Folha de S. Paulo


Na aula de sedução de mulheres, aprendi sobre ansiedades masculinas

Enquanto Julien Blanc, controvertido "sedutor profissional", era proibido de entrar no Reino Unido, fazia um curso sobre como conquistar mulheres com um especialista britânico

Sórdido. Todo mundo pensa em um sedutor "treinado" como um lagarto sórdido e predatório perseguindo mulheres. A verdade é que alguns deles são assim mas muitos outros, posso afirmar, são sujeitos dolorosamente tímidos que começam a suar profusamente só de pensar em conversar com uma garota.

Quando participei de um final de semana de treinamento intensivo sobre sedução de mulheres, em Londres, tudo que eu tinha como referência era "The Game", o livro que serve de bíblia aos conquistadores. Alguns anos atrás, ele causou sensação editorial ao revelar a "comunidade da sedução" internacional. O texto oferecia extenso jargão: "Negs", comentários negativos para reduzir sutilmente a autoestima de uma mulher de modo a levá-la a buscar a aprovação do homem; "HB10", "hot babe" ou "hard body" nota 10; "F-closing", ou levar uma mulher para a cama. Mas o curso que fiz abriu meus olhos para a realidade desse ramo, que é muito menos animadora e em muitos casos bastante mais deprimente.

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O norte-americano Julien Blanc, barrado no Reino Unido e contra quem houve abaixo-assinado no Brasil
O norte-americano Julien Blanc, barrado no Reino Unido e contra quem houve abaixo-assinado no Brasil

O curso era comandado por um célebre sedutor conhecido como "Gambler" (seu nome real é Richard La Ruina). Ele escreveu um livro anos atrás intitulado "The Natural Art of Seduction" (A arte natural da sedução) –uma abordagem mais britânica, com técnicas menos agressivas do que as propostas em "The Game", mas com pretensão aos mesmos resultados. Seus métodos certamente nada têm em comum com as técnicas violentas defendidas por Julien Blanc, o sedutor profissional norte-americano que teve sua entrada no Reino Unido barrada na semana passada.

Assim, 15 alunos, dos 25 aos 35 anos, se reuniram em um bar privado no centro de Londres, fechado durante o final de semana para o evento, e estávamos todos ansiosos para sermos apresentados ao estilo de vida dos artistas da paquera. Mas rapidamente ficou claro que a classe se dividia naturalmente em dois grupos: alguns poucos aspirantes a Don Juan que afirmavam já fazer muito sexo mas acreditavam que deveriam fazer ainda mais, e um grupo muito maior de caras tímidos e muito genuínos que normalmente entram em pânico se houver uma mulher a menos de dois metros de distância.

Para eles, isso é uma forma de distúrbio de ansiedade. A maioria admitiu ser virgem. Estavam lá para aprender algumas técnicas que servissem de blindagem e permitissem que ao menos conversassem com uma mulher. Gambler demonstrou empatia para com a situação deles. "A maior parte de vocês conhece minha história", ele nos disse. "Até os 21 anos, eu era virgem, tímido e nerd. Mas depois mudei". E ele estava lá para nos mudar do mesmo jeito. La Ruina explicou que se acreditarmos ser "uma força da natureza", as mulheres "não conseguirão desgrudar de vocês". Para fazê-lo, é preciso dominar o espaço físico: manter as pernas separadas quando estamos de pé, controlar os movimentos inconscientes causados por nervosismo, e mover os braços quando dançamos.

Assim que você toma o controle do espaço, existem outros truques para conseguir mais aproximação. Você pode mostrar curiosidade pelo brinco que a mulher está usando, estender o braço para tocá-lo e perguntar: "Brinco bonito. Há alguma história por trás dele?" –porque sempre haverá uma história por trás dele, e essa abordagem basta para permitir um primeiro contato físico. "Seja ousado e presuma que ela se sente atraída por você", explicou Gambler.

Ao lado dele, havia outros instrutores, aparentemente especialistas em certos aspectos das técnicas de sedução. Um faria um seminário de 30 minutos sobre linguagem corporal, e outro sobre cantadas. "Sua cantada está nas primeiras palavras que você diz a uma mulher. Muita gente deixa isso ao acaso. Nós não", disse Gambler. Depois, pudemos testar as lições com uma equipe de modelos femininas contratadas para que praticássemos.

Também fomos ensinados a tomar decisões confiantemente em nome de um grupo, por exemplo sobre onde ir depois do bar. As mulheres adoram os líderes. Gambler nos disse para observar Don Draper, da série "Madmen", que se passa nos anos 60, se desejamos uma aula magna de dominação masculina ao velho estilo. O personagem talvez seja um modelo melhor do que ele imagina, porque Draper é uma fraude, e criou um falso personagem que lentamente desmorona.

E essa falsidade não serve apenas para pegar mulheres no bar. O setor da sedução profissional é construído sobre uma base de mitos autopropagados –ou seja, tudo é marketing. O marketing serve para impressionar mulheres, claro, mas também para impressionar caras mais jovens e desesperados que desejam ser como o personagem criado pelo artista da paquera, assistido nos vídeos que este posta online e nos DVDs que ele vende.

Isso ficou bem aparente quando o curso culminou em uma visita a um bar próximo, onde deveríamos testar "em campo" as técnicas adquiridas. Fomos encorajados a criar linhas próprias de abertura, e por isso, com meu "ala", eu me aproximei de uma garota que estava rindo em companhia da amiga.

"Oi, me dá só um segundo", eu disse –estabelecer um limite de tempo significa que ela não precisa se preocupar com você forçar demais sua companhia. "Vamos sair para dançar, você conhece algum lugar bom aqui por perto?" Terminei dançando tango com ela na rua, e consegui seu telefone.

E enquanto isso, dois dos estudantes mais confiantes estavam papeando alegremente com as mulheres que escolheram, mas a maioria dos demais alunos dolorosamente tímidos –cerca de uma dúzia deles– estava parada no bar, contemplando os colegas, e parecia incapaz de controlar o nervosismo. Era aparente que as 700 libras que eles pagaram pelo curso lhes haviam propiciado nada mais que um rombo em seus saldos bancários.

O mundo da sedução profissional é uma casa de automitificação. Os "grandes mestres da sedução" na verdade não são tudo isso, e o que os diferencia é só uma boa dose de autoconfiança e, aparentemente, tempo para abordar centenas de mulheres nos bares e tentar tirar vantagem das leis da estatística. Afinal, os vídeos que eles postam na Internet tendem a não incluir as ocasiões em que foram polidamente ignorados.

E os acólitos, os caras que gastam muito dinheiro nesse tipo de curso, estão, de sua parte, em muitos casos vivendo vicariamente por intermédio dos sedutores profissionais, porque lhes falta autoestima. Eles assistem aos seus ídolos da mesma maneira que um adolescente assiste a James Bond e espera um dia ser como ele. Mas as coisas simplesmente não funcionam assim.

Tradução de PAULO MIGLIACCI


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