Folha de S. Paulo


Livro investiga rota caipira da cocaína; leia trecho e veja outras dicas culturais

EXPOSIÇÃO | RODRIGO DE CASTRO
Filho do escultor Amilcar de Castro (1920-2002), o artista plástico faz sua primeira individual no Rio. Com curadoria de Vanda Klabin, a exposição apresenta cerca de 15 pinturas inéditas. Nas obras em óleo, Rodrigo de Castro dá continuidade à pesquisa sobre cor e espaço, que desenvolve desde o início da carreira.
Um Galeria | tel. (21) 3085-3000 | a partir de ter. (9); seg. a sex., das 10h às 19h, e sáb., das 11h às 15h | grátis | até 24/6

Denise Andrade/Divulgação
Óleo sobre teal sem título de Rodrigo de Castro
Óleo sobre tela, sem título (2017), de Rodrigo de Castro

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TEATRO | QUANTOS SEGUNDOS DURA UMA NUVEM DE POEIRA
No espetáculo da Cia. Bruta de Arte, nove amigos se reencontram após dez anos. Dos diálogos repletos de lembranças surgem revelações e mágoas. Assim, a peça explora as transformações da memória.
SP Escola de Teatro | tel. (11) 3775-8600 | seg. e sáb., às 21h, e dom., às 20h | R$ 20 | até 26/6

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TEATRO | CONTÊINER CONVIDA LUBI
Luiz Fernando Marques, o Lubi, diretor do Grupo XIX de Teatro e do Teatro Kunyn, apresenta uma mostra com dez espetáculos que dirige. A temporada começa com "Aquilo que o Meu Olhar Guardou para Você", do grupo Magiluth, sobre contradições de sentimentos do homem contemporâneo, e se encerra com "Desmesura", do Teatro Kunyn, a mais recente direção de Lubi, livremente inspirada na vida do dramaturgo argentino Raúl Damonte Botana (1939-1987), o Copi.
Teatro de Contêiner Mungunzá | tel. (11) 97632-7852 | a partir de ter. (9) | R$ 5 a R$ 30| até 18/6

Alécio Cezar/Divulgação
Flores Amarelas, da Cia das Flores, com direção de Lubi
'Flores Amarelas', da Cia das Flores, com direção de Lubi

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PALESTRA | POR UMA HISTÓRIA DA ARTE
O Centro de Pesquisa e Formação do Sesc promove, a partir de quarta (10), oito palestras sobre teorias e análises da história da arte. Em cada encontro será abordado um pensador, numa lista que inclui Walter Benjamin, Rosalind Krauss e Giulio Carlo Argan.
Centro de Pesquisa e Formação do Sesc | tel. (11) 3254-5600 | quar., às 19h | R$ 18 a R$ 60 | até 28/6

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EXPOSIÇÃO | ÓPERA DO VENTO
Livros, fotografias, roupas e objetos corriqueiros são alvo de intervenções e justaposições inusitadas pelas mãos do artista Nino Cais. A mostra individual apresenta cerca de 30 desenhos, 35 intervenções –cortes, rasgos, cores– em livros, cinco objetos, um vídeo e uma instalação (com 85 suportes de partituras). As manipulações, segundo Cais, podem não apenas propor novos significados para as imagens e objetos mas também reforçar alguns de seus sentidos originais.
Casa Triângulo | tel. (11) 3167-5621) | seg. a sáb., das 10h às 19h | grátis | até 13/5

Divulgação
Nino cais sem título fotografia e faca 2017
Obra de Nino Cais, sem título (2017); fotografia e faca

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CINEMA | DOCUMENTÁRIO/FICÇÃO - INTERSECÇÕES
A mostra exibe filmes que embaralham as fronteiras entre os dois gêneros. Há exemplos dos primórdios do cinema, como "Nanook, o Esquimó" (1922), de Robert J. Flaherty, considerado o primeiro documentário da história, mas quase todo encenado a pedido do diretor. Já "24 City" (2008), do chinês Jia Zhang-ke, dramatiza a história de mulheres que trabalharam em uma fábrica, mas apresenta também depoimentos reais de homens que fizeram parte da vida dessas mulheres.
Cinusp | tel. (11) 3091-3540 | grátis | até 26/5 | cinusp.dobralab.com.br

