Folha de S. Paulo


Tóquio pelos olhos de Murakami

Para um estrangeiro em Tóquio, Haruki Murakami talvez seja o escritor mais confortável de ler. Na sua ficção, a paisagem é familiar.

Bairros com grande presença de expatriados -Roppongi, Shibuya e Akasaka- são presenças constantes. Além disso, suas histórias são repletas de referências a escritores, músicos e filósofos ocidentais. Ele embute culturas, e isso faz o estrangeiro sentir-se integrado.

Seu novo livro, "Shikisai wo Motanai Tazaki Tsukuru to, Kare no Junrei no Toshi" (o incolor Tazaki Tsukuru e seus anos de peregrinação, em tradução livre) não é exceção. A história acontece em Tóquio, mas se transporta a Nagoia e Hamamatsu, passando pela Finlândia.

Os "Anos de Peregrinação" do título aludem à coleção de três suítes para piano "Années de Pèlerinage", do húngaro Franz Liszt. As referências ao universo ocidental prosseguem: vão dos músicos Thelonius Monk e Elvis Presley aos escritores Georges Bataille e Aldous Huxley, passando pelo filósofo iluminista Voltaire e o dramaturgo britânico Arnold Wesker.

Mas não se pode esquecer de que Murakami é um ficcionista e sua obra incorpora elementos do fantástico. Um amigo que só conhecia Tóquio através de seus livros disse-me que subestimara as diferenças culturais e as dificuldades de comunicação.

"Em '1Q84' [lançado no Brasil pela Alfaguara], tudo parecia mais fácil", dizia-me, enquanto caminhávamos para tomar o metrô na estação de Aoyama Itchome, citada diversas vezes no livro.

GPS DA LIMPEZA

A prefeitura de Chiba, na Grande Tóquio, planeja integrar usos avançados da tecnologia da informação em suas rotinas.

No momento, desenvolve, em conjunto com a Microsoft Japan, aplicativo para smartphone pelo qual a população indica, por meio de fotografia, os logradouros públicos que necessitam de limpeza ou reparos.

Com o auxílio de GPS, as imagem são transpostas para um mapa, que concentra todos os dados. A partir dessas informações, voluntários, arregimentados na sociedade civil, realizam os trabalhos necessários, sozinhos ou com a ajuda da municipalidade.

A ideia é estimular o envolvimento da população em questões administrativas da cidade. Se a experiência tiver êxito, será implementada no próximo ano fiscal e poderá mudar a relação entre o espaço urbano e seus habitantes.

BAR DO BARULHO

Dai Igarashi tem 31 anos. Nasceu surdo e é barman em Ginza, região valorizada de Tóquio. O bar em que trabalha, o Bell Sign, é frequentado majoritariamente por deficientes auditivos.
Igarashi tem uma personalidade afável e um sorriso solícito. Seu temperamento atrai os clientes. Para quem não domina a língua dos sinais (em japonês), ele guarda um pequeno quadro, no qual se comunica por escrito.

Trabalhou em uma empresa ferroviária e em uma companhia de telefones celulares. Mas não era feliz. Desincumbia-se das tarefas, mas sentia-se isolado e tinha dificuldades de comunicação no trabalho de equipe.

Considera seu emprego atual o melhor que teve. Para ele, reúne o melhor de dois mundos. Garante interação humana com os que falam por sinais, mas exige comunicação com os clientes sem deficiência auditiva, que também frequentam o bar.

ESTÉTICA JAPONESA

O contato inicial do músico David Bowie com o Japão deu-se no começo dos anos 60, por meio de Lindsay Kemp, artista performático e dançarino, seu professor em Londres. Foi ele que apresentou Bowie à música do compositor Toru Takemitsu e aos fundamentos dos teatros nô e kabuki.

Foi também por intermédio de Kemp que Bowie travou conhecimento com Kansai Yamamoto, criador dos figurinos das turnês de Ziggy Stardust (1972). O estilo andrógino de Bowie, à época, era inspirado pelos onnagata, atores de teatro kabuki especializados em papéis femininos, com quem ele aprendeu a se maquiar.

Na época, a adoção de elementos tão explícitos da cultura japonesa no figurino de uma grande estrela britânica avalizou o Japão como fonte de influência para a moda ocidental, e ajudou a difundir criadores do país no mundo.

Graças à exposição sobre Bowie atualmente em cartaz no Victoria and Albert Museum de Londres, o japonismo do inglês ganha evidência, e o cachê da estética japonesa volta a aumentar. Os japoneses, orgulhosos, agradecem.


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