Folha de S. Paulo


Crítica

Novo filme resgata grandiosidade e recicla mitologias de 'Star Wars'

STAR WARS: OS ÚLTIMOS JEDI (ótimo)
(Star Wars: The Last Jedi)
DIREÇÃO Rian Johnson
ELENCO Daisy Ridley, Adam Driver, Mark Hamill, Carrie Fischer, John Boyega
PRODUÇÃO EUA, 2017, 12 anos
Veja salas e horários de exibição.

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Quarenta anos depois de George Lucas ter, com o primeiro "Guerra nas Estrelas", "reinventado" um molde de filmes de que Hollywood depende cada vez mais para dominar o mundo, a saga "Star Wars" precisa enfrentar uma questão: como se manter à frente dessa concorrência tão pesada?

"Os Últimos Jedi" busca solucionar o desafio com um arsenal de recursos que acompanha a saga desde as origens, que a define e a torna inconfundível para milhões de fãs.

A reciclagem de temas, tipos, valores, referências e ações é uma das chaves de seu culto, junto, claro, da eficiência de marketing da Lucasfilm na manutenção do fenômeno.

Tal como "O Despertar da Força" (2015), o longa que chega às salas nesta quinta (14) se baseia numa lógica de "relaunch", de reinicialização da própria mitologia para brilhar com luz própria na galáxia blockbuster, ocupada por objetos muito parecidos.

Não era difícil reconhecer no filme de 2015 linhas narrativas, uma protagonista que emulava o do original de 1977 e combates, duelos e manobras espetaculares que recuperavam o espírito da primeira trilogia, depois da retomada morna sob a condução de George Lucas nos episódios 1, 2 e 3.

Agora, a reciclagem se expande a outras camadas, de modo a nunca se confundir com repetição. O confronto entre os dois lados da Força, por exemplo, é reinventado, deixando de lado a mera oposição entre o bem e o mal.

Afinal, "mocinhos e bandidos são palavras inventadas", como DJ (Benicio Del Toro) deixa claro pouco antes da sequência mais monumental do filme. É como se a saga olhasse no espelho para identificar o que nela se preservou e o que é preciso recuperar.

Luke Skywalker, o velho herói, e Kylo Ren, o novo vilão, carregam em suas faces essa dupla natureza. A feição sobrecarregada de Mark Hamill mostra que até os mocinhos perdem o viço. A cicatriz no rosto de Adam Driver acentua mais que o lado mau do personagem, indica também um trauma original, uma ferida que abre dúvidas, lança sombras sobre a narrativa.

Em vez de "uma nova esperança" agora o sentimento predominante é negativo, de derrota e de esgotamento das forças.

Outro recurso que o novo longa reutiliza é o princípio de continuidade tão comum na ficção seriada contemporânea. O "gancho" da reaparição de Luke Skywalker na cena final do filme anterior funciona aqui como a primeira isca, e boa parte da trama se concentra nos desdobramentos do encontro de Rey e Luke.

Enquanto "O Despertar da Força" tinha de se concentrar na apresentação de novos personagens e na reintrodução dos antigos, "O Último Jedi" ganha espaço para o desenvolvimento daqueles, que permanecem como ecos, como desdobramentos das figuras arcaicas que surgiram a partir do filme de 1977.

Numa cena fundamental, Rey encontra-se face a espelhos que se replicam ao infinito, uma imagem que representa tanto a duplicidade que ela enfrenta como a estrutura da própria saga, com seus laços rompidos entre pais e filhos e os dois lados, opostos, mas complementares, da Força.

Sem deixar de lado a alta voltagem das cenas de ação, "Os Últimos Jedi" é, ao lado de "O Império Contra-Ataca" (1980), o filme mais ambicioso da saga, uma demonstração de que o máximo de ilusão e de entretenimento de um blockbuster não existe apenas para aniquilar neurônios.

Assista ao trailer de 'Star Wars: Os Últimos Jedi'

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