Folha de S. Paulo


Defensor de LGBTs e mulheres, grupo libanês faz shows em São Paulo

Tarek Moukaddem/Divulgação
Hamed Sinno, Haig Papazian (de pé), Carl Gerges, Ibrahim Badr e Firas Abou Fakher, da banda libanesa Mashrou' Leila
Hamed Sinno, Haig Papazian (de pé), Carl Gerges, Ibrahim Badr e Firas Abou Fakher, da banda Mashrou' Leila

A banda libanesa Mashrou' Leila traz nesta semana a São Paulo uma criatura sensual, intelectual, melancólica e de batida eletrônica a que chama de Ibn El Leil: o "filho da noite", em árabe, nome dado a seu quarto álbum.

A formação, um dos grandes fenômenos musicais do Oriente Médio e um dos raros a ter sucesso fora dessa região, toca sexta (27) e sábado (28) no Sesc Pompeia.

A apresentação em São Paulo coincide com um de seus melhores momentos desde os primeiros acordes cifrados no subterrâneo de Beirute, há nove anos. Mas a banda –Mashrou' Leila significa "programa noturno" em árabe– também enfrenta hoje seus maiores desafios.

Algumas de suas canções descrevem romances homossexuais. Parte de seus membros, abertamente gays, defendem os direitos da comunidade LGBT e das mulheres no Oriente Médio, pelo que sofrem censura e boicote.

Eles foram banidos na Jordânia e, depois de um show no Cairo, em setembro, ao menos 57 pessoas foram detidas pelas autoridades egípcias sob a suspeita de homossexualidade –o que não é crime ali, mas é punido.

"Sendo honesto, é difícil perdermos tantos mercados", afirma à Folha o vocalista Hamed Sinno, 29, sobre quem o clichê é inescapável: de olhar misterioso e um farto bigode, se parece com Freddie Mercury (1946-1991).

"É complicado fazer música independente no Oriente Médio enquanto as portas se fecham", afirma o pai da criatura noturna, que já estampou a capa da clássica revista gay francesa "Têtu".

A banda discute "o tempo todo" se deve começar a cantar em inglês. Hoje todas as suas canções estão no dialeto libanês do árabe, e é razoável supor que a maioria de seus fãs internacionais balance ao som de músicas que nem sempre entendem.

"Seria de fato mais eficiente para explorar novos mercados, em especial se a situação no Oriente Médio continuar assim", diz Sinno.

Ouça ao álbum 'Mashrou' Leila'

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PALAVRA

O Mashrou' Leila foi formado por amigos em 2008, nos corredores da prestigiosa Universidade Americana de Beirute. Mas, mesmo fora da escola, a banda mantém alguma perspectiva intelectual.

A canção "Kalam" ("palavra"), por exemplo, narra a sedução dentro de um clube noturno enquanto discute as limitações da linguagem. O cantor troca os gêneros das palavras e sujeitos, entre masculino e feminino, como se não se importasse.

"Escreveram as fronteiras do país no meu corpo, no seu corpo", diz a letra. "Onde está a vergonha? Sinta aquilo que você sente."

Há também uma canção que debate a ideia de masculinidade e outra sobre o conceito de mito, a partir da obra do americano Joseph Campbell (1904-1987).

"Somos todos um pouco nerds", diz Sinno, que cita estruturalismo e pós-colonialismo na conversa com a Folha. Ele foi convidado neste semestre para dar um curso sobre música e política na Universidade de Nova York.

A reportagem lhe pergunta se não está cansado de tantas entrevistas sobre direitos dos homossexuais e a política no Oriente Médio.

Falar sobre a opressão de gays e das mulheres, no entanto, não o incomoda. "É bom estar nessa posição em que podemos mudar as coisas", afirma. "A música é uma coisa bastante política, e é difícil separar, porque a arte diz às pessoas o que elas são de verdade."

Por outro lado, "às vezes esperam que a gente comente a política no mundo árabe, nos fazendo perguntas que exigiriam três doutorados para responder", brinca o vocalista. "Fica um pouco absurdo", completa.

"O que fazemos é cantar sobre as pessoas serem capazes de ser o que querem ser", afirma Sinno.

O que elas querem ser, porém, às vezes não corresponde aos projetos dos governos no Oriente Médio.

O Mashrou' Leila já teve problemas em diversos países da região –e, apesar da preocupação quanto aos mercados, Sinno se orgulha.

"Há algo de empoderamento em não estarmos ajustados a esse discurso repressivo", explica. "Não fazemos nada no palco além de nos expressar. É fascinante que isso seja considerado perigoso."

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MASHROU' LEILA
QUANDO sex. (27) e sáb. (28), às 21h30
ONDE Sesc Pompeia, r. Clélia, 93, tel. (11) 3871-7700
QUANTO R$ 12 a R$ 40
CLASSIFICAÇÃO 18 anos


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