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LANÇAMENTO | COCAÍNA: A ROTA CAIPIRA
O livro-reportagem de Allan de Abreu faz uma radiografia do mercado das drogas no Brasil, onde regiões do interior paulista e do Triângulo Mineiro se tornaram pontos estratégicos na rota entre países produtores e centros de consumo. O jornalista entrevistou policiais, juízes, traficantes e produtores de coca para abordar temas como a ascensão e a queda dos barões do pó e o drama das "mulas".
Livraria da Vila - Shopping Pátio Higienópolis | tel. (11) 3660-0230 | ter. (9), às 19h30
Record | R$ 60

Leia dois trechos do livro:

INTRODUÇÃO

Lá na planície do baixo Tietezão, onde o rio gordo e levemente azulado deixou para trás toda a sujeira da cidade grande, a cana forma um grande lençol estendido, mar sem fim, rasgado aqui e ali por cicatrizes ocre, estradas de terra a marcar a presença do homem e suas máquinas. A 300 metros do chão, Medina contemplava absorto, da cabine do seu Cessna, o lento baile das folhas finas e alongadas lambidas pelo vento, sob o sol reluzente do verão caipira.

– Vai dar tudo certo, vai dar tudo certo – repetia para si, baixinho.

O paraguaio era piloto escaldado; anos levando e trazendo fazendeiros e empresários, daqui para lá, de lá para cá. Mas experiência nenhuma apaga a tensão quando se leva, em vez de gente, 400 quilos de cloridrato de cocaína, pura, fabricada e embalada na Bolívia. Viagens de Medina com droga foram poucas, e mesmo assim sempre para as bordas de Mato Grosso do Sul, próximo à fronteira, cioso do apregoado risco de se voar em céus brasileiros, com seus vigilantes radares. Para o interior paulista, era a rota inaugural. Por isso ele não poderia deixar de notar o longo deserto verde dos canaviais paulistas, sem vivalma naquela manhã de 29 de janeiro de 2013. Nem homens, nem tratores.

Até que Medina avistou, ao longe, dois pontos alvos, brilhantes, na paisagem monocromática. Latitude e longitude exatas do pouso combinado no dia anterior. Eram eles: os encarregados de receber a preciosa carga. Medina sentiu um súbito alívio. Reduziu a rotação do motor e começou a perder altitude. Acionou o flap da asa, aprumou o avião na direção exata da estrada de chão batido, transformada em pista improvisada. Quando o trem de pouso tocou o solo, uma espessa poeira borrou de vermelho o azul do céu. O avião perdia velocidade e, mal havia parado de vez, uma das caminhonetes encostou debaixo da asa esquerda.

Medina abriu a porta larga do Cessna e olhou para os colegas. Bastou um rápido aceno, silencioso. Não havia tempo para conversa. Mas o piloto não deixou de notar que um dos homens, alto de cabelos grisalhos, portava um fuzil AK-47, arma potente e propositalmente ostensiva, perfeita para afastar qualquer ameaça à empreita. Enquanto o homem esticava os olhos em direção ao canavial, outro subia na aeronave e, com Medina, jogava os tabletes para os outros dois na carroceria da caminhonete, em movimentos rápidos. Em 10 minutos, a carga estava toda no veículo. Medina se preparava para fechar a porta do Cessna quando ouviu o primeiro disparo. E depois outro. Eram agentes da Polícia Federal, treinados para abordar aeronaves com drogas. Camuflados na cana alta, esperaram a cocaína ser depositada na caminhonete para atacar.

Medina tinha de pensar rápido, o que não é fácil em situações de pânico. Cerrou a porta, acelerou o motor do avião, que permanecera ligado – é sempre assim quando se carrega droga, para facilitar eventual fuga.

O problema é que não havia estrada suficiente à frente do Cessna para uma nova decolagem. O avião rasgou parte do espesso canavial e entalou, sufocado pelas folhas e talos. Medina só teve tempo de abrir novamente a porta da aeronave e sumir em meio à cana. Fugiu, assim como os outros quatro da equipe em solo, que revidaram os tiros dos policiais –quatro atingiram a caminhonete da PF– e fugiram a mais de cem quilômetros por hora pelas estradelas que se bifurcavam entre os talos da cana. Um helicóptero da Polícia Militar foi acionado para as buscas na região, sem sucesso.

