Folha de S. Paulo


Parecia 'Gangues de Nova York', diz diretor sobre conflito em universidade

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O filósofo conservador Olavo de Carvalho e o diretor Josias Teófilo nos bastidores de 'O Jardim das Aflições'
O filósofo Olavo de Carvalho e o diretor Josias Teófilo nos bastidores de 'O Jardim das Aflições'

Parecia "Gangues de Nova York", filme de Martin Scorsese, brinca o cineasta Josias Teófilo ao descrever o confronto entre um grupo de esquerda e outro de direita, na Universidade Federal de Pernambuco, no Recife.

A briga ocorreu na sexta (27), com a realização simultânea de eventos de naturezas ideológicas opostas.

Em oposição à exibição do documentário "O Jardim das Aflições", dirigido por Teófilo, sobre o ideólogo conservador Olavo de Carvalho, o Partido da Causa Operária e o grupo militante Comitê de Luta Contra o Golpe decidiram exibir "Porque Lutamos! Resistência à Ditadura Militar", da diretora Fernanda Ikedo.

"O Jardim das Aflições" foi exibido num auditório e "Porque Lutamos", ao ar livre. Os eventos estavam separados por um corredor, onde se deu o embate. Um espectador do filme sobre Carvalho, que vestia uma camisa com a foto do deputado e presidenciável Jair Bolsonaro (PSC-RJ), foi ferido na cabeça. Segundo Teófilo, o público foi xingado de fascista antes da exibição.

Não há informações oficiais sobre o número de feridos. O Comitê de Luta Contra o Golpe nega ter incitado ataques, boicotes ou qualquer tipo de censura. "Achamos uma afronta colocar um filme de uma pessoa da extrema-direita dentro da universidade", afirmou Victor Assis, militante do PCO.

O mesmo filme já havia sofrido boicote no CinePE, mostra pernambucana de cinema. Um grupo de diretores se recusou a participar da mostra ao lado das obras "Jardim das Aflições" e "Real - O Plano por Trás da História" (GF).

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Folha - O sr. se sentiu censurado pelos ativistas que protestaram contra seu filme?
Josias Teófilo - Não me senti censurado. O que aconteceu foram as hostilidades. Censura é outra coisa, quando impedem você de falar.

Sentiu-se tolhido?
Para chegar ao auditório, você tem que passar por um corredor. Na entrada dele, do lado de fora, eles colocaram o evento deles. Todas as pessoas que queriam entrar foram hostilizadas, chamadas de fascistas. Como a UFPE deixou isso acontecer?

A sessão do filme foi prejudicada de alguma maneira?
Ficaram no corredor gritando palavras de ordem, chamando de fascista, de nazista. As pessoas começaram a sair e se aglomerar ali para que não viessem até a porta. Em um momento, havia cinco pessoas com camiseta do Bolsonaro e uns 50 do outro lado. E eles começaram a dar porrada. Ficamos encurralados, e percebi que a coisa podia ficar feia porque o auditório é totalmente fechado.

O grupo ligado à esquerda afirma que skinheads provocaram antes...
Houve provocação dos dois lados. Mas por quê? Porque eles estavam no caminho, né? Por que não fizeram [o evento] em outro prédio, por que não fizeram em outra hora? Se eram skinheads, neonazistas? Como concluem isso? Tinha gente careca, tinha lutador. Eles foram lá proteger a gente, entendeu?

Quem é o homem que aparece com a cabeça sangrando em uma foto?
Não sei, ele estava com a camiseta do [Jair] Bolsonaro. Ele estava junto com o baixinho ninja que bateu em todo mundo. Eu saí fugido da federal, quando vi o cara sangrando, pensei, "Sou o diretor do filme, então corro risco real". Aí eu deixei o carro e peguei um táxi, porque aquilo virou uma praça de guerra.

Para o sr., houve autoritarismo de ambos os lados?
Os que estavam do nosso lado agiram de maneira muito nobre, porque eles realmente se arriscaram para defender a gente. A gente não sabe o que aconteceria se essas pessoas tivessem entrado no auditório. Ia ser um verdadeiro caos. A provocação existiu dos dois lados. Se ninguém tivesse provocado ninguém, inclusive aparecendo com camisa do Bolsonaro, isso não teria acontecido.

Na cabeça do pessoal de esquerda, isso é uma afronta, é uma coisa terrível. Mas não posso proibir as pessoas de se expressarem como elas querem. A única coisa que eu pedi no Facebook foi para que não envolvessem política no debate. E nem na organização. Ninguém da organização deveria ir com a camisa de um candidato ou envolver política num evento de caráter cultural, era um debate sobre filosofia.


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