Folha de S. Paulo


CRÍTICA

Recurso ao misticismo enfraquece longa brasileiro 'A Menina Índigo'

Divulgação
Letícia Braga em cena do filme brasileiro 'Menina Índigo'
Letícia Braga em cena do filme brasileiro 'Menina Índigo'

A MENINA ÍNDIGO (ruim)
DIREÇÃO Wagner de Assis
ELENCO Letícia Braga, Fernanda Machado e Murilo Rosa
PRODUÇÃO Brasil, 2016, livre
QUANDO estreia nesta quinta (12)
Veja salas e horários de exibição

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A primeira pergunta que "A Menina Índigo" suscita é: a que público se dirige esse filme? De início tratamos com Sofia, uma filha de pais separados que se tranca numa sala de sua escola, pinta à maneira de Jackson Pollock e, de resto, avisa a quem estiver por perto que não quer ir à escola.

Talvez ela seja um fenômeno, uma menina-prodígio. Mas as pedagogas da escola estão é horrorizadas com aquilo. Segue-se uma discussão entre pai e mãe, com "a minha filha" sendo a expressão mais frequente. A ênfase é no "minha". Parece que a discussão gira em torno de uma propriedade privada. Ou da propriedade privada.

Dito isso, ninguém se espantará que Sofia apareça a nós como uma chata, mimada e tudo mais. Afinal, os pais não sabem sentir outra coisa que não uma imensa culpa em relação à filha.

Por estarem separados? Deve ser. Por que estão separados? Jamais saberemos. Só importa ao filme que Sofia quer vê-los unidos. Sofia, aliás, quer um mundo melhor.

Saberemos mais tarde que Sofia tem lá seus poderes particulares. Basta tocar nas pessoas que suas dores passam, seus males desaparecem.

Sabemos, desde então, que não se trata de um filme financiado pela indústria farmacêutica. Quando o pai leva a filha inquietante ao médico, ele receita um remedinho, dá lá um diagnóstico. Mas o remédio acaba na privada.

Não sei se já ficou óbvio, mas quem fosse fazer o inventário das deficiências desse filme, ponto por ponto, levaria dias. Fiquemos com os mais evidentes: um roteiro que não se aguenta em ponto nenhum, não cria personagens minimamente dignos de crédito; uma direção de atores constrangedora; o recurso constante à música para cobrir os muitos vazios do roteiro.

No entanto, existe algo que chama a atenção: o recurso ao místico, à hipótese da cura miraculosa (o superpoder de Sofia), que em última análise remete à existência de um Deus bom, capaz de nos resgatar de nossos infindáveis erros e dar nova chance à Terra que, garante Sofia, é um belo planeta.

Quem poderá negar o encanto de tais premissas? Deus, saúde e justiça social. É tudo o que, parece, nos falta (mais educação, ciência e cultura, claro). Sofia sabe bem disso e, aliás, para quem ainda não entendeu, lança sua mensagem em bom português (português de adulto, que é o que ela tenta falar durante o filme inteiro).

Resumamos: depois de desmoralizar o fantástico espírita ("Nosso Lar", 2010), Wagner de Assis investe no sobrenatural que habita o corpo infantil (a pureza etc.). A tarefa seria difícil ao natural: é preciso ser um Frank Capra para dar conta de tais fenômenos (não importa que existam ou não, importa sua existência cinematográfica) e não cair no ridículo.

Bem, Wagner Assis não é um Frank Capra.

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Assista ao trailer de 'A Menina Índigo'

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