A cocaína chegaria a São Paulo, seu destino final.

Era o dia da caça.

Desolados, os agentes da PF retornaram à pista. Além do avião semidestruído, quatro bolsas espalhadas na terra batida, onde havia R$ 1,5 milhão em notas de R$ 100. Era o pagamento pela droga, que Medina deveria levar de volta ao Paraguai.

Um dos policiais mirou o céu azul, o sol a pino. No pulso esquerdo, o relógio indicava que passava um pouco das 15 horas.

O que aconteceu naquele dia na zona rural de Igaraçu do Tietê, pequeno município no centro-oeste paulista, foi só mais um capítulo de uma novela que nunca termina. Quase todos os dias um avião abarrotado de cocaína toca o solo dos extensos canaviais da rota caipira. Com largas vantagens para o tráfico, já que raramente há policiais à espreita, no meio da cana.

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_A região formada pelo interior paulista, Triângulo Mineiro e sul goiano é nevrálgica para o narcotráfico internacional. Ponto estratégico no mapa logístico dos traficantes, caminho entre os países produtores da droga –
Colômbia, Bolívia, Peru e Paraguai – de um lado, e os grandes centros de consumo, como São Paulo e Rio de Janeiro, de outro. E não é só. No interior do estado de São Paulo, sala de visitas do tráfico, tudo parece favorecer o escoamento da cocaína para as grandes capitais e o exterior. Por terra, a grande malha rodoviária – 31,4 mil quilômetros de estradas com boa pavimentação, a maior parte sem fiscalização policial – favorece o transporte sem sobressaltos. Pelo ar, o tempo bom a maior parte do ano e o relevo plano facilitam o pouso de pequenos aviões carregados com pasta-base de cocaína. Facilidades que fizeram a região se tornar o maior entreposto brasileiro do tráfico internacional em grande escala. Tanto que o jargão policial criou, em alusão à cultura predominante na região, o apelido "rota caipira" do tráfico, que dá nome a este livro._

_A existência da rota é reflexo direto do perfil camaleônico da capital do estado mais rico do país no submundo do tráfico. Maior centro consumidor de drogas no Brasil, São Paulo é também caminho de distribuição de entorpecentes para outras regiões, como Nordeste e Rio de Janeiro. Também serve de base para a remessa, via aeroporto internacional de Guarulhos, de cocaína para o exterior, geralmente camuflada no estômago de mulas. O porto de Santos (SP), a 80 quilômetros, além dos de Paranaguá (PR), Rio de Janeiro e Vitória, completa a rota internacional, quando a droga embarca em contêineres dos grandes navios com destino à Europa.
Rápida, uma aeronave vence com facilidade os cerca de mil quilômetros de distância entre a fronteira do Brasil com Paraguai e Bolívia e o interior de São Paulo. No trajeto, quase sempre passa despercebida pelas forças de segurança, e no momento do pouso encontra um cenário perfeito: a planície das regiões de São José do Rio Preto, Ribeirão Preto e Bauru possibilita a construção de pistas improvisadas em poucas horas. A cana-de-açúcar que domina a paisagem caipira é uma aliada imprescindível – se a planta está baixa, é possível visualizar a quilômetros qualquer campana policial. Quando fica alta, perto do ponto de colheita, camufla a aeronave e aumenta a dificuldade para a polícia saber o ponto exato do pouso._

(...)

Nada no planeta proporciona um lucro tão fabuloso em tão pouco tempo como a cocaína. Uma liquidez fabulosa. Entre os países andinos e o continente europeu, o ganho do tráfico assusta. Um quilo de cloridrato de cocaína, a droga pura, é adquirido na região de Santa Cruz de la Sierra, Bolívia, a US$ 1 mil. Na fronteira com o Brasil, já dobra de preço. Em São Paulo, é negociado a US$ 8 mil. Quando chega à Europa, vale pelo menos US$ 50 mil. Uma diferença de 1.900% que se explica não pelo produto, mas pelos riscos que dezenas de homens assumiram para fazer com que o entorpecente chegasse ao seu destino final – os traficantes precisam deslocar em segredo tanto seu produto quanto seus lucros, lavados em fazendas, empresas e veículos, além de fugir constantemente da morte ou prisão. Mas, se as perdas são irrisórias comparadas ao volume movimentado, e se a prisão é um risco distante, o tráfico de drogas subverte as leis da economia, em que o lucro é proporcional aos riscos do negócio. Aplicações em fundo de investimento ou mesmo ações na bolsa de uma multinacional sólida embutem as oscilações naturais do mercado. Com a cocaína não é assim. Sempre haverá demanda sólida. Basta planejamento e sorte para escapar da polícia. O capitalismo ideal, sem risco.

