Folha de S. Paulo


Sensual 'Me Chame pelo seu Nome' vai ao Festival do Rio sob elogios da crítica

Sem exibir qualquer cena de nudez frontal, o filme "Me Chame pelo Seu Nome" transborda erotismo. Está nas estátuas de mármore ao redor, nas frutas do pomar e, em especial, no tanto de pernas e peitos à mostra, banhados pelo sol do verão mediterrâneo.

O longa do italiano Luca Guadagnino é um manifesto em prol do desejo e desembarca numa era em que, ao menos no Brasil, o corpo volta a chocar os mais pudicos.

Após percorrer Sundance, Berlim e Toronto, o filme será uma das principais atrações do Festival do Rio, que começa na quinta-feira (5).

Elio (Timothée Chalamet) tem 17 anos e passa as férias na casa da família no norte da Itália, zanzando de bicicleta, entre treinos ao piano e festas com os amigos. No verão de 1983, o pai, um professor universitário, recebe a visita de um pesquisador americano, Oliver (Armie Hammer), que logo desperta o interesse do adolescente nesse seu momento de iniciação sexual.

"Não é planejado, mas meus últimos filmes falam do desejo", diz Guadagnino à Folha, em entrevista concedida durante o Festival de Berlim, em fevereiro. "Nesse, eu queria uma visão positiva do desejo, que tivesse a ver com a inocência de alguém que escolhe ser ele mesmo."

No anterior "Um Mergulho no Passado" (2015), o cineasta usava o sol do sul da Itália como combustível do encontro tórrido entre dois ex-amantes (Ralph Fiennes e Tilda Swinton) e desculpa para filmar seus atores rente à pele.

"Sou um voyeur", afirma. Nisso, o escritor americano André Aciman fornecia o substrato perfeito com seu romance "Call Me By Your Name". Na primeira página, o protagonista rememora a impressão inicial que teve do visitante Oliver, chegando de camisa aberta à sua casa: "Pele para todo lado".

O siciliano Guadagnino transpõe a sensualidade das páginas a cenas carregadas de reflexões sobre o epicurismo e sobre a beleza dos corpos.

Não à toa, o pai de Elio é arqueólogo e estuda estátuas influenciadas por Praxiteles, ateniense que, em vez de esculpir deuses austeros como Zeus e Posêidon, preferia se esbaldar nas curvas e cachos de divindades joviais e sensuais como Apolo e Afrodite.

Desde que "Me Chame..." estreou em Sundance, a crítica tem se derretido. No site Metacritic, que compila resenhas cinematográficas, o longa encabeça o ranking de filmes mais elogiados do ano, acima de títulos como "Dunkirk" e "Em Ritmo de Fuga".

Depois do Festival do Rio, o filme entra no circuito nacional em 18 de janeiro, na leva de filmes com cara de Oscar. É, aliás, a grande aposta da Sony para a premiação do ano que vem –o que pode ser positivo para o Brasil, que é um dos financiadores do longa, por meio da produtora paulista RT Features.

'SENSUALISTA'

A obra é um raro longa sobre uma relação gay que se passa nos anos 1980 e que não esbarra na Aids ou no preconceito. Mais do que isso, tateia a compreensão dos antigos gregos sobre o envolvimento entre dois homens.
"É uma celebração à forma mais visceral de amor", diz Timothée Chalamet, de 21 anos.

Seu colega, Armie Hammer, 31, trocou farpas com o também ator James Woods, que não está no filme e chamou a história de indecente.

Hammer, que reluta em colar o rótulo de gay aos personagens do filme, afirma na entrevista que o que eles sentiam era um "desejo inexplicável entre pessoas em diferentes fases de suas vidas".

Para Guadagnino, o filme é também sobre o embate entre duas culturas, a americana e a europeia, naquele momento específico. No início, Oliver aparece como um americano rude. Já a família de Elio é aristocrática: num casarão servido por empregados, citam Montaigne e Buñuel entre banquetes ao ar livre.

Como é 1983, o diretor inclui discussões inflamadas sobre a candidatura do ex-primeiro-ministro socialista Bettino Craxi, a sugerir uma utopia semelhante àquela que Elio está empreendendo.

O ano também é a deixa para que o diretor preencha a trilha sonora com o new wave de grupos como Psychedelic Furs e o Modern Talking.

Numa das cenas, bota Hammer para dançar, o que o ator diz que foi mais difícil do que rodar as cenas de sexo. "Eu sou muito alto, tropeçava em todo mundo", diz ele, que mede 1,96 m.

Mas, para o diretor, "um homem que dança é a coisa mais erótica que dá para imaginar".

"Não sei se sigo uma agenda para celebrar a sensualidade", diz Guadagnino. "Talvez eu seja um sensualista inconsciente. Quem sabe um dia eu faça um filme sobre freiras."

Trailer

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ELES SÃO CARIOCAS
Outros destaques do Festival do Rio

'Roda Gigante'
Em seu mais recente trabalho, Woody Allen escala Kate Winslet e Justin Timberlake nessa trama ambientada nos anos 1950 sobre um operador de roda-gigante e sua mulher infeliz.

'A Forma da Água'
Guillermo Del Toro narra a história de uma faxineira muda e solitária que se afeiçoa a um monstro aquático que está sendo estudado no laboratório secreto onde ela trabalha.

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Cena do filme 'A Forma da Água
Cena do filme 'A Forma da Água'

'Pequena Grande Vida'
Matt Damon faz o papel de um sujeito que passa por um processo de miniaturização nessa ficção científica de mensagem ecológica dirigida por Alexander Payne, de 'Nebraska'.

'120 Batimentos por Minuto'
Vencedor do Grande Prêmio do Júri em Cannes, o filme francês rememora a luta dos integrantes do Act Up, grupo de defesa dos direitos de pacientes soropositivos em sua militância nos anos 1990.

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Cena do filme '120 BPM'

'Terra Selvagem'
Um guarda florestal (Jeremy Renner) e uma agente do FBI (Elizabeth Olsen) se juntam para investigar a morte de uma nativa numa reserva indígena no novo filme de Taylor Sheridan.

'A Guerra dos Sexos'
Os atores Emma Stone e Steve Carell revivem uma histórica disputa de tênis travada em 1973, que representou um ponto de virada na tradição de machismo daquele esporte.

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Cena do filme 'A Guerra dos Sexos
Cena do filme 'A Guerra dos Sexos'

'A Ciambra'
Representante da Itália no Oscar, aborda a história de um adolescente cigano que enfrenta desafios depois que seu irmão mais velho desaparece na região da Calábria.

'The Florida Project'
Sean Baker (diretor de 'Tangerine') se volta agora para uma menina de seis anos integrante de grupo de despossuídos que habitam uma comunidade próxima à Disney World, em Orlando.

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Cena do filme 'The Florida Project
Cena do filme 'The Florida Project'

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