meteorologistas também se tornaram alvo, por não terem previsto a crise. Mesmo as autoescolas se tornaram culpadas: afinal, deveriam ter ensinado os motoristas a instalar correntes nas rodas dos veículos durante as raras nevascas.

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DIOGO BERCITO, 29, é correspondente da Folha em Madri.


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