TRECHO 2

A proposta era tentadora. Duas semanas de turismo pela Europa, com tudo pago: passagem aérea, hotel e alimentação. E mais US$ 3 mil em dinheiro vivo, muito mais do que o jovem Helton Luiz Polvore recebia de salário como vendedor em uma loja de roupas em um shopping de São José do Rio Preto (SP). A oferta veio de Marcelo, cliente conhecido, um tipo empertigado que surgiu na loja em uma tarde do início de setembro de 2002.

– Você só tem que levar um bagulho da Venezuela para a Holanda.

– Que bagulho? – perguntou Helton.

– Ouro em pó, dentro do casaco.

Helton acreditou. E topou encarar a aventura.

_O segundo encontro veio na semana seguinte, em uma choperia dentro do shopping. Marcelo estava acompanhado de um rapaz branco de cabelos negros e curtos, altura mediana, ombros largos.
– Esse é o Lucas. Ele vai com você._

Lucas Rafael Bega da Cunha havia recebido a mesma proposta e também aceitara a viagem. Afinal, aos 20 anos, era a chance de ganhar um bom dinheiro e ainda conhecer a Europa, um sonho acalentado havia anos que o salário na distribuidora de bebidas onde trabalhava nunca poderia comprar. No mesmo dia em que se encontrou com Marcelo, ele reuniu a mãe, o pai e a irmã no sofá da sala, na casa humilde onde moravam, na periferia de Rio Preto.

– Mãe, pai, vou trabalhar em uma pizzaria na Holanda. Fico uns três meses e depois volto.

O pai, Merquíades da Cunha, gostou do que ouviu. Era a chance de o filho melhorar de vida. A mãe e a irmã ficaram apreensivas, mas aquiesceram.

Marcelo providenciou os passaportes e as passagens aéreas para Helton e Lucas. Na manhã do dia 12 de setembro, ele foi se despedir da dupla no aeroporto de Rio Preto. Estava com Israel Domingues de Oliveira, um homem grisalho de pele morena e rosto arredondado, que se apresentava com o nome falso de Valdemar de Oliveira. Israel entregou a cada um US$ 600, para que ambos se alimentassem.

A dupla viajou de Rio Preto até Guarulhos, e de lá embarcou em um avião com destino a Caracas, onde chegaram na madrugada do dia seguinte. Ainda no aeroporto, foram recebidos por um venezuelano moreno e alto, que os levou para um hotel no centro da cidade. A estada durou quatro dias. No segundo, Helton virou-se para o venezuelano, em um portunhol improvisado:

– ¿Donde está el oro?

O homem fez cara de espanto.

– ¿Oro? Non, non. Ustedes van a llevar cocaina en el vientre.

Helton arregalou os olhos, encarou Lucas. Silêncio. Só agora tinham a dimensão exata da proposta de Marcelo. Mas não havia como recuar. O venezuelano ordenou que ambos ficassem em jejum a partir da manhã seguinte e no último dia deu a cada um uma pequena sacola de plástico.

Dentro, 75 cápsulas brancas para Lucas e setenta para Helton, cada uma com 10 gramas de cocaína pura. Entre longos engasgos e goles d'água, Lucas engoliu setenta, e Helton, cinquenta. Uma hora mais tarde já estavam no aeroporto, com destino a Amsterdã. Um homem loiro, que falava inglês, os recebeu na capital da Holanda. A comunicação foi feita em um espanhol tosco e truncado. Como em Caracas, os jovens foram levados para um hotel. Helton e Lucas comeram e tomaram altas doses de laxante, para expelir as cápsulas. Em quatro dias, Helton jogou fora todas, e retornou ao Brasil no dia 3 de outubro. Lucas, apenas dez invólucros, ainda assim com muita dificuldade. Uma cirurgia no intestino obstruía a passagem das cápsulas. Ele começou a se sentir mal e, no décimo dia, pulava na cama de tanta cólica. Foi quando chegou um jovem brasileiro, loiro, pele e olhos claros. Era Israel Dias de Oliveira, filho de Israel Domingues. Vinha da Espanha, onde sua ex-mulher estava presa por tráfico.

