Folha de S. Paulo


Leia a íntegra da entrevista de Celso Lafer sobre o pensador Norberto Bobbio

Celso Lafer, professor emérito do Instituto de Relações Internacionais da USP, fala sobre o filósofo italiano (1909-2004), tema de seu novo livro, "Norberto Bobbio: Trajetória e Obra"´ (Perspectiva, 256 págs., R$ 40 )

*

Folha - Como nasceu seu interesse pela obra de Norberto Bobbio?
Celso Lafer - O meu interesse inicial pela obra de Bobbio foi o de um professor de Direito que encontrou, na década de 1970, nas suas contribuições à Filosofia e à Teoria Geral do Direito, um caminho para lidar com os problemas concretos do Direito Positivo. Este interesse ampliou-se quando me dei conta, na década de 1980, na época da transição do regime autoritário, da importância dos seus estudos para a afirmação da democracia e dos direitos humanos como caminho de convivência coletiva. Este interesse - o de um estudioso de Teoria Política e de Relações Internacionais - viu-se complementado com o entendimento da relevância de suas reflexões sobre a situação-limite Guerra/Paz, e dos méritos do valor da paz na era das armas nucleares e, por via de consequência, das modalidades de atuação dos diversos tipos de pacifismo ativo.

Ao reunir estes ensaios, surgiu para o sr. uma nova compreensão da obra de Bobbio?
Dediquei-me, no correr dos anos, à recepção da obra de Bobbio em nosso país. Ao reunir neste livro os ensaios que resultaram deste empenho vi reconfirmada a coerência que, por meio de um método de aproximações sucessivas, caracterizam a trajetória de Bobbio. A sua obra tem como grande nota identificadora os nexos entre democracia, estado de direito e prevalência dos direitos humanos no plano interno e as possibilidades da solução pacífica de controvérsias, e da paz na ordem internacional. Estes nexos foram articulados com rigor analítico e por uma iluminadora arte combinatória de válida e consistente multidisciplinaridade.

Guerra, direitos humanos, senectude. O campo de assuntos coberto pela obra de Bobbio é amplo. O sr. diria que há algum aspecto em que a obra dele permaneça mais vigente para o entendimento do mundo hoje?
Bobbio, como professor e intelectual militante, buscou alternativas à fúria desatada dos extremos no século XX e que continuam presentes no mundo do século XXI. No exercício desta tarefa valeu-se de uma inexcedível clareza no trato de assuntos complexos. Por isso, recorrendo a um verso do grande poeta italiano Montale, apontei que, pelo exercício da razão na obra de Bobbio "tendono alla chiarità le cose oscure" (tendem à clareza as coisas obscuras). A obra de Bobbio abrange quase cinco mil títulos. É comparável, em todas as suas vertentes, a um vastíssimo laboratório de instrumentos teóricos para observar o mundo, para compreendê-lo e para avaliá-lo. Constitui, na sua abrangência, como aponta Michelangelo Bovero, uma mina inesgotável de conhecimento.


Endereço da página:

Links no texto: