Folha de S. Paulo


Após nu do MAM, políticos querem expandir regras de classificação etária

Lenise Pinheiro/Folhapress
Wagner Schwartz (nu), no espetáculo
Wagner Schwartz (nu), no espetáculo "La Bête" ("O Bicho") em Curitiba

O secretário municipal de Cultura, André Sturm, condenou os ataques sofridos pelos funcionários do MAM (Museu de Arte Moderna de São Paulo) e afirmou que é preciso haver um debate sobre a classificação indicativa.

"Os museus têm o direito de fazer todo tipo de exposições, e as pessoas também têm o direito de protestar, mas não podem impedir que as mostras aconteçam", diz.

A opinião de Sturm destoa da do prefeito, João Doria, que em vídeo se posicionou contra mostras como a do MAM e a "Queermuseu", realizada e suspensa em Porto Alegre, dizendo que "tudo tem limite".

"Ele fez uma manifestação pessoal, e eu respeito", disse o secretário. "Mas, em meses de gestão, ele nunca me fez qualquer tipo de exigência sobre a programação cultural."

O ministro da Cultura, Sérgio Sá Leitão, defendeu a expansão da classificação indicativa para as exposições.

"Deve ser feita por meio de projeto de lei e posterior regulamentação pelo Ministério da Justiça", disse ele à reportagem. "O conteúdo é apresentado previamente e enquadrado em uma das faixas previamente determinadas."

REPERCUSSÃO

Ouvidos pela Folha, artistas e especialistas divergem sobre a performance e eventual promoção da pedofilia.

"A generalização entre o contato com um artista nu e a facilitação a um eventual futuro caso de pedofilia não é garantida", afirma a psicóloga e consultora em educação Rosely Sayão. "O maior problema não está no fato, mas na repercussão dele. A menina e a mãe têm sido expostas, não vão sair imunes."

O crítico literário Rodrigo Gurgel diz que não levaria uma criança a um trabalho artístico com nudez ao vivo.

"Crianças são ingênuas, e esse tipo de performance mostra a nudez como natural. Será que são maduras para entender que aquilo é só performance e que não corresponde ao comportamento que alguém teria, por exemplo, na rua?", ele questiona.

O psicanalista Christian Dunker discorda. "Pelo que vi, a criança não estava coagida, mas curiosa. E a nudez não era erótica." Ele também não crê que, uma vez exposta a uma performance como aquela, a criança possa confundir o papel da nudez num eventual caso de abuso sexual.

"Quando se pega a imagem e se faz dela sagrada, um fetiche, se está dizendo à criança que sobre isso não se fala, que quando isso acontecer ela não deve dividir com outros."

Para a advogada Eloisa Samy, militante pelos direitos humanos, "quem errou foi o museu" e "não bastava sinalizar". "Em uma mostra, quando um homem nu permite ser tocado, a intenção é que toquem nele. Qual é a lição que se está passando às crianças?"

A atriz e diretora Mika Lins diz que manifestações contra o MAM são um "retrocesso". "Eu não exporia minha filha aos cinco anos a tocar no corpo nu de um estranho, numa exposição ou não, mas isso é outra questão. É prejudicial censurar um museu."

Para o dramaturgo Aimar Labaki, a acusação de pedofilia é uma desculpa. "A ideia [de quem protesta] é cortar dinheiro público para a cultura".

(GUILHERME GENESTRETI, GUSTAVO FIORATTI, ISABELLA MENON, MARIA LUÍSA BARSANELLI, MAURÍCIO MEIRELES, RAFAEL GREGORIO)


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