Folha de S. Paulo


crítica

Filme-performance 'Manifesto' reforça as alternativas da arte

MANIFESTO (muito bom)
DIREÇÃO Julian Rosefeldt
PRODUÇÃO Alemanha/Austrália, 2015, 12 anos
ELENCO Cate Blanchett, Erika Bauer, Ruby Bustamante
QUANDO estreia nesta quinta (2)
Veja salas e horários de exibição

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O que a arte é ou não é?

Encontrar respostas para esta questão deveria vir antes de saber se uma obra é arte ou não. Ainda mais quando um cafuné no cão pode ser considerado zoofilia ou limpar o bumbum do bebê começa a ser confundido com pedofilia.

"Manifesto" traz não uma, mas 13 alternativas para o problema, um modo saudável de demonstrar que não existe preto ou branco.

O filme transpõe uma instalação do artista alemão Julian Rosefeldt, exibida em Melbourne, em Berlim e em Nova York em 2015. A obra reunia 13 vídeos protagonizados pela atriz Cate Blanchett e apresentados simultaneamente num mesmo espaço expositivo.

Na adaptação para o cinema, o artista ajustou o dispositivo para uma ordem alternada, com trechos de uma sequência intercalando-se a outra, mantendo assim o princípio de simultaneidade, essencial ao projeto.

As múltiplas personagens que Blanchett interpreta representam a pluralização da arte, sobretudo a partir do modernismo, quando proliferaram manifestos em defesa das propostas estéticas mal compreendidas em seu tempo.

As falas recuperam ideais, assim como palavras de ordem e proclamações desses textos, que forjavam conceitos no fogo da retórica.

No entanto, o filme não se confunde com uma palestra ou uma leitura, graças à exuberância de Blanchett. A atriz muda a mensagem como troca de figurino e de personagem, reafirmando a riqueza do termo "performance".

Não se trata de uma narrativa convencional, com ação progressiva, mas de instantes fulgurantes, que se cruzam, reafirmam-se e entram em choque.

O efeito se intensifica à medida que as personagens invertem expectativas, como o discurso dadaísta em meio a um enterro, ou a mãe ultraconservadora que troca a prece por slogans subversivos da pop art.

Ao mesmo tempo que reafirma a potência corrosiva da arte, "Manifesto" não a encara de um ângulo só. Fenômenos conhecidos, como a pose, o esnobismo e o excesso de interpretação, aparecem quando Blanchett encarna a roqueira que cospe nadas ou quando dá contornos à apropriação estéril da colecionadora.

Em meio a tantas opções, "Manifesto" não corre o risco de esvaziar o ato criativo?

Ao contrário, pois a acumulação dos discursos demonstra que não existem somente as alternativas "tudo" e "nada" e sim muitas, abertas a cada humano exposto ao risco ou cansado de ter certezas.

Assista ao trailer de 'Manifesto'

Assista ao trailer de 'Manifesto'


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