Folha de S. Paulo


Crítica

Biografia em HQ de Nunsky soma à lenda sobre condessa assassina

Divulgação
Ilustração no livro 'Erzsébet', do quadrinista português Nunsky, que sai pela Zarabatana
Ilustração no livro 'Erzsébet', do quadrinista português Nunsky, que sai pela Zarabatana

ERZSÉBET (bom)
AUTOR Nunsky
EDITORA Zarabatana
QUANTO R$ 40,00 (144 págs.)

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A condessa Erzsébet Báthory (1560-1614) é inspiração perene da literatura e do cinema de terror. Nascida e casada em famílias da nobreza húngara, sabe-se que ela matou pelo menos 300 garotas da sua região, tendo serviçais de seu castelo como cúmplices. Em depoimentos de tribunais da época, houve quem dissesse que o número de vítimas teria superado 600.

Por que ela matava? Por conta de alguma psicopatia que hoje a encaixaria na classe dos serial killers. O "Guinness" a chama de maior assassina da história. Nas lendas que se criaram em torno da figura, do século 17 em diante, Erzsébet gostava de banhar-se no sangue das virgens para preservar a juventude.

São as histórias dos banhos de sangue, sobretudo, que fazem a condessa ser citada até hoje, como no filme "O Albergue 2" ou no seriado "American Horror Story".

É a resposta feminina ao conde Drácula —inspirado, por sua vez, em um truculento militar do século 15 no país que viria a ser a Romênia, vizinho à Hungria de Erzsébet.

Como a maioria dos livros e filmes, a biografia em quadrinhos da condessa apoia-se nas lendas —e talvez adicione alguns pontos a elas.

"Erzsébet", do português Nunsky, é um relato soturno, diabólico e, em grande parte, mudo sobre as atrocidades cometidas pela nobre húngara.

O traço de Nunsky, em preto e branco, faz meio termo entre o estilo das iluminuras medievais e referências contemporâneas do gênero.

A principal destas é Charles Burns, americano conhecido por HQs de terror ("Black Hole") que se especializou em colocar sombras tenebrosas —e sexo— sobre traços estilizados ao nível Tintim.

As opções narrativas também são determinantes. Não há narração em recordatórios, de forma que o leitor é conduzido na trama pelas imagens. Embora a maioria das cenas seja realista, há pequenos desvios fantasiosos, com retratos do demônio ou de dragões —que acontecem repentinos, sem explicação lógica, como flashes abstratos no cinema de horror.

Colabora também o fato de a maioria das cenas se passar em florestas e em um castelo de pedra onde nunca para de chover ou nevar. A ligação entre atrocidade e prazer sexual, como manda o gênero, também é explorada.

A aparente contribuição que Nunsky dá aos mitos da condessa assassina está (ao menos) em cena que envolve uma espécie de dama de ferro —instrumento de tortura que surgiu à época, na Europa.

Na HQ, a dama lembra um robô com formas femininas que tem cavidades no lugar dos seios, cheias de lâminas, que engolem os seios da vítima para um abraço fatal.

Fidedigna ou não, fantasiosa ou não, em cenas como esta a biografia busca retratar precisamente a crueza da condessa assassina.


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