Folha de S. Paulo


Crítica | Cinema

Musical 'O Rei do Show' entretém, mas peca na trilha sonora

O REI DO SHOW (The Greatest Showman) - bom
DIREÇÃO Michael Gracey
ELENCO Hugh Jackman, Michelle Williams, Zac Efron, Rebecca Ferguson
PRODUÇÃO EUA, 2017
Veja salas e horários de exibição.

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A louvação a "La La Land" inseriu novamente os musicais no dia a dia de Hollywood. Há vários filmes do gênero em produção, e um deles, bem ambicioso, chega aos cinemas neste dia de Natal. "O Rei do Show" reúne elementos para cativar o público, mas falta ousadia para criar algo realmente deslumbrante.

O filme tem conexões com dois recentes musicais de sucesso. Traz os compositores de "La La Land" (2016) e, encabeçando o elenco, o australiano Hugh Jackman, que se saiu bem em "Os Miseráveis" (2012).

Jackman mostrou um outro lado do ator marcado pelo papel de Wolverine na franquia "X-Men" ao cantar e dançar com desinibição em "Os Miseráveis". Comprovou o talento para musicais que já indicava em divertidas atuações no palco em números especiais para cerimônias de prêmios como Oscar e Globo de Ouro.

Mas "Os Miseráveis" parece um tanto antiquado, em sua concepção como musical da Broadway montado diante de câmeras. Falta fluidez e leveza para cumprir papel de diversão ligeira para cinemas de shopping. "La La Land" tem isso, ganhando certa "modernidade". Acaba se impondo como musical para a geração pós-MTV. É o musical favorito de quem não consome filmes do gênero.

"Os Miseráveis" tem cenas que evidentemente foram executadas com árdua determinação do elenco, resultado de muito ensaio e esforço coletivo. "La La Land" parece uma compilação de cenas de danças simples, dependentes do charme dos atores e não de suas habilidades técnicas.

"O Rei do Show", apesar de ainda exibir a marcação rígida e pesada dos antigos musicais, tem essa leveza e alterna coreografias quase acrobáticas com passagens mais tranquilas. Nesses momentos "suaves" é possível ver canto e dança de Michelle Williams, uma atriz sem dúvida talentosa, mas sem nem um cacoete para o musical.

Jackman interpreta P.T. Barnum (1810-1891), americano que se tornou célebre e rico ao praticamente criar o espetáculo musical moderno. Fez isso abusando de truques e fraudes. O circo de artistas "freaks" que ele montou, e é a narrativa central do filme, tinha mulher barbada, acrobatas siameses e gigante de 2,5 metros que eram totalmente falsos.

De família miserável, Barnum quer ser rico para confrontar o patrão milionário que humilha seguidamente seu pai. Depois de adulto, Barnum se casa com a filha do patrão, Charity (papel de Michelle Williams), e a leva para uma vida de pobreza.

Com talento real para o entretimento, ele erra bastante até conseguir emplacar o sucesso com seu circo. Mas mesmo o dinheiro, que o insere nos eventos das classes mais abastadas, não dá a Barnum uma acolhida entre os esnobes.

A obsessão do empresário por esse reconhecimento o leva a agenciar uma cantora sueca de ópera, vivida pela deslumbrante Rebecca Ferguson (do sci-fi "Vida"), num passo que pode comprometer seu casamento e seu circo.

As letras das canções servem como partes essenciais no roteiro, o que deixa a narrativa um tanto simplória, esquemática. É difícil para o público se envolver com a trama dramática sucessivamente interrompida pela música. E aí entra o defeito que não permite a "O Rei do Show" encantar totalmente: as músicas.

O que dizer de um musical em que o espectador deixa a sala sem cantarolar uma das canções da trilha? Benj Pasek e Justin Paul ganharam Oscar enfiando impiedosamente "City of Stars" no cérebro de todos que assistiram a "La La Land". Mas não repetem a dose em "O Rei do Show".

Por mais que Jackman esbanje simpatia e entrega no papel de Barnum, falta liga ao filme. Os nomes mais jovens do elenco são esforçados e têm raízes no musical. Zac Efron despontou em "High School Musical", hit da Disney, e Zendaya, outra cria da Disney, tem várias participações em videoclipes de estrelas como Beyoncé e Taylor Swift.

Michael Gracey faz sua estreia na direção, trazendo no currículo trabalhos como diretor assistente responsável por inserir efeitos especiais nos filmes. Essa bagagem técnica se reflete em ótimas fusões de cenas cotidianas dos personagens com sequências delirantes.

Mesmo assim, o filme deixa a impressão de que poderia ser espetacular nas mãos de um diretor que arriscasse mais. Talvez Baz Luhrmann, o homem por trás dos impactantes "Romeu + Julieta" e "Moulin Rouge". Gracey sabe o que faz, mas é comportado demais. Um pouco mais de ousadia poderia colocar "O Rei do Show" acima da média.

O Rei do Show


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