Folha de S. Paulo


Documentário mostra acampamento de rock só para garotas

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Cena do documentário 'Todas as Meninas Reunidas, Vamos Lá!
Cena do documentário 'Todas as Meninas Reunidas, Vamos Lá!'

"A música nos uniu/Fortaleceu as amizades/Mais rock, por favor", ecoam as vozes no acampamento.

Não se trata, porém, de um acampamento de férias qualquer. No Girls Rock Camp, o público-alvo é só de meninas, de 7 a 17 anos, que, em uma semana, exercitam suas habilidades musicais —mas também a sororidade e a compreensão feminina.

O modelo que se instalou em Sorocaba, interior de São Paulo, em 2013, foi criado em 2001 em Portland, noroeste dos EUA, e tem hoje cerca de cem sedes pelo mundo —no Brasil, além da unidade paulista, há outras duas, em Curitiba e Porto Alegre.

A brasileira Carol Fernandes trabalhou por sete anos no acampamento de Montréal. Ela, que hoje é ligada ao Girls Rock Camp no Brasil, é também a produtora e diretora do documentário "Todas as Meninas Reunidas, Vamos Lá!".

O filme, que dá um gostinho da experiência que mistura rock, punk e feminismo, começou a ser tocado como uma produção de um curta que deveria ter cerca de 15 minutos de duração.

Uma parceria com a distribuidora Paris Filmes, porém, levou o projeto a se tornar um longa-metragem.

Ligada ao meio musical desde a adolescência e fã de bandas punk como Bikini Kill, Fernandes afirma que a evolução das roqueiras mirins durante a semana do acampamento é notável.

"Aquelas que são mais tímidas ou têm problemas de autoestima chegam no fim da semana mais desinibidas e com vontade de subir no palco", diz ela.

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Cena do documentário
Cena do documentário "Todas as Meninas Reunidas, Vamos Lá!". Direção: Carol Fernandes.

SÓ PARA MENINAS

"Eu aprendi que não é só menino que pode tocar rock, as mulheres podem fazer o que quiserem", diz uma das acampantes durante o longa.

Quando alguém quer saber de Fernandes por que a experiência não inclui meninos -o que, diz ela, acontece com certa frequência- a resposta que ouve é: "Tenho preguiça dessa pergunta".

"Os homens já têm muitos privilégios. Aqui, as meninas têm um ambiente sem competição e não são comparadas a todo momento", explica a idealizadora do filme.

Durante a semana que passam no acampamento, as meninas montam uma banda e produzem músicas. Ao final, elas fazem apresentações.

Além das aulas musicais, elas também têm oficinas de produção, de artes, de defesa pessoal e até de ioga.

Para Fernandes, o acampamento propicia uma introdução "natural" ao feminismo. "Ninguém chega e fala: 'hoje vamos falar de feminismo'."

"O comportamento já vira outro porque não tem essa coisa da expectativa de gênero, dos papéis que você tem que desenvolver na sociedade quando se está integrado em grupos mistos", explica Fernandes.

Para a diretora, os ensinamentos da experiência também tocam as monitoras voluntárias, que não tiveram a mesma chance que as jovens acampantes e foram socializadas "para viver numa sociedade machista".

"Estar em um lugar só para mulheres, de fortalecimento, sem essa contextualização no mundo, é uma experiência transformadora."

FEMINISMO CAPITALISTA

Fernandes pondera sobre a presença crescente do feminismo como tema do debate contemporâneo recente.

Para ela, a aparição maior na mídia alavanca o uso do feminismo por marcas, em frases de efeitos e slogans, num mecanismo de autopromoção.

Por exemplo, segundo Fernandes, quando uma grande loja vende uma camiseta com escritos feministas "é claro que, dentro dessa mensagem, existe um vazio enorme".

Na opinião dela, porém, é preferível que o foco dessas marcas seja o feminismo, mesmo se o propósito final for o lucro, do que temas que possam oprimir mulheres.

"É sempre bom falar de feminismo, usar essa palavra. Principalmente para as pessoas que vão ter um acesso ao feminismo da forma superficial que a gente vê toda hora."

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TODAS AS MENINAS REUNIDAS, VAMOS LÁ! (regular)
DIREÇÃO Carol Fernandes
PRODUÇÃO Brasil, 2017, livre
QUANDO em cartaz, veja salas e horários de exibição


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