O artista plástico Gontran Guanaes Netto, 84, morreu neste sábado, em Paris, na França.
A informação foi confirmada à Folha pelo sobrinho dele, Mauro Guanaes, segundo quem o pintor não resistiu a complicações decorrentes de dois AVCs (Acidente Vascular Cerebral) que sofreu no ano passado e que o deixaram internado até setembro.
Guanaes Netto era conhecido no Brasil e no mundo pela forte conexão entre produção artística e postura política.
Seus trabalhos retratam figuras populares e denunciam a opressão e os arbítrios do regime ditatorial no Brasil e de governos semelhantes na América do Sul.
Segundo o sobrinho, o artista era contrário a manifestações artísticas que visasse o capital e, por isso, não expunha em galerias.
Ele assina painéis expostos nas estações Marechal Deodoro e Corinthians-Itaquera do metrô paulistano, em São Paulo. Também há obras dele expostas no acervo do MAM-SP (Museu de Arte Moderna de São Paulo).
ARTE = POLÍTICA
Nascido em Vera Cruz, no interior de São Paulo, Gontran teve sua formação como artista e como militante na capital paulista, nas décadas de 1950 e 1960, época marcada por grande agitação cultural e produção ideológica.
Vinculou-se ao Partido Comunista Brasileiro, atuando junto às células da legenda no bairro do Ipiranga, e, depois, no Teatro de Arena, ao lado de atores como Gianfrancesco Guarnieri (1934-2006), Juca de Oliveira e Paulo José.
Nas artes, vinculou-se à chamada "pintura social figurativa", trabalhando ou estudando com artistas como Di Cavalcanti (1897-1976), Tarsila do Amaral (1886-1973), Cândido Portinari (1903-1962) e Livio Abramo (1903-1993).
O artista deixou o Brasil em novembro de 1969, ameaçado pelo recrudescimento da ditadura militar —ele já havia sido preso duas vezes graças à defesa do socialismo em sua produção e, em particular, à atuação junto ao PCB.
Desde então e até 1985, quando retornou a um Brasil em processo de redemocratização, ele viveu em Paris, na França.
Lá, Guanaes Netto tornou-se professor da Universidade de Paris e da Universidade de Nantes, e estabeleceu conexões com a cena artística local, especialmente com nomes como o argentino Julio Le Parc, o francês Ernest Pignon-Ernest e o uruguaio Jose Gamarra.
Após retornar ao Brasil, em 1985, o artista dedicou-se a trabalhos murais, especialmente a duas obras em grandes proporções na estação Marechal Deodoro e na estação Corinthians-Itaquera do Metrô paulistano.
Guanaes Netto voltaria a viver em Paris em meados dos anos 1990.
Na concepção dele, reforçada pelo contato com as vanguardas europeias ao final da década de 1960, a arte era desvinculada dos interesses mercadológicos e a produção artística era um instrumento para a luta entre trabalhadores e classes dominantes, no contexto da Guerra Fria.
Daí a crítica identificar uma produção rarefeita até 1964 e um reconhecimento menor como artista do que como militante.
O artista deixa quatro filhos e familiares. Segundo seu sobrinho, o corpo do artista será cremado na Europa e, posteriormente, as cinzas serão levadas ao jazigo da família no cemitério da Consolação em São Paulo.