– Vamos para o hospital – disse Israel.

– Não, de jeito nenhum. Não quero dar desgosto pra minha mãe.

Israel não insistiu. Mas seus lábios retesados não escondiam a tensão. Ele sabia que Lucas corria sério risco de morte. E não apenas pelas cápsulas, que poderiam estourar dentro do seu intestino a qualquer momento, causando morte instantânea. Um grupo de traficantes holandeses queria abrir a barriga de Lucas de qualquer jeito para pegar as cápsulas. Israel não deixou.

A agonia de Lucas foi registrada por Israel em um diário que seria apreendido pela polícia três anos depois.

Dia 24 de setembro. "O Lucas estava mal e estávamos vendo um clipe do Metallica onde tinha uma orquestra e ele conversando me perguntou se tinha estudado a música. Eu disse que sim. Busquei o hinário e a flautinha, ele me pediu para tocar o hino 22, 'Conserva a paz' [evangélico]. Chorou muito. Toquei outros hinos e depois conversamos sobre as coisas de Deus."

Dia 26. "À noite, fomos ligar para a mãe dele e ele falou que estava bem, que não estava mentindo, e que às vezes tocava hinos. Chorou de saudade."

Dia 27. "Ele estava muito mal. [...] À tarde, me pediu para tocar hinos e eu disse que não. Que tínhamos que estar conscientes. À noite, não teve jeito, ele estava variando. Levamos para o hospital, ele não contou [que tinha droga no estômago] e [...] morreu. Me perdoa porque eu não toquei o hino e não fui até o médico e falei, pois pensei só em mim."

Lucas morreu de overdose ainda naquela noite do dia 27 de setembro de 2002, em um leito do hospital Onze Lieve Vrouwen, de Amsterdã, depois que uma das cápsulas estourou no seu intestino delgado. Fora deixado por Israel na porta do hospital, estirado no chão da recepção. Israel fugiu correndo porque temia ser preso – havia uma delegacia de polícia bem em frente ao hospital. Ele ainda voltaria a escrever sobre o rapaz na sua agenda: "Lucas, jovem, bonito, com a vida toda pela frente..."

No Brasil, o silêncio do aparelho telefônico calou fundo na alma dos Bega da Cunha. A família procurou a polícia, fez um boletim de ocorrência do sumiço de Lucas. Mas o mistério do seu paradeiro só seria solucionado em abril de 2006, quando um jornalista da TV Record procurou a Polícia Civil de Rio Preto dizendo ter recebido pelo correio uma carta anônima contendo a agenda. Um exame grafotécnico confirmou que a letra era mesmo de Israel. A Justiça encaminhou ofício à Interpol, que em abril de 2007 encaminhou fotos do corpo de um jovem que morrera de overdose naquele dia 27 de setembro de 2002 no Onze Lieve. Chamada para reconhecer as imagens, a irmã de Lucas não teve dúvidas: era ele.

Cocaína: A Rota Caipira
Allan De Abreu
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_Como estava sem documentos, Lucas foi enterrado como indigente em um cemitério de Amsterdã. A família tentou trazer o corpo do filho, mas a burocracia e o alto custo do traslado desanimaram o pai Merquíades.
– Até já pensei em juntar um dinheiro e ir para a Holanda. Só para poder tocar no túmulo do meu filho - disse em entrevista concedida a mim em julho de 2009._

Emocionado, o pai afirmou ter sonhos frequentes com Lucas:

– Ele aparece aqui em casa. Olha para mim, dá um sorriso bonito e desaparece. Acordo chorando. Sinto um vazio enorme no coração toda vez que lembro dele e de como ele morreu. É um trauma que vou carregar pelo resto da vida.


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