Folha de S. Paulo


CRÍTICA

Versace ganha Milão com tops dos anos 90, George Michael e Gianni

Era para ser mais um desfile no meio da temporada, mais um engarrafamento qualquer de semana de moda e a mesma horda de fotógrafos e curiosos prostrada na frente da Trienalle de Milão. Mas tudo isso foi multiplicado por dez no prédio onde ocorreria a apresentação da Versace, na sexta-feira (22). O movimento de convidados VIP previa algo incomum e raro.

Quando a última garota da nova geração cruzou a passarela, as luzes se apagaram e as cortinas, até então fechadas, abriram-se para revelar um pódio no qual posavam as supermodelos Cindy Crawford, 51, Claudia Schiffer, 47, Naomi Campbell, 47, Helena Christensen, 48, e Carla Bruni, 49 –esta, também ex-primeira-dama da França.

A reunião histórica foi embalada por "Freedom", de George Michael (1963-2017), hino pop dos anos 1990 cujo videoclipe selou a história da moda ufanista da década com a dancinha das tops. O cantor era, assim como as modelos convidadas, amigo do estilista Gianni Versace (1946-1997), motivo que levou as beldades aposentadas de volta à passarela.

Relembre o hit "Freedom", de George Michael

Relembre o hit "Freedom", de George Michael

Assassinado há exatos 20 anos, Versace renasceu na apresentação por meio de Donatella, sua irmã. Ela reeditou todo o legado do patriarca da grife, como os arabescos dourados que até hoje são copiados por marcas, as estampas de correntes, os casacos bordados e os vestidos curtíssimos cujos comprimentos ainda agradam a clientes aspirantes a "sex symbol".

Essa homenagem ao estilista fundador da moda desavergonhada e de pele aparente soou como expurgo dos demônios que cercam a criação de Donatella. Em entrevista à Folha, na temporada passada, ela disse já ter duvidado do seu trabalho por causa da sombra do irmão.

O medo deu lugar à técnica, com a qual a estilista mesclou sua tesoura minimalista, cheia das variações de alfaiataria justa e aplicações vistas recentemente, com a extravagante de Gianni.

"Vamos celebrar um gênio, um ícone: meu irmão", declamou Donatella no texto transformado na trilha disco do desfile, agora espécie de manifesto da originalidade da marca diante da moda atual.

ÍCONES VIVOS

Em um momento em que grifes tateiam novas frentes de estilo e a Gucci aumenta seu poder de fogo com reedições de roupas com cara de brechó, o verão 2019 da Versace é um sonoro "fizemos isso primeiro" direcionado à concorrência.

De fato, a sexta-feira em Milão foi um dia de memória, e não pareceu coincidência que no mesmo espaço de tempo tenham desfilado Giorgio Armani e Roberto Cavalli, concorrentes antigos da Versace e duas etiquetas homônimas de "ícones" vivos que vão por caminhos diferentes.

A estreia correta de Paul Surridge na direção da grife de Cavalli, aposentado e à procura de novo norte, deu contornos de elegância francesa à estamparia selvagem da marca. Boa, a coleção não se distancia da corrente de feminilidade comportada desses últimos anos, mas coloca algumas linhas curvas e transparências para se diferenciar.

Enquanto isso, o próprio Armani redesenha sua história de jaquetas bem cortadas, vestidos estampados com parcimônia e brilho de paetês comedido.

No desfile de sua grife principal, ele abriu mão da rigidez para aplicar mais seda à alfaiataria, que é chave do seu trabalho.

Cartelas enxutas com combinações de preto, vermelho e branco, ou cinza e preto, tingiram florais aplicados em vestidos leves e nos conjuntos de calça e blusa bem cortados.

Boas roupas e boas imagens cruzaram os pontos históricos de Milão. O dia, porém, foi todo da Versace.

AVALIAÇÃO DOS DESFILES

VERSACE (ótimo)
GIORGIO ARMANI (muito bom)
ROBERTO CAVALLI (bom)


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