Folha de S. Paulo


Jocy de Oliveira estreia ópera multimídia no Sesc 24 de Maio

Dalton Valerio
Cena da ópera 'Liquid Voices - A História de Mathilda Segalescu
Cena da ópera 'Liquid Voices - A História de Mathilda Segalescu'

Aos 81 anos e em pleno vigor criativo, Jocy de Oliveira, pioneira da música eletrônica no Brasil, estreia nesta sexta (20) sua mais nova ópera.

"Liquid Voices - A História de Mathilda Segalescu" mistura referências pessoais, criação ficcional e fatos históricos para construir um espetáculo que a artista chama de "ópera multimídia", uma vez que envolve música, teatro, vídeo e instalação.

"A verdade é que vivemos numa sociedade visual, muito mais do que auditiva; a acuidade da escuta está se perdendo. Então é uma forma de trazer ao público um impacto maior", revela.

O formato é recorrente a Jocy (essa é sua nona ópera) desde que a artista, paulatinamente, foi se afastando de uma bem-sucedida carreira de intérprete ao piano para se dedicar à composição.

O instrumento, aliás, talvez seja a mais evidente referência autobiográfica da nova obra. "Eu nasci num piano, com três anos de idade já tocava. Fiquei muitos anos nesse, digamos, 'aprisionamento' de um instrumento", reflete.

"Há uns 20 anos, a composição, que era um elemento forte na minha vida desde os anos 1960, ganhou mais espaço. Então fui me desligando do piano, mas nunca consegui completamente. Cheguei a fazer uma videoinstalação na qual atirava um piano ao mar. Esse piano foi o princípio dessa ópera."

A partir de elementos factuais, "Liquid Voices" faz uma narrativa ficcional "que envolve o ouvinte numa realidade fantástica".

Mathilda Segalescu, a personagem título, é uma ficção. "Imaginei uma diva, cantora e grande pianista, que andou pelo mundo e faz uma trágica viagem de navio. Quis situar num evento da Segunda Guerra e encontrei o Struma, que zarpou clandestinamente da Romênia com destino à Palestina, em 1941", explica.

"Imagino uma mulher judia, num navio superlotado com quase 800 refugiados, e que naufragou. A história desse navio se mescla à história ficcional de Matilde". Jocy diz que imaginou essa mulher cantando todas as noites para amenizar o sofrimento dos passageiros.

Impossível pensar que questões tão prementes da atualidade estejam no enredo por acaso. "A ópera trata também das repetições históricas", afirma Jocy.

Deve-se destacar ainda a parceria com a soprano Gabriela Geluda há mais de 20 anos. Ela encarna Mathilda, e contracena com o tenor Luciano Botelho. "Sempre abordei a questão da mulher, mas sem ser panfletária", diz Jocy. "Conheço bem a discriminação que existe quanto a certas profissões, como a de compositora. Isso sempre me tocou."

DVD

Simultaneamente à ópera, Jocy de Oliveira lança o DVD "Meu Encontro com Luciano Berio" (R$ 30). Trata-se de um retrato de sua colaboração com Luciano Berio (1925-2003), importante representante da música eletrônica do século 20.

Fotografias e áudios, junto com um emocionante depoimento de Fernanda Montenegro, protagonista do espetáculo à época, fazem do lançamento um registro histórico.

*

LIQUID VOICES - A HISTÓRIA DE MATHILDA SEGALESCU
QUANDO sex. (20) e sáb. (21), às 21h, e dom. (22), às 18h
ONDE Sesc 24 de Maio, r. 24 de Maio, 109, tel. 3350-6300
QUANTO de R$ 12 a R$ 40, livre


Endereço da página: