Folha de S. Paulo


Regina Duarte retoma direção teatral com brutalidade de Harold Pinter

Lenise Pinheiro/Folhapress
Página do quadrinho 'Aqui' (2014), de Richard McGuire
João Carlos (deitado), Alessandra Negrini e Igor Kowalewski em ensaio de "A Volta ao Lar"

Regina Duarte viu na brutalidade de "A Volta ao Lar", espetáculo do britânico Harold Pinter (1930-2008), um reflexo do mundo hoje.

"A peça tem muita contemporaneidade. O mundo está depauperado, levando um soco no estômago", diz ela. "É uma falta de afeto, estamos numa guerra não declarada."

É Regina quem dirige uma montagem do texto, que estreia nesta terça-feira (3) em São Paulo. A brutalidade de Pinter é representada por uma família inglesa, filha de açougueiros e órfã de mãe.

O primogênito Teddy (Mauricio Agrela) retorna ao lar após oito anos e apresenta pela primeira vez aos familiares a sua mulher, Ruth (Alessandra Negrini).

Aquela presença feminina, até então inexistente na casa, suscita reações violentas no clã masculino: o patriarca (Igor Kowalewski), os filhos Lenny (Rodrigo de Castro), Joey (João Carlos) e o tio Sam (Ivan Bellangero).

Tudo é acentuado pelo cenário de J. C. Serroni, uma caixa cênica escura e despida de adornos, que ressalta a claustrofobia das personagens.

Pinter cria um clima próximo do absurdo, em que situações surreais são contrapostas a diálogos objetivos e secos. Como definia o diretor inglês Peter Hall (1930-2017), a obra do autor é "um mundo de segredos, onde ações passadas são constantemente reconsideradas e reavaliadas".

AMBIGUIDADE

"São várias camadas", comenta Negrini, cuja personagem é uma das mais ambíguas peça: ao mesmo tempo que mostra independência, parece aceitar a autoridade do mundo masculino. Para isso, a atriz busca uma interpretação seca, pouco psicológica de Ruth. "É essa secura que revela as camadas do texto."

"Pinter faz uma oscilação entre o absurdo e o naturalismo e não explica tudo o que é colocado. E eu prefiro não mostrar, não entregar o jogo", afirma Regina, que fez alguns cortes no texto, agora com pouco mais de uma hora.

"Tirei quase uma hora de 'gordura'. Essa peça [de 1964] é de quando as pessoas tinham um tempo para o teatro. Hoje as pessoas não têm mais essa disponibilidade."

Esta é a terceira direção teatral de Regina –que fez, em 2012, "Raimunda, Raimunda", baseada em textos do piauiense Francisco Pereira da Silva e, há três anos, montou "A Volta para a Casa", do romeno Matéi Visniec.

"Eu fiquei muito apaixonada por isso, é tudo o que eu quero agora, nesse momento da carreira. Estou me reconstruindo, vendo novos horizontes na direção teatral", conta ela, que tem "pelo menos uma meia dúzia de textos" que ainda quer encenar.

"O cinema e a televisão têm especificidades e eu não me sinto preparada [para dirigir]. Como eu venho do teatro, acho que eu me autorizo a continuar dirigindo."

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A VOLTA AO LAR
QUANDO ter., às 21h; até 5/12
ONDE Teatro Eva Herz - Livraria Cultura do Conjunto Nacional, av. Paulista, 2.073, tel. (11) 3170-4033
QUANTO R$ 50
CLASSIFICAÇÃO 14 anos


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